06 – COMPOSIÇÃO QUÍMICA E MINERALÓGICA DE ISOLADORES CERÂMICOS DE ALTA TENSÃO

Ano 05 (2018) - Número 02 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v52018i2a6DMP

 

 

Darilena Monteiro Porfírio 1, Marcondes Lima da Costa 2.

 

1 Pesquisadora da Eletronorte e doutoranda do PPGG-UFPA

2 IG-UFPA, Pesquisador CNPQ e membro ABC

 

ABSTRACT

The increasing demand on electric power is normally followed by expansion of the transmission lines. The management of the production, design and installation of electrical insulators can contribute to the efficiency of electrical power systems. The detail the chemical and mineralogical composition that directly affect the mechanical and electrical properties desirable to the insulators. Understanding how raw materials and additives affect the formulation and structure of ceramic insulators can contribute to the reduction of failure rates, shutdowns, and improvements that represent society’s safety and economy.

Keywords: cerâmica isolante; sinterização; dielétricos; manutenção e inspeção de isoladores.

 

INTRODUÇÃO

A energia elétrica atualmente é um bem indispensável à qualidade de vida em nossa sociedade globalizada e tecnológica. Os sistemas de transmissão e distribuição fazem a ligação entre as centrais geradoras e consumidor final. Os isoladores elétricos de alta tensão têm a função de garantir a separação física entre os meios condutores nas etapas de geração, transmissão e distribuição, em classes de tensão (AT) que podem variar de 800 kV a 6.9 kV. Estes também devem garantir a resistência mecânica a diferentes forças que atuam externas a linha de transmissão (LT), tais como o peso dos condutores, a tensão axial, as variações por ação de agentes atmosféricos (vento, chuva, dilatação térmica dos condutores) e outros efeitos. Lembrando que a falha de um isolador pode originar danos diversos ao setor elétrico de potência (SEP) até mesmo o desligamento total conhecido popularmente como apagão.

Em SEP’s com dimensões continentais, como é o caso do brasileiro, com milhares de quilômetros de LT’s aéreas que interligam a geração e o consumidor, há diversos os tipos e projetos de isoladores e as solicitações mecânicas, elétricas e climáticas a que estão submetidos são enormes, e em última instância, dependem da composição mineralógica e química dos isoladores e de suas consistência, coesão e formas e (seja maciço ou oco) e quanto a função (para suspensão ou apoio) que irão desempenhar na LT’s Ramires (2013).

Os fatores que afetam o desempenho do isolador elétrico de AT, são: a composição química (proporção óxidos de alumínio, silício, sódio, cálcio e outros aditivos químicos), a microestrutura das fases (vítrea e cristalina) e os parâmetros de projeto, ou seja, classe de tensão e frequência, umidade e temperatura e a ambiência a que estão expostos (rural, urbano, marinho, industrial, desértico) de acordo com a IEC/TS-60815 (2008).

Se forem consideradas apenas as propriedades elétricas e térmicas desejáveis associadas à qualidade dos isoladores cerâmicos podem-se citar a alta rigidez dielétrica(1) (RD) e as baixas condutividade elétrica (CE) e térmica (CT) dos materiais que compõem os isoladores de AT, deixando de lado as variáveis de forma e projeto neste momento. Os isoladores elétricos de AT mais utilizados são os cerâmicos, seguidos dos poliméricos e vítreos, que não serão abordados neste trabalho. A figura 1 apresenta um isolador cerâmico de pino padrão para suspensão da rede de AT, constituído da porcelana branca mais usual. E além do corpo cerâmico, tem-se ligas metálicas de ferro fundido zincado na campânula; aço forjado zincado no pino e aço inox, bronze ou cobre nas cupilhas (engates) dos isoladores cerâmicos.

 

Figura 1. Feição do Isolador cerâmico padrão de alta tensão.

 

Os isoladores cerâmicos de AT são produzidos por queima ou sinterização, processo térmico de alta temperatura, onde ocorre perda de massa, desenvolvimento de novas fases cristalinas, formação de fase vítrea e a soldagem dos grãos para a formação de porcelanas aluminosas triaxiais, Bonetti (2009).

