05 – CARACTERIZAÇÃO GEOQUÍMICA DE BASALTO AMIGDALÓIDE ALTERADO PARA USO AGRONÔMICO

Ano 07 (2020) – Número 02 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v72020i2a5RMK

 

 

Rubens Müller Kautzmann1*, Diego dos Santos de Medeiros2, Adilson Celimar Dalmora2, Marcondes Lima da Costa3, Jose Luis Cortina4, Carlos Hoffmann Sampaio5

 

1 Agência Nacional de Mineração (ANM-RS), R. Washington Luiz, 815, Porto Alegre, Brasil

rubens.kautzmann@anm.gov.br, rubensmk.engminas@gmail.com

2 Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Minas, Metalurgia e de Materiais (PPG3M), Porto Alegre, RS, Brasil

demedeiros.santos@gmail.com ; adilsondalmora@hotmail.com

3 Universidade Federal do Pará (UFPA), Instituto de Geociências (IG), Belém, PA, Brasil

marcondeslc@gmail.com, mlc@ufpa.br

4 Universitat Politècnica de Catalunya (UPC), Departamento de Ingeniería Química (TECH UPC), Barcelona, CAT), Espanha.

jose.luis.cortina@upc.edu

5 Universitat Politècnica de Catalunya (UPC), Escuela Universitaria Politecnica de Manresa, Manresa, CAT, Espanha

carlos.hoffmann@upc.edu

*Autor Correspondente.

 

ABSTRACT 

Silicate rocks, especially those of volcanic origin, have been studied and applied for rock stonemeal in agricultural soils. Recently, in 2013, the use of rock materials was approved by the Brazil’s fertilizer legislation, receiving the name of remineralizers. Due to the complex nature and mineral variability of the rocks, and the lack of consistent scientific studies, the regulations for this new mineral fertilizer product require that it has characteristics of geochemical composition that provide little information about its fertilizing properties. The present work studies the geochemical characteristics of an altered amygdaloid basalt mined, observing the release of mineral nutrients through leaching tests aiming to evaluated its use with as remineralized. The studied sample comes from mine in Santo Antônio da Patrulha, RS, from an altered basalt amygdaloid horizon, containing adsorbent minerals. Aliquots of mined material and zeolite’s amygdala selected were analyzed to assess their mineralogical, chemical and base composition. Mined material aliquots in two granulometries liable for agronomic application, were subjected to leaching in a solution of citric acid (1.6%) and deionized water, for two solid / liquid ratios (1:1 and 1:4). The results indicated the presence of zeolites and smectites in the mineral matrix, the sum of bases and levels of toxic elements that fit the sample in the category of remineralizers, and the release of mineral nutrients: Ca, Cu, Fe, K, Mg, Mn, Na, P, Si and Zn, with the highest concentration of Si and Ca in solution.  The release of a significant amount of nitrogen in the form of nitrate was also observed, with makes this altered rock very interesting to agriculture.

 Key words: silicate rock, altered amygdaloid basalt, remineralizer, geochemical characterization.

 

INTRODUÇÃO

Nas últimas duas décadas o Brasil tem liderado as pesquisas sobre a rochagem (aplicação de rochas em solo) empregando rochas silicáticas, resultando na criação de uma nova categoria de fertilizantes, o remieralizador (Theodoro, 2016). Este esforço em pesquisa está materializado nos três Congressos Brasileiros de Rochagem, em 2009, 2013 e 2016. Theodoro (2016), Knapik (2007) e Pinheiro (2018) relatam a utilização de materiais minerais como margas na Grécia e Roma antigas e por James Hutton no século XVIII. Em 1898 Julius Hensel (Hensel, 1898) escreve a obra Pães de Pedra, e é um marco ao conceito da rochagem e remineralizador, na época e ainda hoje tratado como farinha de rocha (Pinheiro, 2018; Knapick, 2007). Analise, observa e experimenta a aplicação de granitos, gnaisses e mármores na nutrição de plantas.

