02 – COMPOSIÇÃO MINERALÓGICA E QUÍMICA MULTIELEMENTAR E ESPECTRO DE MINERAIS PESADOS DA COBERTURA (ARGILA DE BELTERRA) DE UMA FRENTE DE LAVRA DE BAUXITAS DE MILTÔNIA, PARAGOMINAS, PARÁ

Ano 09 (2022) – Número 02 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v92022i2a2RSL

 

 

Mineral and multielementary chemical composition and heavy minerals spectrum of the cover (Belterra Clay) of a bauxite mining front in Miltônia, Paragominas, Pará

 

1Ricardo Silva Lima

2Pabllo Henrique Costa dos Santos

3Hélcio J. Prazeres Filho

4Marcondes Lima da Costa

1Instituto de Geociências e PROPESP/UFPA, Bolsista PIBIC CNPQ/UFPA, Belém, Pará, ricardosl8502@gmail.com

2Museu de Geociências e Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará, Belém, Pará, phsantos@ufpa.br

3Hydro Paragominas – Mina de Bauxita, Estrada da Mineração, Km 30 a partir da BR 010, s/n – Platô Miltônia, 68625-970 Paragominas, Pará, HELCIO.Filho@hydro.com

4Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica e Museu de Geociências do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará, Belém, Pará, marcondeslc@gmail.com

 

ABSTRACT

Three representative samples from a section on the Belterra Clays – ABT, the cover of bauxite from the Miltônia mine in Paragominas, state of Pará, were investigated for their mineralogical composition, multielement chemistry and spectrum of heavy minerals. The results showed the dominance of kaolinite, goethite, hematite, quartz and even anatase, and consequent dominance of SiO2, Al2O3, Fe2O3 and TiO2. Trace element concentrations are at or below the crustal level, except for those elements concentrated by lateritic processes. The main heavy minerals are zircon, rutile and tourmaline, the ZTR. These data show that the investigated ABT is similar to those of other bauxite deposits in Pará.

Keywords: Kaolinite; gibbsite; goethite; zircon; tourmaline; trace elements; Rare Earth elements;

 

INTRODUÇÃO

Sobre os depósitos de bauxita na região amazônica comumente encontra-se uma cobertura argilosa denominada Argila de Belterra (ABT), termo atribuído por Sombroek (1966). A sua origem é atribuída ao intemperismo dos perfis lateríticos bauxíticos pré-existentes, sob intenso clima tropical úmido que atingiu a região após a formação das bauxitas, ocorrendo tanto de forma autóctone como alóctone, embora ainda haja controvérsias (Costa, 1991; Horbe, 1995; Horbe e Costa, 1997, 1999, 2005; Kotschoubey et al., 2005). Para acessar o minério que está subjacente, é necessário remover a ABT, cuja espessura nas frentes de lavra de Miltônia pode alcançar 12 m, representando um custo elevado (Barreto e Costa, 2018).

A lavra da bauxita no município de Paragominas, no estado do Pará, iniciou-se em 2007 e é atualmente operada pela Norsk Hydro SA. Durante todo este período, a cobertura vem sendo depositada em pilhas de estéril e atualmente na própria cava, sem ser utilizada para outras finalidades. Ainda assim, a ABT já se mostrou promissora para diversas aplicações, como a síntese de geopolímeros (Barreto e Costa, 2021), cerâmica vermelha (Barreto e Costa, 2018) e cimento com baixa emissão de CO2 (Negrão e Costa, 2021)

Embora já se tenha bastante informações sobre a ABT, incluindo suas propriedades físicas, granulométricas, mineralógicas e químicas (Horbe e Costa, 2005; Barreto e Costa, 2018; Barreto e Costa, 2021; Negrão e Costa, 2021), essas informações são ainda muito gerais, e se fazia necessário conhecer em melhor detalhe dentro da própria mina. Considerando que dados mineralógicos mais detalhados podem subsidiar o desenvolvimento de novas aplicações dos materiais da mina, este trabalho tem como objetivo geral determinar a composição mineralógica e químicas da Argila de Belterra, e a extração e identificação dos minerais pesados.

