06 – BIOTITA-XISTO DA SUÍTE INTRUSIVA TRACUATEUA DO NORDESTE DO PARÁ E SEU POTENCIAL AGROMINERAL

Ano 10 (2023) – Número 1 - Agrominerais Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v102023i1agromineraisa6HMC

 

 

BIOTITE-SCHIST FROM THE TRACUATEUA INTRUSIVE SUITE, NORTHEAST OF PARÁ STATE, AND ITS AGROMINERAL POTENTIAL

 

Hivanilson M. Conceição*1, Aldemir M. Sotero2, Rômulo S. Angélica2, Simone P. A. Paz1,2

 

1Faculdade de Engenharia Química, Instituto de Tecnologia, Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, Pará, Brasil, hivanilson.conceicao@itec.ufpa.br*1

2Laboratório de Caracterização Mineral (LCM), Instituto de Geociências, UFPA, Belém, Pará, Brasil.

*Autor correspondente

 

ABSTRACT

The main purpose of this work is the chemical and mineralogical characterization of a biotite-shist from northern Brazil, in order to evaluate its potential as an alternative rock of potassium fertilizer. For the characterization, one composite sample of about 40 Kg was crushed and classified into four subsamples with the following grain sizes: (-4000 +1000), (-1000 +300), (-300 +53) and (-53) μm. All four subsamples were submitted to the following analyses: X-ray diffraction (XRD), X-ray fluorescence (XRF), Fourier Transform Infrared Spectrometry (FTIR) and optical microscopy (OM) for textural analysis. The biotite-shist is mainly composed by albite, quartz and biotite, besides small amounts of chlorite and traces of K-feldspar and clinopyroxene. No significant mineralogical variation was observed among the studied granulometric fractions. Mean K2O contents are 2,61%, above the minimum of 1% required by the Normative Instruction of the Ministry of Agriculture of Brazil. Although further studies are still needed, the biotite-shist studied may have good potential when compared to other rocks already used in Brazil, e.g., other biotite schists from Central Brazil, as agromineral or soil remineralizer.

Keywords: Biotite-schist, potassium fertilizer, soil remineralizer, agromineral.

 

1. INTRODUÇÃO

O agronegócio brasileiro começou sua crescente participação no mercado internacional a partir dos anos 2000, quando foi palco de diversas transformações estratégicas no segmento de açúcar e álcool (EMBRAPA, 2018). Na última década, o interesse na agropecuária passou a integrar uma variedade maior de segmentos, e se tornou o pujante agronegócio da atualidade. Assim, tão importante quanto o plantio, colheita, pasto, abate é a logística, a ração animal, o fertilizante. No ano de 2020, em plena pandemia do Covid-19, o PIB do agronegócio acumulou variação recorde de 24,31%, o que elevou de 20,5% (2019) para 26,6% (2020) a sua participação no PIB total do país, segundo os dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA) e da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Em valores monetários, o PIB brasileiro totalizou R$ 7,45 trilhões em 2020, de modo que o agronegócio teve quase R$ 2 trilhões em participação (MAPA, 2021).

No cenário de insumos para a produção agrícola brasileira, destacam-se os fertilizantes, que, apesar de indispensáveis para a manutenção e o crescimento do setor, ainda estamos longe de uma autossuficiência na sua produção. O Brasil ocupa o quarto lugar como consumidor mundial de fertilizantes NPK (Nitrogênio, Fósforo e Potássio), importando cerca de 70% de Nitrogênio e 50% de Fósforo. A sua maior dependência é o potássio, o qual é importado em 95%, principalmente do Canadá, Rússia e Alemanha (Alves, 2022; Canal Rural, 2022).

A respeito de fontes de potássio para fertilizantes, Kulaif e Góes (2016) classificam os depósitos minerais passíveis de exploração em três tipos principais: evaporitos, salmouras naturais e rochas. Na classe das rochas, destacam-se os do tipo “verdete” (sedimentar); fonolitos e sienitos (ígneas alcalinas) e aquelas com enriquecimento anômalo em biotitas, principalmente, rochas metamórficas, ricas em biotita e flogopita.

