02 – SEIXOS DE FOSFATOS-SULFATOS DOS MINERAIS DO SUPERGRUPO ALUNITA NOS ALUVIÕES DIAMANTÍFEROS DE PAININN ÀS MARGENS DO TAPAJÓS EM ITAITUBA (PARÁ): GOYAZITA-FLORENCITA-GORCEIXITA-CRANDALLITA-ESVANBERGITA/WOODHOUSEITA

Ano 08 (2021) – Número 02 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v82021i2a2MLC

 

 

PHOSPHATE-SULFATE PEBBLES FROM THE ALUNITE SUPERGROUP MINERALS IN THE PAININN DIAMOND ALLUVIONS ON THE MARGINS OF THE TAPAJÓS IN ITAITUBA (PARÁ): GOYAZITE-FLORENCITE-GORCEIXITE-CRANDALLITE-SVANBERGITE/WOODHOUSEITE

 

Marcondes Lima da Costa1*

Marcus Antônio Girão de Brito1

Mário Luiz de Sá Carneiro Chaves2

Herbert Pöllmann3

Helmut Hohn (in memoriam)1

 

1Programa de Pós-graduação em Geologia e Geoquímica (PPGG) do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará, Belém, Pará, Brasil;

2Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil;

3Martin-Luther Universität Halle-Wittenberg, Institut für Geologische Wissenschaften, Halle an der Saale, Alemanha;

*Autor para correspondência.

 

Obs.: O conteúdo deste artigo foi extraído e adaptado da dissertação de Mestrado de Marcus Antônio Girão de Brito, defendida em 2000 no Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará, em Belém, Pará, por iniciativa de Marcondes Lima da Costa, o orientador da referida dissertação. Ela contou com a participação e idealização de Helmut e contribuição analítica de Herbert Pöllmann e Mário Chaves. As figuras e tabelas nesse processo perderam qualidade em suas resoluções, pois foram obtidas do pdf escaneado em sistema ainda muito arcaico. Infelizmente Marcondes não teve acesso aos originais dessas ilustrações. Mas se preferiu divulgar assim mesmo, tendo em vista que se considerou de extrema importância geológica o acesso a esses dados esquecidos em uma dissertação de mestrado. Também se procurou manter ao máximo a íntegra da redação original, quando possível (Texto de autoria de Marcondes Lima da Costa).

 

ABSTRACT

The diamond alluvium gravels from the Painin garimpos, on the right bank of the Tapajós River, in Itaituba, Pará, stand out for the marked presence of pebbles from <1 cm to about 10 cm in diameter consisting of aluminum phosphate-sulfates (APS minerals) from the alunite supergroup: goyazite-florencite-gorceixite-crandallite-esvanbergite/woodhouseite. They are light gray pebbles, still containing small amounts of pyrite, kaolinite, goethite and anatase. The total chemical and trace element analyzes confirm the indicated mineralogical constitution alongside the XRD. The florencite member is mainly dominated by Ce, La, Nd and Sm, the light rare earth elements, and also contains anomalous concentrations of Nb, Y, Pb, U and Th. This chemical nature of these pebbles, in part, makes it possible to compare them with the diamond satellite beans (favas) in secondary deposits in Brazil, but chemically only with the phosphates from Malawi and Sayan.

Keywords: APS; plumbogummite; Itaituba Formation; Alluvium Deposits; Rare Earth Elements; Strontium; Barium.

 

RESUMO

Os cascalhos dos aluviões diamantíferos do garimpo de Painin, na margem direita do rio Tapajós, em Itaituba, Pará, se destacam pela presença marcante de seixos de <1 cm a cerca de 10 cm de diâmetro constituídos por fosfatos-sulfatos de alumínio do supergrupo da alunita: goyazita-florencita-gorceixita-crandallita-esvanbergita/woodhouseita. São seixos de cor cinza clara, contendo ainda pequenas quantidades de pirita, caulinita, goethita e anatásio. As análises químicas totais e de elementos traços confirmam ao lado da DRX a constituição mineralógica indicada. O membro florencita é dominado principalmente por Ce, La, Nd e Sm, os elementos terras raras leves e contém ainda concentrações anômalas de Nb, Y, Pb, U e Th. Essa natureza química desses seixos, em parte permite compará-los com as favas dos satélites de diamantes em depósitos secundários do Brasil, mas quimicamente apenas com os fosfatos de Malawi e Sayan.