 

CONTEXTO GEOLÓGICO

A região de Paragominas é por lateritos bauxíticos em formação completa ou truncada e a cobertura tipo Argila de Belterra, derivados das rochas sedimentares cretácias das formações Itapecuru e Ipixuna (Kotschoubey et al., 2005 (Figura 1). Os perfis lateríticos compreendem os seguintes horizontes (da base até o topo): saprolítico, bauxitífero inferior, ferruginoso, e bauxitífero superior/pisolítico (Costa, 1991; Kotschoubey et al., 2005).

No horizonte bauxítico inferior encontra-se minerais como gibbsita (mais abundante), caulinita, hematita e goethita. Sobre esse horizonte ocorre o horizonte ferruginoso de cor marrom-avermelhada, rica em hematita, goethita e gibbsita. O horizonte bauxítico superior apresenta coloração amarronzada, de aspecto porcelanado para o topo, além de hospedar com frequência fragmentos do horizonte ferruginoso. É dominada por gibbsita, além de caulinita. Sobre o horizonte bauxítico superior repousa a Argila de Belterra, dominada por caulinita, com gibbsita restrita, além de goethita e/ou hematita, portado com certa similaridade mineralógica com os horizontes subjacentes (Costa, 1991; Kotschoubey et al., 2005).

 

Figura 1: Mapa geológico simplificado do município de Paragominas, com a localização da mina de bauxita de Miltônia, operada pela Hydro. Modificado de Vasques e Rosa-Costa (2008).

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Para a realização do presente trabalho foram coletadas seis amostras de 20 kg da ABT na frente de lavra da mina de bauxita Miltônia em Paragominas: duas na base, duas no meio e duas no topo da cobertura. Estas amostras foram cedidas pela Hydro à Universidade Federal do Pará, através do Projeto Desenvolvimento de aplicações tecnológicas para a cobertura e o resíduo argiloso alta alumina da bauxita tipo Paragominas, convênio 4486 FADESP/UFPA/HYDRO. Em laboratório, foram extraídas alíquotas de 2 kg, que passaram por análises mineralógicas, químicas e micromorfológicas.

Avaliação dos aspectos texturais

Para a descrição macroscópica e imageamento das amostras, utilizou-se moldes espumosos (EVA) com furos circulares com diâmetros de 6,5 cm e espessura de 8 mm, aproximadamente.

Caracterização mineralógica

Separou-se 20 g do material de cada uma das alíquotas para a secagem em estufa a 40ºC por 48 h. Após a secagem, começou-se a preparação das amostras para as análises por difração de raios-x (DRX) e análises químicas, através da pulverização em gral de ágata (Fig. 3-B). Preparou-se 5g das seis alíquotas para a análise de DRX, as quais foram analisadas pelo difratômetro Bruker D2 Phaser, equipado com tubo de cobre, operando a 300 W (30 KV x 10 mA) no intervalo de varredura de 5 a 75° 2Theta, realizada no Laboratório de Mineralogia, Geoquímica e Aplicações (LaMiGA). Os resultados foram tratados no software X’pert Highscore Plus e o banco de dados do International Center on Diffraction (ICDD).

Extração dos minerais pesados

Para o estudo dos minerais pesados, alíquotas de aproximadamente 300 g foram retiradas das amostras da base, meio e topo. As alíquotas foram peneiradas a úmido em malhas com abertura de 65#, 115#, 250# mesh, para a obtenção das frações areia muito fina (115 a 250#) e fina (#65 a 115#), retirando a fração argilosa do material. As frações retidas foram secadas em estufa a 40ºC por 24 h. Depois da secagem, foram destinadas a um separador magnético Frantz, utilizando a inclinação longitudinal de 25º e a latitudinal variando de 10º a 15º, com a corrente variável de 1,0 a 1,5 A, no Laboratório de Geologia Isotópica (Pará-Iso).