O processo natura do intemperismo ou climatação das rochas cristalinas (silicáticas), as principais formadoras dos solos, é sintetizado por Formoso (2006) como sendo o resultado da ação conjunta e complexa da degradação física, química e biológica das rochas, transformando minerais primários em secundários. As rochas cristalinas, com matriz aluminossilicática, têm como agente principal de intemperismo a água, promotora das reações de hidrólise. Talvez este processo químico seja o mais importante para o intemperismo, mas certamente associado à ação biológico (Formoso, 2006).  A alteração pelo intemperismo e a liberação dos elementos nutrientes pode ser maximizado ou acelerado com o aumento da superfície de contato da matéria rochosa, na forma de pó (Ramos et al. 2017).

O conceito da rochagem, com a aplicação de rocha moída ao solo, busca justamente acelerar o processo de alteração da matriz mineral da rocha promovendo disponibilidade de elementos minerais nutrientes às plantas, ou seja, a remineralização do solo. Esta prática de adubação traz vantagens aos solos tropicas, tidos como de baixa capacidade de reabastecimento com nutrientes (PRIMAVESI, 2010), justamente pela intensificação da ação de intemperismo em regiões de clima quente e úmido (Krauskoff, 1972; Formoso, 2006; Primavesi, 2010).

A utilização de rochas silicáticas, além de prover o solo alguns macronutrientes como Ca, K, Mg e P, oferece a remineralização de silício (Si) aos solos tropicas, de onde este elemento é perdido devido a lixiviação de seus horizontes superiores (Epstein & Bloom, 2006; Primavesi, 2010). Epstein & Bloom (2006) afirmam que a microbiologia negligencia o silício da mesma forma que os cultivos em soluções nutrientes.

O Si é considerado um micronutriente pela legislação brasileira, como está relacionado na Instrução Normativa SDA No 28/2007 (MAPA, 2007), porém sem especificar o protocolo ou norma para sua determinação analítica. As pesquisas sobre o Si, comumente, avaliam a aplicação de sais de silicato, como o CaSiO4, em lavouras (Maud et al., 2003; Camargo et al., 2007; Filgueras, 2007; Lima Filho, 2004). Os benefícios do Si se dão na relação planta-ambiente, tornando as plantas mais resistentes aos estresses decorrentes dos eventos climáticas e consequentes alterações de suprimento e qualidade do solo e da sua biologia. A resistência ao estresse é conferindo à maior rigidez estrutural, menor transpiração, maior resistência ao acamamento, encharcamento, veranicos e geadas e, consequente, maior tolerância às doenças e pragas, bem como neutralização ou diminuição dos efeitos tóxicos de metais pesados, como manganês, e alumínio (Lima Filho, 2004).

Ocorrem nos derrames do Grupo Serra Geral horizontes de basalto amigdaloides associados a contatos da lava com arenitos e sedimentos quartzosos, que Bergmann (2014) denomina basaltos amigdaloides a zeolitas, pela marcante presença desta espécie mineral preenchendo as amígdalas e espaços na estrutura da rocha. A assembleia mineral que preenche estas cavidades é da família da sílica (quartzo, calcedônia, calcita, esmectitas e zeolitas, estas duas últimas fases minerais são adsorventes de cátions (Bergmann, 2014; Hartmann & Duarte, 2014).

As zeolitas, muito empregadas em produtos agronômicos (Amiri, 2019), são tectossilicatos com arranjos cristalinos formando canais ou poros, carregados negativamente devido à substituição do Al3+ pelo Si4+ nos tetraedros de sílica. Isto confere às zeolitas características de elevada porosidade e capacidade de troca iônica, adsorção e seletividade. Seu emprego na agricultura visa a retenção de água e prolongar a permanência e disponibilidade dos elementos nutrientes nos solos, principalmente os de maior mobilidade como Ca, K e Si. Por sua vez, as esmectitas são filossilicatos com espaços entre camadas de sílica de carga negativa aptos a reter e trocar cátions nutrientes entre a fase sólida e solução do solo (Moraes et al. 2008; Albuquerque, Muniz & Brito, 2917). Estudo de Dalmora et al. (2020) avaliou a eficiência agronômica da rochagem aplicando andesito vesicular a zeolita e esmecita, procedente de pedreira em Estância Velha, RS, no plantio de eucalipto. Após 9 meses do plantio foi constatado incremento de K no tratamento com aplicação da rochagem e o melhor desenvolvimento em diâmetro e altura dos eucaliptos no tratamento onde o material remineralizador substituiu 50% da adubação com fertilizantes solúveis recomendado.