Palavras-chave: APS; plumbogummita; Formação Itaituba; Depósitos Coluviais; Elementos Terras Raras Leves; Estrôncio; Bário.

 

INTRODUÇÃO

O garimpo de diamante Painin (Folha Capituã SB.21-X-A-II), está situado na margem direita do rio Tapajós, a 10,7 km em linha reta a sudeste da cidade de Itaituba. A principal frente de extração garimpeira está sob as coordenadas 04°0 20′ 49,6″ S e 56° 02′ 27,1″ W. Os diamantes eram explorados de coluviões/aluviões quaternários, depositados na base das encostas dos afloramentos da Formação Monte Alegre e principalmente no :fundo dos vales sobre os calcários da Forma9ao Itaituba, e por vezes preenchendo “marmitas” desenvolvidas nos folhelhos da For ao Barreirinha. São sequências grano decrescentes ascendentes, cuja base representa o nível de cascalho diamantífero, constituído predominantemente por seixos ou fragmentos de quartzo, de rochas diversas (arenito, granitos, gnaisses e quartzitos), de crosta lateritica ferruginosa e fosfatos de alumínio. A geologia da área do garimpo Painin compreende a Formação Barreirinha – constituída por folhelhos cinza escuros, aflorantes apenas no fundo dos vales; a Formação Itaituba – representada por blocos de calcários desmantelados in situ, creme amarelados, fossilíferos (principalmente fósseis de bivalves) e com geodos de calcita; Formação Monte Alegre –  a unidade dominante na área representada por arenitos amarelos, cinzas, brancos avermelhados, finos a grossos, friáveis, com matriz caulínica, intercalados por folhelhos e siltitos cinzas a roxos e com níveis de conglomerados.

Os seixos de fosfatos de alumínio, relativamente frequentes, se destacam no cenário dos depósitos e da geologia regional, e foram motivos de estudos, cujos resultados são apresentados neste trabalho. “Favas” (seixos) de fosfatos de alumínio não são raros em depósitos secundários de diamantes no Brasil (Chaves, 1991;1997).

Figura 1 – Mapa de localização geográfica da área em estudo, ressaltando a reserva garimpeira de ouro. Observar no canto inferior esquerdo da figura de detalhe a localização do garimpo Painin. Brito (2000)

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Os trabalhos de campo foram realizados no período 18/07 a 07/08/1998 na área do garimpo do Painin. Nesta oportunidade foram realizados a sua cartografia geológica, elaboração de perfis geológicos e coleta de amostras. As análises de laboratórios foram realizadas no Instituto de Geociências da UFPA (DRX e microscopia ótica), na Geosol (Análises químicas totais), na Universidade Federal de Minas Gerais (MEV/EDS), na Universidade Federal da Bahia (Microssonda Eletrônica) e no Institut fur Geologische Wissenschaften em Halle (MEV/EDS), na Alemanha.

As análises por difração empregaram goniômetro Philips PW 3020 com fenda de divergência automática e monocromador de grafite; tubo de raios X com anodo de cobre, operando a 45 kV e 40 mA com varredura continua de 0,04° 20/s e amostragem a cada 0,02° 20; controle automático Philips PW 3710 acoplado ao microcomputador. Os difratogramas foram interpretados com o auxílio do software APD (Automated Powder Difraction) e as fichas PDF do ICDD (International Centre for Diffraction data).

Os parâmetros da cela unitária, foram determinados a partir de amostras monominerálicas devidamente selecionadas em microscópio. Os cálculos de refinamento foram feitos de acordo com o método de mínimos quadrados.

