Ano 04 (2017) - Número 04 Causos
Pabllo Henrique Costa dos Santos.
Geólogo, Msc e técnico do Museu de Geociências da UFPA.
Aquela senhora seria apenas mais uma dentre os muitos visitantes que compareceram ao painel “Caulim” durante a exposição Minérios da Amazônia, na praça Batista Campos, se não fosse por um detalhe especial. Ela demonstrava possuir um interesse incomum pelo assunto. E uma curiosidade também acima da média. Enquanto explicava as propriedades físicas da rocha, suas fontes e principais aplicações, fui interrompido por numerosos questionamentos, o que tornou a exposição mais duradoura que as anteriores. Eu não sabia, mas aquele era só o início de uma longa conversa, em que a visitante se tornaria a expositora, não dos minérios da Amazônia, mas de suas experiências pessoais.
Ela começou dizendo que só estava ali graças a uma cirurgia de catarata, realizada na última semana; que, antes do procedimento cirúrgico, não enxergava praticamente nada, vivia num mundo de sombras. Mas, agora, era capaz de enxergar os mínimos detalhes à sua volta e até de ler inteiramente o painel sobre o caulim, mesmo de longe. Foi então que entendi o fascínio daquela senhora pela exposição. Poder enxergar novamente era um privilégio do qual ela gostaria de tirar máximo proveito.
Diante disso, interessei-me pelo assunto. Fiz algumas perguntas. E então vieram os detalhes. Ela mostrou suas inúmeras cicatrizes, testemunhas de quedas e queimaduras e outros acidentes ocorridos durante a ausência da visão. Disse que passou anos sem praticamente sair de casa por contas da superproteção dos filhos. E logo vieram as minúcias sobre os procedimentos pré-operatórios da cirurgia de catarata; sobre a anestesia; a retirada da retina; a colocação da lente substituta; o tempo de recuperação; a necessidade de utilizar óculos escuros por algum tempo após a operação; e de o quão diferente se torna a vida de quem passa pela cirurgia. Surpreendi-me quando percebi que quase uma hora havia se passado.
Após o término do duradouro diálogo, ela despediu-se e seguiu em direção aos demais painéis, nos quais posteriormente notei que também passou tempo considerável, inclusive contando ao meu amigo Daiveson, expositor do painel sobre a bauxita, sobre suas aventuras morando em uma fazenda de Goiás, e de quando era cobiçada por muitos pilotos de avião. Concluí que, naquele momento, nada era mais importante para aquela senhora do que apreciar as belezas do mundo, das quais, por anos, a cegueira lhe havia distanciado. E entre estas maravilhas, felizmente estavam os minérios da nossa exposição, que ainda eram acompanhados por expositores cativantes e disponíveis para uma boa conversa.