Há décadas, rochas silicáticas enriquecidas em potássio vêm sendo estudadas como opção em aplicação direta (rochagem) para o fornecimento de potenciais nutrientes às plantas ou como matéria-prima em rotas alternativas de obtenção de fertilizantes (Martins et al., 2008).

Nesse contexto, do olhar para as rochas silicáticas enriquecidas em potássio visando fertilizantes, tem-se na região nordeste do estado do Pará, ocorrências de diversos corpos ígneos com potencial para o fornecimento de potássio, como o granito Ney Peixoto, o nefelina sienito Boca Nova e o granito Ourém (Vasquez et al., 2008), sendo alguns explorados para a produção de brita. A pedreira Santa Mônica, localizada no município de Tracuateua, no estado do Pará, a principal produtora de brita da região, lavra granitoides da Suíte Intrusiva Tracuateua (SIT) (Vasquez et al., 2008). Segundo esses autores, trata-se de muscovita-biotita monzogranitos a sienogranitos, com a ocorrência ocasional de xenólitos de biotita-xistos, provável rocha encaixante da SIT. Os biotita-xistos são considerados como estéril, por não serem apropriados para a produção de brita. No entanto, podem ser aproveitados como reminalizadores de solos, a exemplo de outros biotita-xistos já utilizados no Brasil, para este fim (Martins et al., 2008, Krahl, et al., 2022; Oliveira Filho et al., 2022). Vale ressaltar que, no último trabalho de campo realizado na pedreira de Santa Mônica, observou-se que, com o avanço da lavra e expansão da cava da mineração, em algumas porções a mesma já se encontra em contato com a rocha encaixante, o que possibilitará uma maior exposição do biotita-xisto. E caso haja interesse comercial, haverá uma maior facilidade da sua extração e produção. Ou seja, a possibilidade de agregar mais valor a um produto já explorado há décadas – a brita do granito, com uma infraestrutura de britagem e logística de distribuição e comercialização já existentes – com um possível novo produto, que seria o biotita-xisto como remineralizador de solo.

Assim, no presente trabalho, buscou-se uma avaliação do potencial agromineral, não dos granitoides, mas dos biotita-xistos da pedreira Santa Monica, o estéril da produção de brita a partir daquelas rochas, em que os biotita-xistos são tidos como enclaves provenientes das rochas encaixantes desses corpos.

 

2. MATERIAIS E MÉTODOS

2.1. MATERIAIS

Foi realizada uma amostragem composta, de vários pontos de ocorrência do biotita-xisto (BX) na pedreira Santa Monica, situada no município de Tracuateua (46°55’27″W / 01°04’07″S), nordeste do estado do Pará, a 196 km da capital (Figuras 1 e 2). Na Figura 3 é apresentada uma amostra de mão representativa do biotita-xisto, objeto de estudo deste trabalho.

Figura 1 – Mapa geológico de parte da mesorregião nordeste do Pará com a localização da pedreira Santa Monica. Modificado de Vasques et al. (2008).

 

Figura 2 – Visão geral da cava principal da pedreira Santa Mônica, município de Traquateua. Fotografada em outubro de 2020.

 

Figura 3 – Amostra de mão do biotita-xisto (BX), cortado por venulações de K-feldspatos relacionados aos granitos da Suíte Intrusiva Tracuateua (SIT).

 

2.2. MÉTODOS

2.2.1. Procedimento experimental

Todos os procedimentos experimentais foram realizados no Laboratório de Caracterização Mineral (LCM) do Instituto de Geociências (IG) da Universidade Federal do Pará (UFPA), conforme as etapas apresentadas na Figura 4.

Figura 4 – Fluxograma das etapas analíticas planejadas para o desenvolvimento do presente trabalho.

 

Em laboratório, a única amostra composta de biotita-xisto (BX) com cerca de 40 quilos foi seca ao ar livre e posteriormente submetida à britagem para obtenção da fração granulométrica abaixo de 4 mm, a fim de adequar o mesmo às especificações necessárias para o estudo. Em seguida, foi realizada a homogeneização e quarteamento, sendo separada uma alíquota para arquivo. Na última etapa, a amostra foi fracionada em quatro subamostras, nas seguintes faixas granulométricas: (-4000 +1000 µm), (-1000 +300 µm), (-300 +53 µm) e (-53 µm). As quatro subamostras foram submetidas as seguintes análises de caracterização mineralógica e química.