Os minerais não magnéticos e uma pequena parte dos magnéticos remanescentes foram submetidos, posteriormente, a concentração com líquido denso (bromofórmio), em que foram extraídos os minerais pesados, então analisados com auxílio de Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV) HITACHI TM 3000, elétrons secundários; e análises químicas semiquantitativas por SED (Sistema de Energia Dispersiva), Oxford SwiftED3000. As condições analíticas utilizadas foram de 15 kV, para a voltagem de aceleração, com um feixe de diâmetro de 50 μm e filamento de tungstênio como fonte de elétrons.

Uma parte restante foi destinada ao Laboratório de Laminação, para confecção de lâminas polidas e então analisadas com microscópio óptico de luz transmitida (petrográfico) Leica DM 2700 P, com câmera Leica MC170 HD acoplada. Já os concentrados obtidos para os pesados magnéticos foram pulverizados em gral de ágata para análise por DRX no Bruker D2 Phaser, equipado com tubo de cobre, operando a 300 W (30 KV x 10 mA) no intervalo de varredura de 5 a 75 °2Theta.

Análises químicas

Das frações de 15 g restantes de amostras, preparou-se três alíquotas, que foram enviadas ao laboratório comercial ALS para a análises químicas totais multielementares. As amostras sofreram fusão total com metaborato de lítio, foram dissolvidas e então submetidas ao ICP-AES (espectrômetro de emissão atômica com plasma indutivamente acoplado) para determinação dos elementos maiores, menores e metais base; os demais elementos traços, terras raras e metais preciosos por ICP-MS (espectrômetro de massa com plasma indutivamente acoplado). A perda ao fogo (PF) foi determinada por gravimetria, após a calcinação das amostras a 1000 °C, já o carbono total (C-T) e o enxofre total (S-T) por LECO (absorção de infravermelho e condutividade termal).

 

Figura 2: Procedimentos analíticos utilizados para preparação de amostras e análises mineralógicas, micromorfológicas e químicas (A). Gral de ágata utilizado para pulverização das amostras (B).

 

RESULTADOS

Aspectos texturais

As amostras de ABT (Figura 3) apresentam textura argilo-arenosa com nódulos pequenos pouco resistentes com diâmetros que variam de 3 mm a 13 mm e cor vermelho-amarelada (5YR – 5/8) de acordo com a carta de cores de solos de Munsell (2000).

 

Figura 3: Coloração e características texturais das amostras ABT – Base – 1(A), ABT – Base – 2 (B), ABT– Meio – 1 (C), ABT – Meio – 2 (D), ABT – Topo – 1 (E) e ABT – Topo – 2 (F).

 

Composição mineralógica

A amostra ABT-Base-1 (Figura 4) é formada por caulinita, gibbsita, goethita, hematita e o quartzo, como minerais principais, e anatásio como acessório, de forma similar para as demais amostras investigadas. Porém caulinita aumenta para o topo, da mesma forma goethita, enquanto gibbsita e hematita diminuem neste sentido.

 

Figura 4: Difratogramas de raios X das amostras ABT-Topo-1 (A), ABT-Topo-2 (B), ABT-Meio-1 (C), ABT-Meio-2 (D), ABT-Base-1 (E) e ABT-Base-2 (F), com as fases identificadas. Caulinita (Kln), gibbsita (Gbs), goethita (Gt), quartzo (Qtz), anatásio (Ant), hematita (Hem).

 

Minerais pesados

Grande destaque para o zircão (96%), com rutilo (3%) e turmalina (1%) muito restritos. As variedades morfológicas dos grãos de zircão e rutilo estão indicadas nas figuras 5 e 6 em imagens obtidas com microscópio óptico e MEV. A variedades morfológicas da turmalina foram observadas apenas por MEV (Figura 7).

 

Figura 5: Grãos e cristais de zircão e rutilo nas amostras do meio e do topo da ABT. Imagens obtidas ao microscópio petrográfico, sob luz transmitida e nicóis paralelos.

 

A figura 6 apresenta as variedades morfológicas dos cristais de zircões obtidas com MEV e confrontadas com aquelas da classificação de Pupin (1980), identificados através das imagens de MEV de amostras da base do perfil.