As análises químicas para os elementos maiores e traços foram realizadas por fluorescência de raios X (FRX) e espectroscopia de emissão atômica acoplada com plasma de argônio induzido (ICP), a partir de digestão multiácida das amostras de seixos de fosfatos. A determinação dos elementos terras raras foi feita por ativação de nêutrons. A determinação dos elementos foi feita por espectrometria de raios gama.

Empregou-se a Microscopia Eletrônica de Varredura com espectroscopia de energia dispersiva (MEV/EDS) (JEOL – JSM 6300 – Baltec SCD 050 – Link-ISIS/EDX Software) pertencente aos laboratórios do Institut fur Geologische Wissenschaften da Universidade de Halle.

As análises por Microssonda Eletrônica foram conduzidas nos laboratórios da Universidade Federal da Bahia. As alíquotas das amostras foram previamente metalizadas com carbono e então analisadas com a microssonda SX Cameca sob as seguintes: 15 kV de tensão, corrente de 10 a 30 mA e tempo de contagem de 5 a 20 s, conforme o elemento químico analisado.

 

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Modo de ocorrência e características gerais dos seixos de fosfatos

Os seixos de fosfatos estão contidos em um nível aluvionar, conglomerático logo abaixo de camada de solo areno argilo amarelado, entre 1,20 a 1,70 m de profundidade, em contato irregular com os calcários da formação Itaituba (Figura 2). Os seixos são cinza esverdeados, hem arredondados, compactos, com até 10 cm de diâmetro maior (Figura 3), dominando os grãos de areia media a grossa, mal selecionados e angulosos. Esses seixos representam 2 a 5% do cascalho concentrado estudado. Os seixos individualmente, no geral, apresentam três zonas concêntricas distintas: externa, intermediária e interna. A zona externa apresenta cor cinza clara a marrom esverdeada, textura porosa e espessura de até 2 mm. A zona intermediaria é marrom a cinza amarelada e com espessura média de 1 mm. A zona interna é cinza esverdeada a amarelada, microcristalina com textura microporosa a microcavemosa homogênea e estrutura coloforme abrangendo de 80 a 90 % da área externa de cada seixo. Essas zonas são representadas por concentrações variadas de oxi-hidróxidos de ferro, normalmente mais abundantes nas zonas mais externas, respondendo pela tonalidade marrom. Em alguns locais a massa fosfática altera-se para material cinza esbranquiçado de contorno irregular, observada em cerca 40% dos seixos. Observa-se, também, associadas à massa fosfática raras inclusões e vênulas de uma segunda fase fosfática. A massa fosfática também engloba outros minerais como goethita, pirita ou marcassita e anatásio, representando 1 a 2 % das amostras. Os seixos menores (até 2 cm) são conhecidos localmente por “feijão” e segundo os garimpeiros locais sua presença é indicativa da ocorrência de diamante na região do garimpo. Por apresentarem essa afinidade com o diamante desse garimpo foram investigados em detalhe.

Figura 2 – Seção geológica do barranco à margem direita da drenagem principal do garimpo de diamantes do Painin, ressaltando o nível de colúvio-aluvionar diamantífero. Brito (2000).

 

Figura 3 – Morfologia de seixos de fosfatos do garimpo de diamantes de Painin. a – Seixo com cerca de 10 cm diâmetro maior; b – Seção delgada de a (I, II e III correspondem as zonas externa, intermediária e interna, respectivamente); c – Imagens de seixos de fosfatos menores (< 1,5 cm) que ocorrem entre outros com composição distinta entre os seixos que acompanham o diamante no garimpo Painin. Brito (2000).