 

2.2.2. Microscopia ótica

Foi realizada análise petrográfica de duas lâminas delgadas do biotita-xisto no Laboratório de Petrografia do IG-UFPA. Para a nomenclatura dos minerais, foram utilizadas abreviações conforme Whitney & Evans (2010).

 

2.2.3. Difratometria de raios-X (DRX)

A identificação mineralógica auxiliar a microscopia óptica foi realizada pelo método do pó em rocha total, utilizando-se um difratômetro de raios-X modelo Empyrean, da PANalytical, com tubo de raios-X cerâmico de anodo de Co (Kα1= 1,789010 Å), foco fino longo, filtro Kβ de Fe, detector PIXCEL3D-Medpix3 1×1, no modo scanning, com a voltagem de 40 kV, corrente de 35 mA, tamanho do passo 0,0260° em 2θ, varredura de 3° a 75° em 2θ, tempo/passo de 27,54s, fenda divergente 1/4° e anti-espalhamento 1/2°, máscara de 10 mm.

 

2.2.4. Espectrometria de fluorescência de raios-X (FRX)

A análise química dos elementos maiores e traço foi realizada por espectrometria de fluorescência de raios-X, com a utilização de um espectrômetro de dispersão por comprimento de onda (WDS), modelo Axios Minerals da PANalytical, com tubo de raios-X cerâmico, anodo de ródio (Rh) e máximo nível de potência 2,4 KW. As amostras foram analisadas na forma de pastilha fundida, com 1 g de amostra, 6 g de fundente (Tetraborato de Li) e 3 gotas, aproximadamente 0,15 mL, de desmoldante (tetraborato de lítio).

A aquisição e o tratamento dos dados foram realizados através do software SuperQ Manager da PANalytical. Os teores dos elementos são apresentados em % em peso de óxidos, incluindo a perda ao fogo (PF).

 

2.2.5. Espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FTIR)

Os espectros no infravermelho das amostras requeridas foram obtidos por reflectância total atenuada (ATR), utilizando-se um espectrômetro da marca Thermo, modelo Nicolet iS50 FTIR, na região espectral de 4000-500 cm-1, a 100 scans e resolução de 4 cm-1. E como pré-tratamento, as amostras foram secas a 105 °C por 24 horas. A aquisição dos dados foi realizada através do software OMNIC.

 

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1. COMPOSIÇÃO MINERALÓGICA

O resultado da análise da composição mineralógica por DRX das quatro frações granulométricas do biotita-xisto está apresentado na Figura 5.

Figura 5 – Identificação das fases minerais por DRX e confrontação dos difratogramas de cada fração granulométrica.

 

Nos difratogramas estão assinaladas as principais reflexões dos minerais identificados: quartzo (Qtz), albita (Ab) e biotita (Bt), como minerais mais abundantes, seguidos de menor quantidade de clorita (Cl), além de K-feldspato e de clinopiroxênio, como acessórios. Em relação a esses dois últimos, como a intensidade dos picos principais é muito pequena, os mesmos não foram assinalados na figura. Os difratogramas das quatro frações são muito similares entre si nas intensidades das reflexões presentes, sugerindo, portanto, similaridade nas concentrações de cada mineral entre as frações, ou seja, o fracionamento físico não provocou o deslocamento significativo de minerais para determinada fração granulométrica. Há pequenas variações nas intensidades de alguns picos que serão discutidas a seguir.