São cerâmicas complexas formadas a partir de matéria prima refratária (propriedades estruturais), plástica (conformabilidade à massa pré-sinterização) e fundentes (formação da fase vítrea) constituídas respectivamente de alumina ou sílica, argila e feldspatos conforme a composição teórica A (figura 2). O produto cerâmico além da fase vítrea constituída de α-alumina, e/ou mullita, ao redor de grãos não fundidos remanescentes. Tem-se que a fase vítrea preenche os espaços por tensão superficial e por efeito de contração de volume. As propriedades físicas finais da cerâmica (RD, CE, CT) dependem formulação inicial, e por conseguinte das fases cristalinas formadas, bem como da fase vítrea e da microestrutura desenvolvida durante o processamento e sinterização. Durante todo o processo pode também surgir defeitos (porosidade, microfissuras, variação nos tamanhos de grãos e a dispersão de fases) nos isoladores conforme Bonetti (2009).

 

(1) Rigidez dielétrica é o valor da tensão elétrica máxima que pode ser aplicado num material imediatamente antes da passagem de corrente ou da ocorrência do arco elétrico, é expressa em (V/m).

 

Figura 2. Diagrama triaxial ilustrativo da composição A. Fonte: Ronchi J.C.S. (2011).

 

Sendo os isoladores de AT peças especiais, onde defeitos internos e falhas ocultas de fabricação podem gerar sérias consequências, deve-se sistematizar as técnicas de formulação e produção de seus componentes cerâmicos. O conhecimento das cerâmicas triaxiais empregadas nos isoladores de AT a partir das matérias-primas é essencial para o melhor desempenho dos isoladores e aumento da confiabilidade das linhas de transmissão.

Nesse contexto, o estudo das cerâmicas triaxiais, assim denominadas por conter em sua formulação básica 50% de argila, 25% de quartzo e 25% de feldspato melhora a compreensão de suas propriedades buscando atender normas e requisitos técnicos de acordo com Chinelatto et al (2004).

A seguir serão descritas suscintamente algumas matérias-primas e o processo de obtenção dessas cerâmicas:

Argilas:

Entre os materiais argilosos mais empregados para a produção de cerâmicas o principal é o caulim, constituído principalmente por caulinita, [Al2Si2O5(OH)4]. Em sua estrutura há as camadas de Al(OH)3), denominadas octaédricas (o), intercalada com tetraédricas (t) de (Si2O5). Assim a caulinita tem estrutura tipo t-o (figura 3).

 

Figura 3: Camada t-o tipo caulinita. Fonte: Dyar, M.D.; GunterM.E.; Tasa, D. (2014).

 

Alumina (Al2O3) e quartzo (SiO2):

Além de caulinita, cuja composição química pode ser representada por SiO2 e Al2O3, seus equivalentes minerais, quartzo e coríndon [ou como gibbsita, Al(OH)3, o que é mais normal], respectivamente, podem estar presentes na massa cerâmica como agregados grosseiros. Serão então, os componentes refratários da porcelana, com baixa reatividade, e baixa solubilidade tendo a função estrutural, e muitas vezes são também denominadas de inertes. A fração grossa serve para evitar a retração de volume durante o cozimento da massa cerâmica. A alumina pode substituir parcial ou totalmente a sílica nas porcelanas conferindo menor porosidade. Sendo a matéria-prima para produção de alumina a bauxita a gibbsita Al(OH)3). E a alumina pode ser obtida calcinação ou por eletrofusão, contudo representará um custo adicional à matéria-prima (Ramires, 2013).

Feldspatos e Feldspatóides: Normalmente são empregados tanto os feldspatos potássicos (KAlSi3O8) como os sódicos (NaAlSi3O8) ou ainda feldspatóides, como nefelina, (Na,K)(AlSiO4). Estes atuam como matéria prima e tem a função adicional de fundente, pois diminuem a temperatura de sinterização via fase líquida (Ramires, 2013).

Produção das Cerâmicas: Sinterização.

Durante a sinterização a caulinita se transforma em mullita, Al(4+2x)Si(2-2x)O(10-x). Para aumentar a plasticidade da cerâmica é em geral necessário além de caulinita, muitas vezes adicionar de pequenas quantidades de argilominerais 2:1 (a exemplo da illita) que confere trabalhabilidade e resistência mecânica à massa pré-sinterização.