 

Constituição mineralógica

As análises realizadas por DRX, MEV/EDS, além de microssonda demonstram claramente que os seixos de fosfatos associados aos diamantes de Painin estão representados pelos minerais do grupo da plumbogummita (ou mesmo supergrupo alunita), ou minerais APS (aluminum phosphate sulfate minerals segundo Dill, 2001), segundo a solução sólida crandallita-goyazita-florencita-svanbergita (Figura 4; Tabelas 1 a 3). Nesta solução o membro dominante é a goyazita, seguido pela florencia, gorceixita e crandallita. Soluções ou membros isolados deste grupo são encontrados em várias partes do mundo: florencitas e goyazitas nos carbonatitos de Nyasaland, Jangnyka e Kenya (Mckie 1962 apud Lemos & Costa 1987); florencita em Bicas, MG, Zaire, Sayan, Siberia, Urais, Narrubia (Svisero et al. 1984); crandallita na região de Santa Luzia (Oliveira 1978 e Oliveira & Schwab· 1980) e na África Ocidental (Flicoteaux & Lucas 1983 apud Lemos & Costa 1987). Dill (2001) faz um largo apanhado sobre os minerais APS (Aluminum Phosphate-Sulphates), sua ambiência e distribuição geológicas, demonstrando que são minerais bem mais frequentes do que se conheciam e que se formam desde o ambiente supergênico até o hidrotermal. Costa et al (2016) abordam esses minerais no ambiente laterítico para na Amazônia Oriental (Nordeste do Pará e Noroeste do Maranhão), em que o membro dominante é a crandallita-goyazita.

Figura 4 – Difratograma de amostra de seixo de fosfatos de alumínio (APS) do garimpo de diamantes de Painin. Anodo de cobre. Brito (2000).

 

Os principais constituintes químicos desses seixos (Tabela 1) são Al2O3, P2O5, SrO, TR2O3, BaO e CaO, além de PF, cujos valores não variam muito entre as amostras. Essa variação é mais significativa para BaO e TR2O3. Os valores totais, que estão na ordem de 93 a 96 %, indicam a presença de outros elementos presentes, não analisados. Na tabela 2, cujos resultados foram obtidos por microssonda eletrônica, fica evidente, que se trata de SO3. Também se destacam os teores muito elevados de Nb, Th e U, além de Pb (Tabela 2) nesses minerais.

A partir dessas análises químicas e daquelas mineralógicas por DRX foi possível calcular as proporções de cada um membro da ´série, exceto, a esvanbergita, que não foi identificada inicialmente no trabalho apresentado ainda em 2020. Nesses seixos a série ou solução sólida está representada por 91,3 a 97,3% de goyazita-florencita-gorceixita-crandallita-(esvanbergita/woodhouseita). A proporção entre os membros é variável, tendo sempre a goyazita como membro dominante, com concentração variando de 52,7% a 64,3%, seguida pela florencita (10,5% a 19,4%), gorceixita (8,2% a 16,7%) e crandallita (8,8% a 14,7%) (Tabela 2).

 

Tabela 1 – Composição química (obtida por FRX) de seixos de fosfatos de alumínio do garimpo de diamantes do Painin. Brito (2000).

 

Tabela 2 – Composição química de seixos de fosfatos de alumínio do garimpo de diamantes de Painin, obtida por Microssonda Eletrônica (WDS). Brito (2000).

 

Tabela 3 – Abundância (% em peso) do grupo da crandallita e/ou plumbogummita e fórmula mínima calculada a partir dos resultados de análises químicas obtidas por FRX em seixos da região de fosfatos do garimpo de diamantes de Painin. A esvanbergita/woodhouseita não foi considerada na dissertação inicial, e, por conseguinte suas proporções não foram calculadas. Os teores de SO3, na ordem de 6 % em peso (Tabela 2), são relativamente elevados, demonstrando que esvanbergita nestes seixos se encontra bem representada nesta série. Modificado de Brito (2000).