Além da indicação das reflexões (valores de d Å), foram indicados os correspondentes índices de Miller da biotita e clorita, de algumas ordens do plano principal (00l, 002, 003, etc.), juntamente com a reflexão (060), que permite identificar o caráter di- ou trioctaédrico desses minerais (Moore & Reynolds, 1997). Neste caso, o valor de d060 = 1,54 Å obtido, confirma o carácter trioctaédrico tanto da biotita, mais abundante, como da clorita presente em menor quantidade na rocha. A caulinita, se presente, como observada ao microscópio ótico (alteração argílica da albita), como será descrito a seguir, a sua principal reflexão se dá a 7,1 Å, coincidindo com a segunda ordem (002) da clorita, que está presente.

Nas figuras 6 e 7 estão apresentados um zoom apenas na região dos picos principais da biotita (Fig. 6) e quartzo e albita (Fig. 7), a fim de avaliar a proporção relativa entre as fases majoritárias, com base nas intensidades dos seus picos principais. Observa-se que, no caso do quartzo, as intensidades do pico principal desse mineral são muito próximas, para os difratogramas das quatro frações granulométricas analisadas. Porém, o mesmo não acontece para os picos principais da biotita e da albita, que apresentam nítidas variações de intensidade, mas que não estão relacionadas a variações de concentrações; e sim, ao efeito textura ou de orientação preferencial, durante a preparação da amostra. Tanto a biotita como a albita apresentam esse efeito bastante pronunciado, em função dos planos de clivagem relacionados as direções d001 (biotita) e d100 (albita).

Figura 6 – Difratogramas de raios-X das frações granulométricas estudadas, com zoom na região do pico principal da biotita (Bt).

 

Figura 7 – Difratogramas de raios-X das frações granulométricas estudadas, com zoom na região dos picos principais do quartzo (Qtz) e da albita (Ab).

 

Assim, conforme descrito anteriormente, a princípio, não há muita evidência de segregação mineralógica ao longo das frações granulométricas estudas. Dessa maneira, foi selecionada apenas uma das frações granulométricas (+53-300), para o refinamento do difratograma de raios-X pelo Método de Rietveld, a fim de se obter o resultado da análise quantitativa (Figura 8).

Figura 8 – Difratograma de raios-X da amostra (+53-300), com o resultado da análise quantitativa pelo método de Rietveld.

 

A análise petrográfica confirmou a presença dos minerais majoritários previamente descritos na análise por DRX. O biotita-xisto é constituído, majoritariamente, por albita, quartzo e biotita (Figuras 9 a e b). A biotita forma cristais subédricos, com dimensões entre 0,03 mm e 1,2 mm, apresenta coloração marrom-esverdeada, levemente pleocróica, com clivagem perfeita e unidirecional, além de moderada cor de interferência (Fig. 9a). Os cristais subédricos de albita apresentam tons cinza escuro, com dimensões entre 0,35mm a 1,4 mm e exibindo leve alteração para argilomineral (círculos na Fig. 9b). Os cristais de quartzo (incolores) apresentam formatos anédrico a subédricos, com dimensões entre 0,46mm a 0,58 mm. Verificou-se também a presença subordinada de clorita e inclusões de apatita (Fig. 9b).

Figura 9 – Fotomicrografia da mineralogia e dos aspectos texturais do biotita-xisto. a) Cristais alongados de biotita, com dimensões entre 0,03 mm e 1,2 mm, apresenta coloração marrom-esverdeada; b) Os círculos estão relacionados a cristais subédricos de albita exibindo leve alteração para argilomineral. Imagens obtidas por luz polarizada. Ab = Albita, Cl = Clorita, Ap = Apatita, Bt = Biotita e Qtz = Quartzo.

 

O espectro de FTIR da amostra de biotita-xisto é ilustrada na Figura 10. A banda de absorção que aparece em aproximadamente 3630 cm-1 foi atribuída ao movimento de estiramento do grupo Al-OH, que pode estar relacionado a hidroxilas dos filossilicatos, biotita e clorita (Schroeder, 2002). As vibrações de estiramento dos tetraedros SiO4 produzem uma banda acentuada em aproximadamente 1012 cm-1, enquanto a banda observada próximo a 790 cm-1 foi atribuída ao Al-O-Si, grupo presente em todos os minerais, exceto o quartzo (Kaur et al., 2017). A banda que aparece em 590 cm-1 é atribuída à curvatura Si-O (Orlova et al., 1974).