Durante a sinterização da sílica é possível acompanhar a formação de suas principais fases polimórficas que depende do gradiente de temperatura, como α-quartzo, β-quartzo, tridimita e cristobalita de acordo com as temperaturas de fusão/cristalização entre 573 e 1705oC (figura 4).

 

Figura 4: Mudança das fases polimórficas de sílica. Fonte Dyar et al (2014).

 

As cerâmicas à base de alumina ao contrário das de quartzo apresentam densidade mais elevada, maior resistência mecânica e a maior estabilidade ao longo do tempo, pois contém menos trincas (Frischholz, 2004). Isto é explicado pela a redução do coeficiente de expansão térmica entre a fase vítrea e a fase cristalina no processamento. Contudo o uso da alumina representa custo mais de produção, pois a matéria-prima é mais cara do que quando se emprega sílica normalmente já formado de quartzo), além do que a produção de cerâmica a base de alumina ocorre sob temperatura mais elevada, para que possa acontecer a sinterização, portanto aumento ainda mais dos custos de produção, dado o maior consumo de energia (Chinelatto et al., 2004).

O padrão internacional IEC 60762:1983 (aluminium alloy electrical conductor wires used in polyolefin insulated telecommunication cables) envolve várias classes de cerâmicas elétricas de alto desempenho que têm características elétricas ou eletrônicas específicas (Tabela 1), que estão diretamente relacionadas a sua composição mineralógica e por conseguinte química.

 

Tabela 1: Cerâmicas Técnicas de acordo com a IEC 60762:1983

 

Os aditivos químicos podem ser convenientemente utilizados para: diminuir a viscosidade da fase líquida formada durante a sinterização; aumentar a difusividade dos íons (Li2O, K2O e Na2O); melhorar as propriedades dielétricas e isolantes da cerâmica obtida (Al2O3); aumentar a durabilidade (ZnO e MgO) e a densidade (BaO e PbO) da cerâmica (Roula et al., 2009).

 

DISCUSSÃO

Em diversos trabalhos verifica-se alterações nas composições usuais das cerâmicas de alta tensão visando melhorias no desempenho em serviço. De acordo com Sedghi et al. (2012) houve aumento da resistência à flexão de 70 MPa da enstatita (C-220) para 250 MPa em porcelana de alta alumina (C780-C786). E a substituição do quartzo pela alumina vem sendo amplamente utilizada na formulação dos isolantes de AT para diminuição da condutividade elétrica, aumento da estabilidade em ambientes corrosivos e boa resistência ao envelhecimento.

Então, a variação da composição de sílica e alumina na formulação da massa cerâmica pode proporcionar alterações nas propriedades físico-mecânicas e elétricas após a sinterização a altas temperaturas conforme demostrado por Mehta et al. (2017).

No processo produtivo/sinterização, busca-se a otimização dos custos, o aumento da densidade e diminuição da porosidade das cerâmicas dos isoladores diminuindo as microfissuras, entre os grãos de quartzo, o que aumenta a resistência ao envelhecimento das peças.

Além disso trabalhos como o de Cajetan, et al. (2015) propõe além da otimização da composição básica (razão SiO2/Al2O3), o uso de argilas locais num estudo estimulado pelo governo da Nigéria para o desenvolvimento de tecnologia de produção endógena, a partir de recursos minerais disponíveis localmente. Tal qual Kitouni (2014) propõe o uso de caulim da Argélia; e Silva (2010) propõe o uso de argilas locais do Rio Grande como matéria prima.

Assim, uma atenção especial deve ser dada a escolha das matérias-primas, aditivos, processo produtivo, desenho e ao custo final dos isoladores para definir a melhoria na taxa de falhas dos isoladores e, por conseguinte, aos milhares de quilômetros de linhas de transmissão do sistema elétrico de potência.

Também quanto às questões de manutenção, inspeção, conservação e técnicas de lavagem dos isoladores em serviço (em linhas energizadas) devem ser avaliados, tais como sugere Dias (2017). E conforme Prette (2007) e Manzur (2014) propõem o uso de revestimentos hidrofóbicos e a aplicação de revestimentos protetivos (coatings) do corpo cerâmico de isoladores em ambientes de alta salinidade e agressividade ambiental.

 

CONCLUSÕES

O desenvolvimento e a otimização de isoladores cerâmicos, que compõem o sistema elétrico de potência, deveria constar como temáticas de pesquisas transdisciplinares, que permita às universidades e as industrias o desenvolvimento conjunto de novas tecnologias e bens de consumo.

