Ano 04 (2017) - Número 04 Artigos
10.31419/ISSN.2594-942X.
Milson Edmar da Silva Xavier – Geólogo – Engenheiro de Segurança do Trabalho.
Tratado é o acordo formal firmado pelos sujeitos de Direito Internacional Público – Estados, organismos internacionais (ONU, OIT) e outras coletividades (FMI, Mercosul) destinado a produzir efeitos jurídicos no âmbito internacional.
A expressão “tratado” foi consagrada pela Convenção de Viena para denominar qualquer tipo de acordo internacional. Portanto, tratado é o gênero das espécies convenção, acordo, protocolo, carta, concordata, dentre outros. Esta última espécie é a denominação utilizada exclusivamente para tratados firmados com a Santa Sé.
Além da forma escrita e firmado por pessoas internacionais, a produção de efeitos jurídicos é outro elemento crucial para esse instituto, uma vez que deve existir vínculos obrigacionais entre os entes signatários.
Devemos, então, entender como essas regras entram no ordenamento jurídico brasileiro e passam a ser fonte de direito. Assim, após os trâmites de aprovação do texto a nível internacional, ou seja, celebrado pelo Chefe de Estado ou seu representante necessário se faz submetê-lo ao Congresso Nacional para recepcioná-lo mediante decreto legislativo.
Aprovado pelo Congresso Nacional e promulgado por decreto presidencial, o tratado deve ser ratificado, que é o ato internacional no qual o Brasil confirma seu consentimento em obrigar-se às regras e dispositivos acordados, mediante depósito do instrumento na organização internacional correspondente. Desta forma, a vigência do tratado se inicia com a ratificação e seus dispositivos incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro.
No caso específico da Convenção de Minamata, objeto deste artigo, constata-se a forma multilateral com matéria normativa e procedimento de tratado solene, em que necessita de ratificação para exigência de suas regras.
Esta convenção assim fora denominada devido um grande desastre ambiental ocorrido na cidade de Minamata, no Japão, após o fim da Segunda Guerra Mundial.
O governo local permitiu a instalação de empresa química, a fábrica de fertilizantes e de acetaldeído utilizado na produção de material plástico, Chisso Corporation, que em seu processo fabril despejava os seus dejetos tóxicos na Baía de Minamata. Nesse processo foi utilizado sulfato de mercúrio como catalisador. Ao longo da década de 1950, especialmente a partir de 1953, peixes e crustáceos apareciam mortos boiando na baía. Sintomas estranhos em gatos da região eram observados. Pareciam estar afetados por doença de coordenação motora, pois se locomoviam dançando, daí serem chamados de “gatos dançantes”. Pescadores da região e seus familiares reclamavam de sintomas de uma doença misteriosa cujos efeitos no organismo revelavam desordem do sistema nervoso central, com fadiga crônica, dor de cabeça, comprometimento da visão, audição, fala e coordenação motora.
A situação foi sendo agravada a ponto de milhares de pessoas apresentarem os mesmos sintomas, com casos mais graves sendo registrados como convulsões e mortes. Em 1968 foi constatado que esses sintomas eram provenientes de ingestão de peixes contaminados por mercúrio despejados na Baía de Minamata. O envenenamento da população por mercúrio, fruto da ingestão de peixes e frutos do mar, revelou sintomas caracterizados como “Mal ou Doença de Minamata”, levando à morte mais de duas mil pessoas e deixando sequelas permanentes em outros milhares.
Diante da constatação dos efeitos do mercúrio na saúde humana e meio ambiente em todas as etapas de seu ciclo de vida, a comunidade internacional reúne esforços para normatizar a gestão do mercúrio, descrevendo essa substância como um produto químico de preocupação global, o que culminou com a aprovação da Convenção de Minamata por 92 países, em Kumamoto, Japão, em 11 de outubro de 2013, cujo objetivo é reduzir as emissões e a liberação de mercúrio para o ar, a água e a terra e estabelecer protocolos de armazenamento e eliminação da substância.
Pelo Brasil, o Ministério das Relações Exteriores foi o órgão articulador nas discussões, subsidiado pelos conhecimentos técnicos dos servidores do Ministério do Meio Ambiente.
Através do Decreto Legislativo nº 99, de 6 de julho de 2017, o Senado Federal aprova o texto da Convenção de Minamata sobre mercúrio, adotada em Kumamoto, Japão, com vigência no Brasil em 90 dias a partir da data do depósito do documento nas Nações Unidas.
Antes de abordarmos o texto legal da convenção, faz-se necessário saber o marco inicial das exigências desde a sua aprovação em outubro de 2013. A Convenção ficou aberta para ratificação pelos países signatários desde então. A entrada oficial em vigor é determinada após o 50º país ratificá-la, o que ocorreu em maio de 2017. Contados os 90 dias de vacatio legis, o dia 16 de agosto de 2017 é a data em que a Convenção entra em vigor no mundo. No Brasil temos também o prazo de 90 dias para entrada em vigor no território nacional, a contar da data do depósito do documento brasileiro de ratificação na sede das Nações Unidas, em Nova York, o que ocorreu em 08 de agosto de 2017. Assim, em novembro de 2017, ao ordenamento jurídico brasileiro são acrescidos dispositivos legais, via lei ordinária, hierarquicamente inferior à Constituição Federal.
A Convenção de Minamata sobre mercúrio tem como objetivo proteger a saúde humana e o meio ambiente das emissões e liberações antropogênicas de mercúrio e compostos de mercúrio, mas não podemos esquecer que a substância é produto da extração do mineral cinábrio, sendo utilizado na mineração artesanal de ouro, na mineração primária, em rituais religiosos e outras atividades.
O texto do documento inclui medidas de controle do fornecimento e comércio de mercúrio. Estabelece restrições para fontes específicas de mercúrio como a mineração primária que é aquela em que o principal produto lavrado é o mercúrio. Controla produtos com mercúrio adicionado, trata das emissões e liberações de mercúrio, seu armazenamento interino e a destinação dos resíduos, dentre outras tratativas.
Especificamente sobre os impactos da atividade de mineração, podemos destacar:
A qualquer momento, se o Estado determinar que a mineração e processamento de ouro artesanal e em pequena escala, em seu território, é mais que insignificante, deverá notificar o órgão Secretariado da Convenção, desenvolvendo e implementando um plano de ação e, no prazo máximo de três anos da entrada em vigor da Convenção, encaminhar esse plano ao Secretariado.
As partes ou países signatários da Convenção poderão firmar acordos entre si com o objetivo de, entre outros de desenvolver estratégias para prevenir o desvio de mercúrio ou compostos de mercúrio para uso em mineração e processamento de ouro artesanal e em pequena escala.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Convenção de Minamata sobre Mercúrio. Diego Henrique Costa Pereira. Set 2017. Disponível em www.fundacentro.org.br. Acesso em 25.10.2017
BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto Legislativo nº 99, de 06 de julho de 2017. Disponível em www.2.camara.leg.br. Acesso em 22.10.2017.