Amostras Teor de fosfato de alumínio (em %) Solução sólida
P-1 92,4 Gz51.4 Fl 11,3 Gx Cn9,6
P-2 96,7 Cz61,6Fl 14,3 Gx11,9 Cn8,9
P-3 93,2 Cz 55,9 Fl14,0 Gx13,0 Cn10,3
P-4 93,3 Cz 52,1 Fl13,6 Gx12,3 Cn14,8
P-5 95,1 Cz 59,5 Fl11,9 Gx13,4 Cn10,3
P-6 91,3 Cz 55,9 Fl14,3 Gx11,5 Cn9,6
P-7 96,6 Cz 58,0 Fl10,8 Gx16,1 Cn’11,1
P-29 94,1 Cz61,1Fl15,4 Gx3,2 Cn8,9
P-30 94,8 Cz60,6 Fl11,2 Gx12,1 Cn10,3
P-31 95,3 Cz61,5 Fl14,5 Gx 10,5 Cn3,9
P-35 96,6 Cz60,0 Fl10,6 Gx16,4 Cn 9,6
P-37 96,4 Cz 59,0 Fl 15,1 Gx 12,1 Cn9,6
P-39 97,3 Cz61,0 Fl15,3 Gx10,8 Cn9,6
P-45 94,3 Cz 52,1 Fl19,4 Gx11,9 Cn10,3
Media 94,8 Cz 58,4 Fl14,2 Gx12,1 Cn10,1
Gz – goyazita Fl – florencita Cn – crandallita Gx -gorceixita

 

Os resultados de quatro amostras desses mesmos fosfatos de alumínio analisados por microssonda eletrônica mostram que a série goyazita-florencita-gorceixita-crandallita apresenta concentrações entre 82 e 87,1%, mantendo-se a goyazita como membro dominante (52,4% a 53,6%), seguindo­ se a florencita (8,3% a 12,3%), gorceixita (7,7% a 15,6%) e crandallita (9,3% a 10,9%). Essas concentrações estão nas mesmas ordens de grandeza das obtidas para rocha total (Tabela 3).

 

Tabela 4 – Abundância (% em peso) do grupo da crandallita e/ou plumbogummita e fórmula mínima fosfatos de alumínio do garimpo de diamantes de Painin, cujas análises químicas foram obtidas por ME (WDS). Brito (2000).

Amostras analisadas Total de fosfatos

em cada amostra

Fórmula mínima

calculada

P-1 82,0    Gz52,1 Fli2,3 Gx1,1 Cn9,3
P-5 85,7 Cz 53,3 Fl10,0 Gx 12,1 Cn 9,7
P-35 87,1 Cz 53,6 Fl8,3 Gx15,6 Cn 9,6
P-37 87,0 Cz 52,4 Fl10,9 Gx12,8 Cn10 9
Média 85,5 Cz 53,0 Fl10,2 Gx12,2 Cn9,9
Gz – goyazita Fl – florencita Cn- crandallita   Gx- gorceixita

 

A abundância com base nos resultados das análises químicas obtidas por FRX mostram     que os fosfatos constituem em média 94,8% das amostras, seguidos por anatásio (2,1%), goethita ± pirita (1,7%) e caulinita (0,5%) (Tabela 5). Já a abundância determinada a partir dos resultados das análises por microssonda eletrônica (Tabela 6) indica que esses mesmos fosfatos são constituídos em média por 85,5% do grupo da crandallita; 0,4% de anatásio; 0,8% de goethita + pirita e 0,7% de caulinita (Tabela 4). A abundância do grupo da crandallita determinada a partir de WDS e inferior a 10% se comparada com a obtida por FRX, sendo observada as seguintes diferenças entre os membros da série: gorcexita (5,4%), florencita (4%), goyazita (-0,1%) e crandallita (0,2%). Em termos gerais pode-se considerar que as amostras de seixos de fosfatos de alumínio do garimpo de Painin em termo de concentração de fosfatos de alumínio do grupo da crandallita são relativamente homogêneas. Deve-se ressaltar que o único elemento ETR analisado por microssonda eletrônica foi o cério, resultando na menor abundância do membro florencita, com base nesse método, embora na tabela 1, os teores incluam a maioria dos ETR.

 

Tabela 5 – Abundância mineralógica (% em peso) dos fosfatos de alumínio do Painin, com base nas análises químicas por FRX. Brito (2000).