As qualidades adsorventes das zeolitas e esmectitas são também muito empregadas em processos de tratamento de águas e efluentes (Bossos & Enzwiler, 2002; Dezotti et al. 2008; Nakhli et al, 2017). Amostra de saibro minerado em Picada Café, RS, de horizonte alterado de rocha amigdaloide do Grupo Serra Geral foi estudado por Fialho et al. (2019) para a remoção de chumbo em solução sintética, obtendo resultado da remoção na taxa de 0,5gPb/kg de saibro.

O presente trabalho explora as características geoquímicas de amostra do material in natura, denominado comercialmente de saibro, sendo um basalto amigdaloide alterado, para seu uso como fertilizante agrícola. As características geoquímicas estudadas foram de composição e liberação de elementos nutrientes e tóxicos.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

A saibrera de onde procede a amostra para este estudo está localizada no município de Santo Antônio da Patrulha, litoral norte do Rio Grande do Sul (Figura 1). Alíquotas, da amostra principal, foram submetidas à caracterização geoquímica, visando avaliar a potencialidade da utilização deste saibro como remineralizador. Trata-se material minerado in natura para uso em aterros e pavimento de terra, portanto, de aplicação pouco nobre em obras civis.

Figura 1 – Localização da Saibrera amostrada, na área rural do Município de Santo Antônio da Patrulha, RS, Brasil. A saibrera está a sudeste do ponto de referência. As fotos mostram uma visão panorâmica do local e da frente de lavra superior.

 

A geologia do local está relacionada ao contato dos derrames do Fácies Gramado do Grupo Serra Geral e os sedimentos da Bacia do Paraná, principalmente arenitos. A mineralização das cavidades e estrutura da zona de topo do derrame por fluidos descritos como tardi-magmáticos (Bergmann, 2014). A ação do intemperismo promoveu a alteração da rocha e formação do saibro, ora minerado.

A saibrera foi amostrada em janeiro de 2019, através de coleta em canais nos três níveis da frente de lavra: superior, médio e inferior, buscando-se reunir todo espectro de variações visuais da rocha exposta. A amostra principal foi denominada SAD, com massa aproximada de 100kg. Amostras de mão de massas de zeolitas, preenchendo cavidades vesiculares e estruturas, denominada SADZ, foram coletadas de forma seletiva e aleatória, totalizando a massa aproximada de 5kg. Após homogeneização e quarteamento das amostras principais forma preparadas alíquotas enviadas para análises de composição química e mineralógica e alíquotas para os testes de lixiviação. Foram estudadas as alíquotas: SADA1 representativa da amostra principal; e SADZ1 e SADZ2 representativas dos hábitos identificados nas amostras de mão de cristais aciculares friáveis de cor branca (SADZ1) e cristais aciculares radiais de cor róseo clara (SADZ2).

Os parâmetros geoquímicos básicos exigidos para o enquadramento e registro de produto remineralizador junto ao MAPA estão estabelecidos pela Instrução Normativa – IN 05/2016 (MAPA, 2016), quais sejam: Conteúdo analítico da Soma de Bases (CaO + MgO + K2O) superior a 9%, conteúdo analítico de K2O superior a 1%, presença de sílica livre inferior a 25%, e teores limites dos elementos contaminantes: As < 15ppm, Cd < 10ppm, Hg < 0,1ppm e Pb <200ppm.

Considerando que os parâmetros de qualidade exigidos na IN 05/2016, não são suficientes para avaliar a capacidade de disponibilização dos elementos nutrientes pelo material rochoso, o trabalho sugere a realização de ensaios de lixiviação para essa avaliação. Para observar a disponibilidade de elementos minerais pela rocha foram realizados ensaios de lixiviação. Ao contrário da determinação da qualidade fértil de solos e de fertilizantes solúveis, ainda não há metodologia consagrada para avaliação da qualidade de fertilização pelos remineralizadores (rochas cominuídas). As pesquisas para avaliação da disponibilidade de elementos nutrientes em rochas cominuídas têm empregado soluções extratoras (lixiviantes) de ácidos orgânicos fracos, como os ácidos cítrico e oxálico (BERGMANN et al., 2010 e RAMOS, et al. 2015). A necessidade de observar o comportamento do material de rocha em condições de menor acidez incluiu ensaios utilizando a água pura como lixiviante, adaptando a normativa europeia de lixiviação de resíduos sólidos (European Committee for Standardization, 2002; Ramos et al., 2017).