Figura 10 – Espectro de infravermelho do Biotita-Xisto.

 

4.2. COMPOSIÇÃO QUÍMICA

A composição química total (FRX), para as quatro frações investigadas neste trabalho, são apresentadas na Tabela 1.

 

Tabela 1 – Composição química das quatro frações granulométricas do biotita-xisto obtida por FRX.

Constituintes

Frações

Concentração (%)
1 (4-1 mm) 2 (1000-300 µm) 3 (300-53 µm) 4  (>53 µm) Média
SiO2 64,44 62,08 62,61 65,24 63,59
Al­2O3 16,24 15,98 15,92 15,47 15,90
Fe2O3 5,94 8,13 7,70 6,19 6,99
K2O 2,19 2,96 2,95 2,32 2,61
Na2O 5,00 4,23 4,28 4,62 4,53
CaO 1,58 1,20 1,07 1,18 1,26
MgO 1,99 2,57 2,57 1,99 2,28
TiO2 0,67 0,74 0,72 0,59 0,68
P2O5 0,29 0,23 0,10 0,13 0,19
PF 1,67 1,87 2,08 2,28 1,98

PF: perda ao fogo à 1000 ºC.

 

A composição química das quatro frações está coerente com a composição mineralógica do biotita-xisto, exibindo pequenas variações para a maioria dos elementos maiores analisados, o que demonstra pouco fracionamento mineral no processo de trituramento do biotita-xisto. Observa-se um ligeiro aumento de K2O, Fe2O3 e MgO nas frações 2 e 3, sugerindo que a biotita (e possivelmente o K-feldspato), além da clorita, podem apresentar certa concentração nestas duas frações. Os valores mais baixos de Na2O e CaO, nas mesmas frações, mostram que, por sua vez, a albita ficou mais concentrada nas duas outras frações. Os elevados teores de SiO2 variam pouco, mesmo assim estão mais baixos nas frações 2 e 3, o que sugere que o quartzo também foi ligeiramente fracionado e concentrado nas demais frações.

Dentre os elementos de interesse para a finalidade principal de aplicação dessa rocha como remineralizador de solos, a concentração média de K2O é de 2,61%, relacionado principalmente a estrutura da biotita, além de uma pequena quantidade de K-feldspato. Outros elementos essenciais às plantas também estão presentes, como: MgO (2,28%), relacionado a biotita, clorita e um pouco de clinopiroxênio; CaO (1,27%), que pode estar na estrutura da albita; e uma pequena quantidade de P2O5, (0,19%), relacionado a apatita, descrita na petrografia.

Ao comparar-se a composição química entre as frações granulométricas, assim como nos resultados mineralógicos, também se observa uma certa homogeneidade dos valores obtidos. Destaca-se que as duas frações centrais (1000-300 µm e 300-53 µm) estão ligeiramente mais enriquecidas em K2O e, inversamente, com menores teores de SiO2, o que de certa forma é benéfico para a diminuição da sílica livre (quartzo) de um remineralizador.

 

4.3 AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DO BIOTITA-XISTO PARA USO COMO REMINERALIZADOR DE SOLO.

Na Tabela 2 são apresentados resultados de análises químicas de elementos maiores de algumas rochas mais conhecidas no Brasil, já utilizadas como remineralizadores de solo (Martins, 2016), incluindo, para efeitos de comparação, o biotita-xisto estudado neste trabalho. São rochas relacionadas a diferentes ambientes geológicos e, em termos dos teores de potássio, destaca-se o sienito ultrapotássico da região de Ceraíma (GO), com teor muito elevado de K2O de 13,4%, relativamente próximo da composição estequiométrica de um K-feldspato (K2O = 16,92%). Por outro lado, um biotita-xisto da região central de Goiás, que já vem sendo comercializado como remineralizador de solos há bastante tempo no país, apresenta o menor teor de K2O (3,2%), das rochas da Tabela 1, um pouco acima do teor de 2,61% do biotita-xisto do presente trabalho. Vale mencionar que, segundo a Instrução Normativa No 05 de 2016, do MAPA, no seu artigo 4º, como parâmetros desejáveis, estão: a) em relação ao teor de K2O, deve ser igual ou superior a 1% (um por cento); e b) em relação à soma de bases (CaO, MgO, K2O), deve ser igual ou superior a 9% (nove por cento). No caso do presente trabalho, a soma de bases é igual a 6,15%, abaixo do requerido, porém o que pode ser alcançado através de blends com outras rochas/remineralizadores.