Amostras Grupo da crandallita Anatásio Goethita e pirita Caulinita Total
P-1 92,4 2,7 1,5 1,0 97,6
P-2 96,7 1,9 0,8 0,6 100,0
P-3 93,2 1,7 1,8 0,2 96,9
P-4 93,3 2,5 2,1 0,3 98,1
P-5 95,1 2,3 2,8 0,2 100,4
P-6 91,3 2,0 1,4 0,3 95,0
P-7 96,6 1,7 0,7 0,2 99,2
P-29 94,1 2,0 3,7 0,5 100,3
P-30 94,8 1,9 2,5 0,6 99,8
P-31 95,3 1,4 2,3 1,4 100,4
P-35 96,6 2,3 1,4 0,2 100,5
P-37 96,4 2,8 0,8 0,3 100,3
P-39 97,3 1,8 1,2 0,4 100,7
P-45 94,3 2,0 1,2 0,9 98,4

 

 

Tabela 6 – Abundância mineralógica (% em peso) dos fosfatos do Painin, com base em microssonda eletrônica (WDS). O trabalho original não levou em conta a esvanbergita/woodhouseita representada por SO3. Modificado de Brito (2000).

Amostras Grupo da crandallita Anatásio Caulinita Goethita + pirita Total
P-1 82 1,1 0,9 84,0
P-5 85,7 0,1 1,1 86,9
P-35 87,1 0,5 87,6
P-37 87 0,6 0,2 0,7 88,5

 

Figura 5 – Imagens de microscopia eletrônica de varredura (MEV) e espectros analíticos químicos de EDS pontuais para o material dominado pela série da crandallita nos seixos de fosfatos do garimpo de diamante do Painin. a – Matriz fosfática (cz-cn), mostrando inclusão de pirita e/ou marcassita (pr); b e c – Espectro analítico de EDS mostrando a composição química correspondente ao grupo da crandallita (cz-cn) e a pirita e/ou marcassita, respectivamente (Continua);

Figura 5 – (Continuação); d – matriz fosfática com inclusão de anatasio (an); e – Espectro analítico de EDS sugerindo presença de anatásio; f – matriz fosfática com goethita (gt); g – Espectro analítico de EDS indicando possível domínio de goethita. Brito (2000).

 

Comparados com fosfatos do grupo da crandallita em outros depósitos e ocorrências mundiais, os de Painin encontram apenas ligeira correlação com aqueles de Sayan e Malawi em termos de SrO e em parte TR2O3 e fica muito distante da composição dos fosfatos da região do Gurupi, em que o membro dominante é a crandallita e crandallita-goyazita (Tabela 7). Da mesma forma a correlação entre as concentrações de alguns elementos traços (Tabela 8), Pb, Th, U e Nb, estão em geral em valores muito acima dos fosfatos de mesmo grupo na região do Gurupi, que são sabidamente lateríticos. Modificado de Brito (2000).

 

Tabela 7 – Composição química média das amostras de fosfato de alumínio dos seixos do garimpo de diamantes de Painin comparadas com aquelas de fosfatos similares em outras regiões mundiais. Brito (2000)

Óxidos em % Painin1 Painin2 Maicuru3 Malawi 4 Diaman-tina5 Sayan 6 Urais7 Gurupi8 Itacupim9 Jandiá10
Al2O3 29,90 30,90 23,60 29,80 32,00 34,49 24;39 31,40 20,86 22,2
SiO2 0,24 0,25 6,64 32,2
Fe2O3 1,27 0,82 2,72 1,41 1,46 4,90 39,21 7,00
MgO 0,01 0,01 0,15 2,30 0,81 0,38 0,07
CaO 1,40 1,35 2,86 1,60 0,40 1,50 6,20 2,59 3,00
BaO 3,64 3,67 0,10 0,02
SrO 13,11 11,89 0,55 9,00 7,87 5,00 1,39 1,52
Na2O 0,01 0,03 0,20 0,62 1,50
TR2O3        4,86

P2O5          20,30

TiO2            2,07

SO3            > 1,20

3,38 19,82 17,60 28,40 19,19 31,69 0,03
31,30 26,20 26,00 28,60 23,28 27,27 30,30 13,00 18,20
0,30 2,28 0,49 0,6
6,00 0,99
H2O na na 16,32 12,90 na 11,11 11,46 17,2 na
Total 78,01 89,9 94,70 97,00 91,70 98,16 98,15 95,00 85,79 86,34