Os ensaios de lixiviação foram realizados no Depto de Engenharia Química da TECH UPC (Universidade Politécnica da Catalunha) realizando o contato entre a alíquota sólida e a solução lixiviante em Tubos Falcon de 30 ml, submetidos a agitação de rotação vertical durante o período de 24h. Os parâmetros de lixiviação foram: i) Granulometria das amostras: 100% passante nas peneiras de 4,8mm (granulometria grossa) e de 0,6mm (granulometria média); ii) soluções lixiviantes: solução 1,6% de ácido cítrico (pH 2,91) e em água deionizada (pH 5,79); e iii) relações sólido/líquido: polpa de 1:1 (50%) e de 0,25:1 (25%). Após os ensaios procedeu-se a filtragem das amostras em filtro de 0,2 micras e o envio das soluções filtradas para análise. Observou-se ao final de todos os ensaios a presença de material muito fino, que dificultou o processo de filtragem.

As análise procedidas para a caracterização dos parâmetros exigidos pela IN 05/2016 e dos licores lixiviados foram: i) espectrometria de fluorescência de raio X (FRX), para determinar o conteúdo de bases na forma de seus óxidos, realizada pela SGS Geosol; ii) espectrometria de plasma indutivamente acoplado (ICP OES/MS) de alíquota mineral solubilizada por digestão em água régia para analise multielementos, realizada pela SGS Geosol; iii) determinação de Hg por Geração de Vapor Frio e leitura em Absorção Atômica – AAS, realizadas pela SGS Geosol; iv) espectrometria de difração de raio X (DRX), para conhecimento qualitativo das fases minerais cristalinas realizada no laboratório do Grupo de Mineralogia e Geoquímica Aplicada – GMGA da UFPA (Universidade Federal do Pará); v) espectrometria de plasma indutivamente acoplado, em equipamento ICP-MS, Thermo Scientific – X-series II, para analises das concentrações dos elementos lixiviados realizado no laboratório do Depto de Engenharia Química – TECH UPC; e vi) espectrometria por cromatografia iônica (CI), em equipamento Dionex ICS- 1100/ICS-1000, para determinação das espécies iônicas presentes nas lixivias experimentais, realizado no laboratório do Depto de Engenharia Química – TECH UPC.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O ambiente geológico de procedências da amostra SAD está contido no Bloco (I) Litoral Norte, conforme distribuição das regiões de ocorrências e minas dos basaltos amigdaloides a zeolitas proposta por Bergmann et al. (2013). A paragênese comum observada para este bloco é constituída das zeolitas laumontita, escolecita e heulandita e minerais subordinados da família da sílica e calcita. As análises por espectrometria DRX revelaram os constituintes de minerais cristalinos da amostra SADA1 (Quadro 1) e SADZ1 e SADZ2 (Quadro 2).

O difratograma (Figura 2) da alíquota de saibro (SADA1) indica a presença de minerais com características adsorventes da família das zeolitas e do grupo das esmectita, e a presença de feldspato plagioclásio (albita).

Figura 2 – Difratograma da amostra de saibro SADA1, Santo Antônio da Patrulha, RS.

 

A Tabela 1 lista os minerais cristalinos predominantes na amostra SADA1 e suas respectivas fórmulas químicas gerais e densidades.

 

Tabela 1 – Fazes cristalinas predominantes na amostra SADA1. Análise DRX.

Mineral Grupo/Família Fórmula (geral) Densidade
Albita Feldspato (Plagioclásio) Na0.95Ca0.05Al1.05Si2.95O8 2,62
Cabazita – Na Zeolita (Cabazita) Na2,K2,Ca,Mg)[Al2Si4O12]•6(H2O 2,09
Cabazita – K Zeolita (Cabazita) (K2,Ca,Na2,Mg)[Al2Si4O12]•6(H2O) 2,09
Cabazita – Ktr. Zeolita (Cabazita) (K2,Ca,Na2,Mg)[Al2Si4O12]•6(H2O) 2,09
Faujasita – Na Zeolita (Cabazita) (Na2,Ca,Mg)3.5[Al7Si17O48]•32(H2O) 1,93
Montmorilonita Esmectita Na0.2Ca0.1Al2Si4O10(OH)2(H2O)10 2,35
Saponita Esmectita Ca0.1Na0.1Mg2.25Fe2+0.75Si3AlO10(OH)2•4(H2O) 2,30