Os zircões são comumente incolores ou castanhos, por vezes avermelhados. Além disso, apresentam a forma de cristais prismáticos euédricos e subédricos, que tendem a subarredondados (Figuras 6 A, C, D, G e H) e subangulares (Figuras 6 B, E, F e I). Os grãos apresentam fraturas superficiais e cavidades, sugestivas de retrabalhamento superficial e corrosão, respectivamente (Figuras 6 A, B, C, G e I). Pela classificação de Pupin (1980) as formas mais comuns de zircão são as do tipo P e S. O tipo P corresponde a granitos de fontes alcalinas; já o S, granitos com fonte cálcio- alcalinas (Pupin, 1980).

 

Figura 6: Imagens de MEV das principais formas dos tipos de zircões e possíveis morfologias baseadas na classificação de Pupin (1980).

 

Os grãos de rutilo variam de vermelho a marrom, em formas anédricas a prismas subédricos. Quanto ao arredondamento, podem ser arrendondados (Figuras 7 A e C) e subarrendondados (Figuras 8B, D e E). Alguns grãos estão fraturados (Figuras 7 A, C e E). As turmalinas são majoritariamente verdes claras, localmente marrons, geralmente em formas prismáticas; além de subarredondadas (Figuras 7 F,G, H e I).

 

Figura 7: Imagens de MEV das principais formas de rutilo (A, B, C, D e E) e turmalina (F, G, H e I).

 

Os concentrados pesados magnéticos (Figura 8) são formados por hematita (Hem), ilmenita (llm), pseudorutilo (Psr) em todas as amostras investigadas. rutilo (Rtl), quartzo (Qtz), turmalina (Trm) foram eventualmente detectados.

 

Figura 8: Difratogramas de raios-X das amostras ABT-Topo-1 (A), ABT-Meio-1 (B) e ABT-Base-1 (C).

 

Composição química

A composições química das amostras de ABT mostra homogeneidade composicional para os constituintes principais: SiO2 (26,3 a 31,3%), Al2O3 (37 a 40%), valores quase constantes de Fe2O3 (9,25 a 9,4%) e de TiO2 (2,51 a 2,79%) (Tabela 1). Os dados obtidos corroboram a composição mineralógica identificada por DRX. Os elementos-traço e os ETR (elementos terras raras) também são apresentados na Tabela 1, e as variações entre as amostras é também pequena, como demonstra a figura 9. Os elementos traços mais abundantes são Zr, que corresponde ao mineral pesado mais abundante, zircão; V, Cr, Nb, Ga, Hf, Th, Ce e La, que estão acima de 50 ppm, e da média crustal, algo frequente em formações lateríticas.

 

Tabela 1: Composição química das amostras estudadas: elementos maiores (% peso); elementos- traço e ETR (ppm) confrontadas a CCS (Rudnick e Gao, 2003) e NASC (Gromet et al., 1984).

Óxidos/Elementos químicos ABT-Base-1 ABT-Topo-1 ABT-Meio-1 CCS NASC
SiO2 (%) 26,3 31,3 30,7 61,5 64,8
Al2O3 38,2 37,0 40,0 15,1 16,9
Fe2O3 9,4 9,25 9,36 6,28 5,66
TiO2 2,79 2,51 2,63 0,68 0,70
MgO <0,01 <0,01 <0,0