 

1 Grupo da crandallita, média de 14 análises por FRX (neste trabalho); 2 Grupo da crandallita, média de 48 análises por microssonda eletrônica (WDS) (neste trabalho); 3 Fosfatos de alumínio lateríticos de Maicuru (Lemos & Costa 1987); 4, 5, 6 e 7 Florencita de Malawi, Diamantina, Sayan e Urais,         respectivamente (Svisero et al. 1984); Fosfatos lateriticos da região do Gurupi (Costa 1982); Horizonte de fosfatos de alumínio de Itacupim (Oliveira 1980);  10 Fosfatos de alumínio lateriticos de Jandiá (Costa 1990 c); > 1,2 maior que.

 

Tabela 8 – Correlação entre as concentrações médias de elementos traços na crosta terrestre, nos seixos de fosfatos de alumínio do garimpo de diamantes de Painin e da região do Gurupi. Brito (2000).

Média Crustal1 Painin2 Painin3 Pirocaua4 Trauira5 Jandiá6 Itacupim7
Pb 13 873 185,5 8 65 18 13
U 2,3 na 242,3* 1-26    
Th 8 54 461,5* na    
Co 29 39 na 2 1 3
Cu 68 59 na 54 5 12 113
V 136 234 na 806 222 567
Mo 1,2 40* na 25* 4 21·
Nb 20 <20 2412* na 237 91 133
Ga 19 49 na 63 31 52
Y 31 360* 39,5 117 16 232
F 544 2212* na    

 

 

1Segundo Fairbridge (1972); 2 Grupo da crandallita, média de 14 análises por FRX (neste trabalho); 3 Grupo da crandallita, média de 48 análises por microssonda eletrônica (WDS) (neste trabalho); 4 e 5 Fosfatos de alumínio lateríticos da região do Gurupi: Pirocaua e Trauira, respectivamente (Costa 1982); 6 Fosfatos de alumínio lateríticos da região do Gurupi: Jandiá (Costa 1990c); 7 Horizonte de fosfatos de alumínio lateríticos da região do Gurupi: Itacupim (Oliveira 1980).  Os valores em negrito estão acima da média crustal. * Valores acima de 10 x àquele da média crustal.    Na:  não analisado.

 

As concentrações dos elementos terras raras nos seixos de fosfato de alumínio de Painin (Tabela 9) variam de 0,60 a 30,000 ppm, sendo mais abundantes, em ordem decrescente, Ce, Al, Nd, Sm e Eu, com os respectivos teores médios: Ce (26351,21), La (10891,79), Nd (7707,571), Sm (796,86) e Eu (147,43). É evidente o domínio dos elementos terras raras leves (TRL) sobre os pesados (TRP). Portanto o membro florencita correspondente principalmente aos elementos Ce, La, Nd, Sm, Eu e Tb, perfazendo de 99,95% do total dos elementos terras raras.

 

Tabela 9 – Concentração (ppm) dos elementos terras raras em amostras de seixos de fosfatos de alumínio do garimpo de diamantes do Painin. Brito (2000).

Amostras La Ce Nd Sm Eu Tb Yb Lu
P-1 12634 29090 8026 764 134 33 19,00 0,60
P-2 10623 24810 8454 845 150 49 11,70 1,07
P-3 10336 24097 8135 769 139 52 11,00 1,22
P-4 10750 24057 7484 685 123 50 13,80 2,10
P-5 8811 21188 6954 776 151 53 12,00 1,52
P-6 10924 24926 8038 935 179 56 10,90 1,18
P-7 8207 19749 6862 804 156 59 15,00 1,55
P29 12000 30000 na na na na na na
P30 8400 22000 na na na na na na
P 31 13000 30000 na na na na na na
P 35 7800 21000 na na na na na na
P37 12000 29000 na na na na na na
P39 12000 31000 na na na na na na
P45 15000 38000 na na na na na na
Média 10892 26351 7708 797 147 50 13,3 1,32

na: não analisado

 