 

A diminuição da densidade pode ser correlacionada ao aumento da porosidade da estrutura cristalina, sendo menores para as zeolitas e esmectitas. As zeolitas e esmectitas são minerais estáveis (menos reativos ao intemperismo), e por isso, preservados no basalto alterado. A albita identificada no difratograma (Figura 2) é passível de alteração com estabilidade moderada ao intemperismo (KRAUSKOFF, 1972 e MELLO; PEREZ, 2009). Portanto, a expectativa de disponibilidade de nutrientes deste saibro ao solo agrícola deve se dar, principalmente, pela conclusão do processo de intemperismo na massa microristalina e amorfa, ainda não alterada totalmente, e menos pela alteração do plagioclásio sódico (albita).

Os resultados qualitativos da análise mineralógica por DRX permite afirmar que a amostra possui menos de 25% de sílica livre, e portanto, atendendo a esta condição de registro de remineralizador conforme a IN 05/2016.

As amostras SADZ1 (Figura 3) e SADZ2 (Figura 4) mostram nos difratogramas a predominância apenas de minerais de zeolita.

Figura 3 – Difratograma da amostra de zeolita SADZ1, Santo Antônio da Patrulha, RS.

 

Figura 4 – Difratograma da amostra de zeolita SADZ2, Santo Antônio da Patrulha, RS.

 

As zeolitas encontradas na amostra SADA1 (Tabela 1) são de Séries de Zeolitas distintas e de maior densidade do que aquelas encontradas nas amostras SADZ1 e SADZ2 (Tabela 2). No saibro (SADA1) identificou-se zeolitas da Séries Cabazita (d=2,09) e Faujasita (d=1,93), enquanto que nas amostras de zeolitas puras (SADZ1 e SADZ2) as zeolitas identificadas foram das Séries Heulanditas (d=2,15) e Natrolita (d=2,28). Para estudos futuros, direcionados à compreensão das qualidades de troca iônica e retenção de elementos, esta característica mineral deve ser observada.

 

Tabela 2 – Fazes cristalinas predominantes nas amostras SADZ1 e SADZ2 A1 por análise de DRX.

Mineral Série Fórmula* Densidade* Amostra
Estilbita-Ca Heulandita NaCa4Al8Si28O72•30(H2O) 2,15 SAD Z1
Estellerita Heulandita CaAl2Si7O18•7(H2O) 2,12 SAD Z2
Escolecita Natrolita CaAl2Si3O10•3(H2O) 2,28 SAD Z1, SAD Z2
Tridimita Silica SiO2 2,30 SAD Z1

* Mineralogy Database (webmineral.com)

 

A análise por FRX (Tabela 3) indica os elementos predominantes, na forma de seus óxidos simples. A soma de bases (CaO + K2O + MgO) alcançou 9,9% e o K2O de 2,16%, portanto, atendendo nestes quesitos as exigências para o registro como remineralizador.

Os resultados de FRX mostram também a presença do macro nutriente fosforo (P2O5=0,16%). A análise traz ainda o valor elevado da perda ao fogo (LOI) de 5,2%, o que pode ser atribuído a perda da água nas estruturas das zeolitas e esmectitas.

 

Tabela 3 – Composição dos elementos predominantes expressos em óxidos simples. Análise DRX amostra SAD.

Elemento

(oxido simples)

%
Al2O3 14,6
CaO 3,7
Fe2O3 10,1
K2O 2,16
MgO 4,04
MnO 0,16
Na2O 2,99
P2O5 0,16
SiO2 56,4
TiO 1,12
LOI 5,2

 

A análise por ICP (Tabela 4) revela a presença dos elementos menores presentes na fase mineral, que podem atuar como micronutrientes ou aportar toxidade ao remineralizador.

A análise multielemento, além de confirmam a presença dos macronutrientes Ca, K, Mg e P, em proporções semelhantes àquelas expressas pelos seus óxidos simples na análise por FRX, identifica a presença de Cu, Fe, Mn, Mo,n Na e Zn, que se disponibilizados, podem atuar como micronutrientes, e assim, promovendo efetivamente a remineralização de solos pobres. Os teores de elementos tóxicos As, Cd, Hg e Pb apresentam níveis abaixo dos valores máximos admitidos pela IN 05/2016, para remineralizador. A presença de Cr está abaixo do nível máximo de 500 ppm, exigido para substratos agronômicos, conforme a IN SDA 27/2006, revisada em 2016 (MAPA, 2016b).