1

3,7 2,86
CaO 0,01 0,01 0,01 5,5 3,63
Na2O <0,01 <0,01 <0,01 3,3 1,14
K2O 0,02 0,02 <0,01 2,4 3,97
MnO 0,04 0,03 0,03 0,1 0,06
PF 18,9 17,95 18,75 N. A. N. A.
Total 95,59 98,0 101,44 N. A. 100
C-T 0,18 0,22 0,21 N. A. N. A.
S-T 0,04 0,05 0,05 N. A. N. A.
Sc (ppm) 11,0 12,0 10,0 14,0 14,9
V 184,0 169,0 163,0 97,0 N. A.
Cr 150,0 140,0 140,0 92,0 124,5
Co 0,8 2,0 1,0 17,3 5,09
Ni 6,0 7,0 9,0 47,0 58,0
Cu 3,0 3,0 3,0 28,0 N. A.
Zn 12,0 15,0 18,0 67,0 N. A.
Ga 69,1 62,4 58,5 17,5 N. A.
As 0,9 1,0 1,2 1,4 28,4
Se 0,2 0,13 0,15 0,09 N. A.
Rb 0,5 0,7 0,7 84,0 125,0
Sr 25,0 22,0 20,1 320,0 142,0
Y 41,2 34,1 28,6 21,0 N. A.
Zr 1960,0 1780,0 1555,0 193,0 200,0
Nb 71,4 64,6 58,8 12,0 N. A.
Mo 4,0 3,0 4,0 1,1 N. A.
Ag 0,4 0,4 0,4 0,053 N. A.
Cd 0,4 0,4 0,4 0,09 N. A.
Sn 16,0 7,0 7,0 2,1 N. A.
Ba 20,8 19,0 17,0 628 636,0
Hf 50,4 45,8 40,2 5,3 6,3
Ta 5,2 4,4 3,0 0,9 1,12
W 7,0 6,0 6,0 1,9 2,1
Hg 0,065 0,167 0,361 0,05 N. A.
Pb 29,0 26,0 20,0 17 N. A.
Th 64,6 57,3 53,8 10,5 12,3
U 5,25 4,53 4,22 2,7 2,66
La 50,0 42,3 35,7 31,0 31,1
Ce 67,8 60,9 54,3 63,0 66,7
Nd 18,5 16,0 13,8 27,0 27,4
Sm 3,09 2,6 2,19 4,7 5,59
Eu 0,69 0,56 0,51 1,0 1,18
Gd 3,67 3,11 2,64 4,0 6,1
Dy 5,56 4,78 3,87 3,9 5,4
Ho 1,43 1,2 1,03 0,83 N. A.
Er 5,23 4,3 3,72 2,3 3,21
Yb 6,73 5,51 4,71 1,96 3,06
Lu 1,1 0,88 0,75 0,31 0,456
ΣETRL 135,75 124,43 109,18 121 125,2
ΣETRM 7,45 6,27 5,34 9,7 12,87
ΣETRP 20,05 16,67 14 9,3 12,13
ΣETR 163.25 147,39 128,8 140,0 150,20

 

Figura 9: Distribuição das concentrações dos elementos químicos maiores, menores e traço, incluindo os ETR, na base, meio e topo da ABT.

 

DISCUSSÃO

A composição mineralógica obtida é compatível com Barreto e Costa (2021) e Costa (1991). Já as composições químicas estão próximas das descritas por Barreto e Costa (2018) e por Negrão et al. (2018). O padrão de distribuição dos elementos-traço normalizados pela CCS e ETR normalizados pelos condritos são compatíveis com a cobertura argilosa analisada por Kotschoubey et al. (2005) na região de Paragominas.

A alta concentração de Al2O3 e elevados teores de Fe2O3 e TiO2, assim como a os baixos teores de K2O, Na2O, CaO e MgO e sugerem a lixiviação dos elementos mais móveis e o enriquecimento dos menos móveis, como Al2O3, Fe2O3 e TiO2 (Costa et al., 2014). O teor de TiO2 está distribuído no rutilo, ilmenita e pseudorutilo, além do anatásio. A PF (18,53 % em média) está relacionada à presença da caulinita (mais abundante), gibbsita e goethita, além da matéria orgânica possivelmente presente no topo do perfil.

A Figura 10 confronta a composição química da ABT de Paragominas com aquela de outras regiões detentora de bauxitas no estado do Pará (Rondon do Pará, Juruti e Trombetas).

A distribuição dos óxidos elementos maiores (SiO2, Al2O3, Fe2O3 e TiO2) e PF é similar aos valores obtidos por Costa et al. (2014) em Juruti, Pantoja (2015) em Rondon do Pará e Lima (2018) em Trombetas, com pequenas diferenças nos valores médios de SiO2 e Fe2O3 (Figura 10). Isto demonstra que a ABT apresenta características químicas e mineralógicas semelhantes entre as suas diversas ocorrências nos depósitos de bauxita do Pará.

 

Figura 10: Teores médios dos elementos maiores da Argila de Belterra de Paragominas confrontadas com os teores da Argila de Belterra das regiões de Juruti (Costa et al., 2014), Rondon do Pará (Pantoja, 2015) e Trombetas (Lima, 2018).