Uma vez que os isoladores estão sujeitos às ações de agentes ambientais diversos (poluição, ventos, chuva, descargas atmosféricas), sujeitos a falhas, trincas e desgastes. E permeiam questões técnicas de várias áreas do conhecimento, para a busca de materiais com melhor de resistência mecânica, elétrica e ao desgaste do tempo. Além do acesso às matérias-primas de melhor qualidade e menor custo, para promover processos produtivos mais eficientes e economicamente viáveis na sociedade em que vivemos.

 

AGRADECIMENTOS

AO Centro de Tecnologia da Eletronorte Eletrobrás e aos colegas colaboradores do ENFQ/Laboratório de ensaio de óleos isolantes, lubrificantes e combustíveis.

Aos colegas do LAMIGA/ MUGEO/ PPGG-UFPA.

Ao P&D ANEEL Projeto: Desenvolvimento de Tecnologia para avaliação de desempenho de isoladores de alta tensão em áreas de alta agressividade ambiental (contrato 4500078262) pelo apoio ao desenvolvimento deste trabalho.

Ao CNPq pela concessão de bolsa de produtividade em pesquisa e taxa de bancada (Processo no. 305015/2016-8) ao segundo autor.

 

REFERÊNCIAS

Bonetti A. N. 2009. Desenvolvimento De Massas Cerâmicas Para Fabricação de Isoladores Elétricos: Propriedades Mecânicas. Dissertação Mestrado UFSC, Florianópolis/SC, 1–62.

Cajetan O. C., Ezechukwu, O.A., Olisakwe C.O., Ezendokwelu C.E., Umunna, C. 2015. Characterization of electrical porcelain insulators from local clays. Int. J. Res., 3(1): 26–36.

Chinelatto A. L., Souza D. P. F. de. 2004. Porcelanas elétricas aluminosas: Parte I – Revisão da literatura. Cerâmica, 50 (313): 62–68.

Dias B. A. 2017. Simulação computacional da poluição biológica em isoladores de vidro. Universidade Federal de Campina Grande.

Dyar M.D., Gunter M.E., Tasa D. 2014. Mineralogy and optical mineralogy. TASA graphic Arts, Inc. E-book, Capítulo 6, p. 42, Salazar Road, USA.

Frischholz P. 2004. The Breviary technical ceramics. Fahner Verlag, Selb, Germany, 283.

International Electrotechnical Commission. 1995. IEC 60672-1. International Standard. Ceramic and glass insulating materials- Part 1: Definitions and classification, p. 15.

International Electrotechnical Commission. 2008. IEC 60815-1. Technical Specification. Selection and dimensioning of high-voltage insulators intended for use in polluted conditions, p. 22.

Kitouni S. 2014. Dielectric properties of triaxial porcelain prepared using raw native materials without any additions. Balk. J. Electr. Comput. Eng., 2(3): 2–5.

Mazur M. M. 2014. Desenvolvimento de filmes hidrofóbicos por plasma CC pulsado para isoladores elétricos de porcelana. Dissertação de Mestrado, Ciências e Eng. De Materiais. Universidade Estadual de Ponta Grossa, p. 88.

Prette A. L. G. 2006. Desenvolvimento de esmaltes cerâmicos: aplicação em isoladores elétricos de alto desempenho. Dissertação de Mestrado. Dep. Eng. Mecânica, pós-graduação em Ciência e Eng. De Materiais, Universidade Federal de Santa Catarina, p. 77.

Ramires Marques T. F. 2013. Pasta aluminosa para o fabrico de isoladores cerâmicos. Dissertação de Mestrado. Dep. Ciências de Materiais. Universidade de Aveiro, pp 83.

Ronchi J.C.S. 2011.Desenvolvimento de porcelanas triaxiais sinterizadas em atmosfera redutora. Dissertação de Mestrado, Ciência e Eng. de Materiais – Área de Cerâmica, Universidade Federal de Santa Catarina, p. 88.

Roula A., Boudeghdegh K. Boufafa N. 2009. Improving usual and dielectric properties of ceramic high voltage insulators. Cerâmica, 55: 206–208.

 

 

 10.31419/ISSN.2594-942X.v52018i2a6DMP