 

Tabela 4 – Composição elementar da rocha. Teores dos principais elementos nutrientes e tóxicos obtidos por espectrometria ICP.

Elemento Teor
Al 3,34 %
As 2 ppm
B <10ppm
Ba 74ppm
Ca 1,78%
Cd 0,12 ppm
Cr 200 ppm
Cu 50,6 ppm
Fe 6,02 %
Hg < 0,05 ppm
K 0,15%
Mg 1,86%
Mn 1.003 ppm
Mo 0,51 ppm
Na 0,19 %
P 586 ppm
Pb 8,7 ppm
Zn 84 ppm

 

No entanto, sem desconsiderar os parâmetros geoquímicos estabelecidos na normativa do MAPA para o enquadramento como fertilizante remineralizador, a efetiva remineralização do solo dependerá, principalmente, da susceptibilidade ao intemperismo dos minerais de rocha, para liberar seus elementos nutrientes ao solo. Os ensaios de lixiviação, longe de reproduzirem o comportamento do remineralizador no solo, permitem uma primeira avaliação sobre a liberação dos elementos minerais, considerando a importância das reações de hidrólise no intemperismo das rochas (Formoso, 2006).  Antes de discutir os resultados dos ensaios de lixiviação, é importante ter presente que a confirmação dos comportamentos aqui observados necessitará da continuidade e aprimoramento da metodologia experimental.

A Tabela 5 apresenta os resultados das concentrações dos elementos lixiviados para as distintas condições do tipo de lixiviante e pH inicial, da relação sólido/liquido e da granulometria das alíquotas. Os resultados dos valores de pH finais mostram que o saibro estudado promoveu o incremento de pH independente das duas condições das soluções testadas, com os valores finais entre os pH 7 e 8.

A expectativa de observar alguma tendência de liberação controlada pelos parâmetros relação sólido/líquido, tipo de solução e pH inicial não são as mesmas para todos os elementos, o que pode ser resultado de uma variabilidade de composição das alíquotas resultante do uso de granulometrias grosseiras na faixa das areias, e possível segregação dos minerais entre as faixas granulométricas.

 

Tabela 5 – Concentrações dos elementos no licor após 24 h de lixiviação da amostra SAD sob agitação a temperatura de 25oC, para duas condições de granulometria (100% < 0,6mm e 100% < 4,84mm), duas relações sólido líquido (1g;1ml e 1g:4ml), e duas soluções iniciais de lixiviação (ácida: solução de ácido cítrico a 1,6%, pH 2,91; e neutra: água deionizada, pH 5,79).

Granul. < 0,6 mm Granul. < 4,84 mm
1:1 (ácido) 1:4 (ácido) 1:1 (neutro) 1:4 (neutro) 1:1 (ácido) 1:4 (ácido)
pH final 7,13 7,14 7,63 7,95 8,02 7,33
  ppb ppb ppb ppb ppb ppb
Al 364 5.758 320 243 1.154 5.939
Ca 4.097 5.083 5.529 540 33.206 22.294
Cu 5 8 10 1 2 11
Fe 590 11.767 315 295 521 3.843
K 1.015 1.983 2.754 1.695 356 814
Mg 3.273 3.983 3.037 498 16.636 10.164
Mn 5 50 4 7 143 1.082
Na 39.025 15.457 25.715 8.149 16.282 9.391
P 96 33 169 49 90 461
Si 24.646 30.016 22.495 19.382 14.186 14.317
Zn 48 39 41 5 2 8
As 51 4 22 0,5 0,5 1
Cd nd Nd nd nd nd nd
Hg 1 1 2 1 2 2
Pb nd Nd 1 nd 1 nd

 

Para o parâmetro granulometria observou-se comportamentos específicos para os elementos lixiviados. As maiores concentrações de Ca e Mg nas soluções com alíquotas de maior granulometria, enquanto que para o K as concentrações maiores foram obtidas das alíquotas com menor granulometria, parece indicar haver diferença de composição mineral entre as alíquotas de granulometria distintas.