 

Os elementos traço foram normalizados com base na CCS (Figura 11 A) e NASC (Figura 11 B); e os ETR, com base na composição dos condritos investigados por Evensen et al. (1978) (Figura 11 C) .A ABT analisada apresenta elementos em concentrações abaixo da CCS (As, Co, Cu, Ni, Rb, Sr, Zn e Ba) e outros consideravelmente acima desta média (Bi, Cr, Ga, Hf, Mo, Nb, Pb Sn, V, W, Y e Zr), com destaque para Hf e Zr, em concentrações 7 a 10 vezes acima da CCS (Figura 11 A). Este padrão é semelhando ao verificado quando os valores são normalizados pelo NASC (Figura 11 B). Vanádio, Cr, Ga relacionam-se com os óxi- hidróxidos de ferro identificados na ABT (Maclean et al., 1997; Costa et al.,2014). A normalização pelo NASC exibe padrão similar. As concentrações de ETR aumentam de maneira gradativa junto ao Zr (Tabela 1), sugerindo que o zircão é o principal portador ETR (Costa et al., 2014; Kotschoubey et al., 2005).

Quando normalizada aos condritos, os ETR apresentam padrão de distribuição em “V”, com anomalia negativa de Eu. Além disso, pode-se notar enriquecimento dos ETRL em relação aos ETRP (Figura 11 C).

 

Figura 11: Normalização das concentrações elementos traços para a ABT com Crosta Continental Superior da Terra – CCS (Rudnick e Gao, 2003) (A). Com NASC (Gromet et al.,1984) (B). E dos ETR na base, meio e topo da ABT com os condritos (Evensen et al.,1978) (C).

 

Os minerais pesados identificados são compatíveis com os mais abundantes identificados nas coberturas argilosas do perfil laterito-bauxítico de Rondon do Pará (Pantoja, 2015) e Trombetas (Lima, 2018).

O pseudorutilo é uma fase intermediária de alteração da ilmenita. Essa alteração envolve os processos de oxidação e lixiviação do ferro da estrutura, o qual é progressivamente removido, gerando como produto de residual o pseudorutilo (Teufer e Temple, 1966). Dessa forma, uma parte das ilmenitas presentes na ABT foram, possivelmente convertidas em pseudorutilo, como resultado do intemperismo químico típico de regiões tropicais como a Amazônia (Teufer e Temple, 1966; Costa 1991).

 

CONCLUSÕES

As amostras de ABT investigadas são essencialmente compostas por caulinita, gibbsita, quartzo, goethita e hematita, contendo anatásio como acessório, além de zircão, rutilo, turmalina, ilmenita e pseudorutilo, similarmente às demais no estado do Pará; consequentemente são dominadas por SiO2, Al2O3, Fe2O, TiO2 e PF.

Os dados obtidos sobre a composição mineralógica e química (elementos maiores e elementos-traço), exceto quanto aos minerais pesados por não se disponibilizar desses anos nos outros, permitem correlacionar a ABT da mina de bauxita de Miltônia, em Paragominas com outros depósitos como os de Juruti, Trombetas e Rondon do Pará. Dessa forma, pode-se inferir que esta cobertura passou por transformações e evoluções semelhantes a essas outras regiões.

A micromoforlogia dos minerais pesados mostrou-se diversificada, entre grãos prismáticos eurédicos e subédricos, apresentando grau de arredondamento variável: subangulares (zircões), subarredondados e arredondados (rutilos) ou até fragmentos desses grãos (principalmente os zircões), além de fraturas e cavidades, sugerindo diferentes passos evolutivos. Ademais, foi possível inferir possíveis origens para os zircões analisados: granitos derivados de magmas alcalinos e magmas cálcio- alcalinos.