 

Tabela 2 – Análise química de algumas rochas mais conhecidas no Brasil, já utilizadas como remineralizadores de solo (modificada de Martins, 2016).

  SiO2 Al2O3 Fe2O3 K2O Na2O CaO MgO P2O5 MnO TiO2 PF*   S
Sienito 53,8 17,6 7,0 13,4 0,7 3,1 2,1 0,7 0,1 0,8 0,9 100,2
Biotita xisto 57,8 17,1 9,0  3,2 2,3 1,8 4,8 0,2 0,1 0,9 2,5 99,6
Fonolito 54,0 20,7 4,0  8,4 7,5 1,5 0,2 0,1 0,3 0,6 2,5 99,7
Blend 55,7 14,8 7,2 10,7 0,8 3,7 2,3 0,6 0,1 1,8 1,4 99,2
Kamafugito 43,8 10,4 12,0  3,3 1,2 12,8 8,0 0,7 0,2 3,4 4,3 100,0
Ugandito 45,8  10,5 10,7   4,7   0,8 11,9   7,9   0,8   0,2  3,1  3,8 100,2
BX (média) 63,6  15,9  6,99 2,61 4,53 1,26 2,28 0,19     – 0,68 1,98 100,0

* PF, perda ao Fogo

– Sienito, Terrativa (Ceraima-BA)
– Biotita Xisto, Pedreira Araguaia (Aparecida de Goiânia-GO)
– Fonolito, Yoorin, Mitsui e Curimbaba (Poços de Caldas-MG)
– Blend Terrativa, mistura de sienito e tefrifonolito (Goiás Velho e Acreúna-GO)
– Kamafugito, Elabore (Santo Antônio da Barra-GO)
– Ugandito, Terrativa (Acreúna-GO)
– BX, biotita-xisto (este trabalho)

Um aspecto que vale ser mencionado sobre análises de elementos maiores e traço de remineralizadores de solo está relacionado ao sódio, já que este elemento, dentro do conhecimento geral/popular, implicaria em “salinização” dos solos, sendo indesejável às plantas. A própria IN 05/2016 menciona como bases apenas CaO, MgO e K2O, porém não faz referência ao Na2O como parâmetro indesejável, como por exemplo, é feito em relação a alguns EPT (elementos potencialmente tóxicos), como As, Hg, Cd e Pb. O biotita-xisto do presente trabalho apresenta teor de Na2O relativamente elevado de 4,53%, em função da presença de concentrações elevadas de albita (39,5%, Figura 9). Porém, novamente a comparação com as rochas da Tabela 2 revela que o fonolito de Poços de Caldas, considerada como a primeira rocha no Brasil a obter registro no MAPA, como remineralizador de solos, apresenta teor de Na2O de 7,5%, quase o dobro do biotita-xisto do presente trabalho.

 

CONCLUSÕES

O biotita-xisto do presente trabalho é uma rocha composta, majoritariamente, por quartzo, albita e biotita, com menor quantidade de clorita e traços de K-feldspato e clinopiroxênio, minerais portadores dos principais elementos – as bases – de interesse em remineralizadores de solos: K2O, CaO e MgO. Apesar dos teores não serem tão elevados, comparativamente com outras rochas já utilizadas comercialmente, a mesma se encontra em um contexto geológico de uma pedreira de granito, para a produção de brita, mas que pode vir a ser utilizada como blend para comercialização como remineralizador de solo. A pedreira Santa Mônica é uma das poucas na região NE do Pará, que vem se destacando como importante polo agrícola no estado, em função da proximidade com a região metropolitana de Belém.

 

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 10.31419/ISSN.2594-942X.v102023i1agromineraisa6HMC