Karfunkel & Chaves (op. cit.) e Chaves (1997) ao estudarem detalhadamente várias frentes de extração garimpeira, ao norte da serra do Cabral, demonstraram que a camada mineralizada é uma coluvião com predomínio de clastos de quartzitos da serra do Espinhaço; esta camada pode recobrir tanto as rochas dos grupos Macaúbas (tilitos) e Bambuí (metassedimentos), como os quartzitos Espinhaço; e está posicionada invariavelmente nas bordas das áreas mais elevadas. Tais observações levaram esses autores a concluir que a origem dos diamantes, nessa região, estaria associada aos conglomerados aflorantes sobre as porções mais elevadas das serras do Cabral (em São Francisco Dumont), Água Fria e Porteiras (em Jequitaí). Segundo esses mesmos autores, os conglomerados estão localizados em porções isoladas, topograficamente controlados por cotas de 1000 m, na área estudada. São provavelmente correlatos ao Membro Abaete da Formação Areado, posicionada no Cretáceo Inferior, onde ocorrem conglomerados diamantíferos, semelhantes aos aflorantes na serra do Cabral, em altitudes de 900-930 metros, associados às cabeceiras dos rios de Janeiro e do Boi. Consequentemente, essa ampla distribuição do conglomerado Abaeté representa um fator decisivo na redistribuição dos diamantes na região do Médio São Francisco, provavelmente oriundos de fontes secundárias Pré-cambrianas.

Na Província Mineral do Tapajós as atividades garimpeiras estão direcionadas principalmente para a extração de ouro (Faraco et al.,1997). Segundo Leal et al. (1996) nessa região, ao norte da cidade de Itaituba, no passado, garimpou-se diamante. Collyer et al. (1998) registram no mapa gemológico do Pará essa região como de grande potencialidade para diamante. Souza (1998) relaciona os diamantes de alguns garimpos da região do Médio Rio Tapaj6s, nas proximidades da cidade de Itaituba, a níveis conglomeráticos com espessura máxima de 1,5 metros, constituídos predominantemente por seixos e blocos de quartzo com diâmetro máximo de 20 cm.

 

CONCLUSÕES

Os seixos de fosfatos de alumínio, frequentes no colúvio e paleocolúvio do garimpo de diamantes (e ouro) de Painin, são constituídos principalmente da série goyazita-florencita-gorceixita-crandallita-(esvanbergita), além de pequenas concentrações de caulinita, pirita, goethita e anatásio, todos formando uma massa microcristalina. Sua composição não encontra paralelo com fosfatos desta série muito abundantes nos fosfatos lateríticos da região do Gurupi, mas encontrando certa convergência com os fosfatos de Sayan e Malawi que são mais ricos no membro florencita. No entanto vale ressaltar que os membros esvanbergita/woodhouseita foram identificados nos fosfatos lateríticos da mina de Sapucaia em Bonito. Esses fosfatos ainda não foram identificados na região de Itaituba e entorno, e por enquanto se apresentam como uma excentricidade. Fosfatos desta série, com domínio de goyazita, são reportados em depósitos aluviais de diamantes em Goiás e Minas Gerais, daí a inclusive o nome goyazita, e na linguagem garimpeira conhecidos como favas.

 

Agradecimentos

Ao CNPQ através do projeto “Mineralogia e Geoquímica de Sistemas Supergênicos da Amazônia” e Taxa de Bancada concedida ao segundo autor, pelo suporte financeiro; ao prof. Dr. Mario Sá Carneiro pelas discussões técnicas relevantes e análises químicas por microssonda eletrônica; aos laboratórios químicos e mineralógicos (prof. Thomas Scheller e geóloga Walmeire Costa) do Instituto de Geociências pelo apoio analítico; a Dra. Regina Beck pelo apoio analíticos dos ETR através do IPEN; aos colegas de Grupo de Mineralogia e Geoquímica Aplicada (GMGA): Rômulo Angélica, Rosiney Araújo e Daniel Souza.

 

REFERÊNCIAS

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 10.31419/ISSN.2594-942X.v82021i2a2MLC