Observa-se que os elementos Al e Fe apresentaram para a relação sólido/líquido menor (1:4) em ensaios com solução iniciais ácidas. É possível que a condição ácida tenha se mantido por mais tempo favorecendo a condição dissolvida dos cátions de Al e Fe (Mello & Perez, 2009).

Comparando as concentrações de Si e Al para as diferentes condições de ensaio, nota-se que o Si apresentou valores de 3 a 8 vezes superior ao do Al. Este comportamento era esperados pois enquanto a atividade do Si aumento com o pH a do Al diminui (Mello & Perez, 2009).

De maneira geral, os ensaios mostraram dois níveis de lixiviação dos elementos: os mais disponíveis Al, Ca, Fe, K, Mg, Na e Si; e os menos disponíveis, entre eles Cu e P. No entanto, a complexidade e o conhecimento insipiente da composição da rocha amostrada, e os diferentes equilíbrios químicos que as fases minerais podem tem frente a lixiviação (FORMOSO, 2006 e MELLO; PEREZ, 2009) trazem esta complexidade para a interpretação dos ensaios de lixiviação.

Ao estudo incluiu-se um último ensaio de lixiviação para analisar a presença de íons, principalmente o nitrato. Apesar da mineralogia descartar a presença de nitrogênio, aplicações empíricas de material semelhante indicaram boa resposta a nitrificação do solo. A Tabela 6 apresenta os resultados das concentrações de cátions e ânions encontrados na lixiviação de alíquota de saibro.

 

Tabela 6 – – Concentrações de cátions e ânions no licor após 24 h de lixiviação em água destilada da amostra SADA1 sob agitação a temperatura de 25oC na granulometria de100% < 0,6mm, e relação sólido líquido 1:4.

Íon Na+ NH4+ K+ Mg2+ Ca2+ Cl NO3 PO43- SO42-
Lixivia (ppm) 26,5 0,7 16,3 7,2 36,0 6,8 164,3 16,9 7,3

 

A expectativa de haver compostos nitrogenados retidos na matriz do saibro foi confirmada e é atribuída à presença de minerais adsorventes no basalto amigdaloide alterado e as condições de intemperismo, onde a mata atlântica úmida recobre a rocha e aporta a rocha subjacente seus fluidos orgânicos estabilizados. O nível de concentração de nitrato detectado na lixivia foi considerado elevado, representando um aporte de nitrato ao meio aquoso de 0,7mg de NO3/ g de saibro.

 

CONCLUSÕES

Os resultados da caracterização geoquímica da amostra de basalto amigdaloide alterado (saibro) satisfazem às exigências normativas para fins de registro de produto remineralizador junto ao Ministério de Agronomia, Pecuária e Abastecimento (MAPA).

A análise qualitativa por DRX do saibro amostrado (SAD A1) revela a presença de minerais cristalinos, como plagioclásio (albita), zeolitas (Série da Cabazita) e esmectitas. Estudos de amostras de zeolita coletados mostraram a presença de zeolitas das Séries da Heulandita e Natrolita.

A influência da granulometria e relação sólido/líquido utilizadas nos ensaios não foram constatadas nestes experimentos exploratórios. Admite-se a possibilidade de segregação de espécies minerais e, portanto, na composição e liberação de elementos, em diferentes faixas granulométricas. Estudos neste sentido devem ser aprofundados.

Houve disponibilidade de macro e micronutrientes minerais, principalmente o silício (Si). O condicionamento ambiental do horizonte rochoso amostrado, em zona de mata atlântica, promoveu a acumulação de compostos da degradação de matéria orgânica, liberando na lixiviação com água deionizada composto de nitrogênio na forma de nitrato.

As propriedades de disponibilidade de nutrientes minerais, incluindo o nitrogênio, são indicativos da potencialidade de uso deste material na rochagem de solos ou seu uso como substrato para plantas.

Considerando os resultados deste estudo exploratório amostras do material foram encaminhadas para estudos de avaliação de eficiência agronômica e produção de solução hidropônica.

 

Agradecimentos

Os autores agradecem aos recursos financeiros do CNPq e da ANM (DNPM) e à mineradora J. F. Rost Martins pelo apoio na coleta da amostra.

 

REFERÊNCIAS

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 10.31419/ISSN.2594-942X.v72020i2a5RMK