Os elementos-traço na ABT apresentam comportamento de normalização semelhante a CCS e a NASC. Arsênio, Co, Cu, Ni, Rb, Sr, Zn e Ba estão em concentrações abaixo destes valores, enquanto Bi, Cr, Ga, Hf, Mo, Nb, Pb Sn, V, W, Y e Zr estão acima, com destaque para Zr e Hf, que estão de 7 a 10 vezes acima de CCS e NASC. Além disso, pode-se afirmar que os elementos como V, Cr, Ga, foram possivelmente incorporados pela estrutura dos oxi-hidróxidos de ferro.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão da bolsa de iniciação científica a RSL; a bolsa de produtividade em pesquisa e taxa de bancada a MLC (CNPQ processo 305015/2016-8; projeto de pesquisa CNPQ processo 442871/2018-0 e convênio 4486 (HYDRO/FADESP/UFPA) e aos laboratórios do Instituto de Geociências da UFPA pelas possibilidades analíticas; Ao PPGG/IG/UFPA pelo apoio ao doutorado de PHCS e à Hydro pela cessão das amostras.

 

REFERÊNCIAS

Barreto I. A. R., Costa M. L. 2018. Viability of Belterra clay, a widespread bauxite coverin the Amazon, as a low-cost raw material for the production of red ceramics. Applied Clay Sciences, 162: 252-260. https://doi.org/10.1590/2317-4889201820180128

Barreto I. A. R., Costa M. L. 2021. Use of the clayey cover of bauxite deposits of the Amazon region for geopolymer synthesis and its application in the red ceramics. Construction and Buildings Materials, 300. https://doi.org/10.1016/j.conbuildmat.2021.124318

Costa M. L. 1991. Aspectos geológicos dos lateritos da Amazônia. Revista Brasileira de Geociências, 21(2): 146-160. http://dx.doi.org/10.25249/0375-7536.1991146160

Costa, M. L., Cruz, G. S., Almeida, H. F., Pöllmann H. 2014. On the geology, mineralogy and geochimestry of the bauxite-bearing regolith in the lower Amazon basin: Evidence of genetic relationships. Journal of Geochemical Exploration, 146, 58-74. https://doi.org/10.1016/j.gexplo.2014.07.021

Evensen N.M.; Hamilton P.J.; O’Nions R.K. 1978. Rare-earth abundances in chondritic meteorites. Geochimica et Cosmochimica Acta, 42(8): 1199-1212. https://doi.org/10.1016/0016-7037(78)90114-X.

Gromet L. P., Dymek R. F., Haskin L. A., Korotev R. L. 1984 – The “North American shale composite”: Its compilation, major and trace element characteristics. Geochimica et Cosmochimica Acta, 48: 2469-2482.

Horbe, A. M. C. 1995. Evolução Mineralógica e geoquímica Multi-elementar de Perfis de Solos sobre Lateritos e Gossans na Amazônia. PhD Thesis, Instituto de Geociências, Universidade Federal do Pará, Belém, 55 p.

Horbe A. M. C., Costa M. L. 1997. Solos gerados a partir do intemperimos de crostas lateríticas sílico-ferruginosas. Acta Amazônica, 27: 241-256.

Horbe A. M. C., Costa M. L. 1999. Genetic relationship between lateritic duricrusts and soils in Amazon region – Brazil. In: McClenaghan M. B. (Ed.). International Geochemical Exploration Symposium. Vancouver, Abstracts Volume, p. 123-124.

Horbe A. M. C., Costa M. L. 2005. Lateritic crusts and related soils in eastern Brazilian Amazonia. Geoderma, 126: 225-239. http://dx.doi.org/10.1016/j.geoderma.2004.09.011

Kotschoubey, B., Calaf, M. J. C, Lobato, A. C. C., Leite, A. S., Azevedo, C. H. D. 2005. Caracterização e gênese dos depósitos de bauxita da Província Bauxífera de Paragominas, Noroeste da Bacia de Grajaú, Nordeste do Pará/Oeste do Maranhão. In: O. J. Marini, E. T. Queiroz & B. W. Ramos (Eds.) – Caraterização de depósitos minerais em distritos mineiros da Amazônia. CT-MINERAL/FINEP, ADIMB, Brasília-DF. P: 691-782.

Lima, J. J. D. O. Micromorfologia, mineralogia e geoquímica da bauxita nodular de Trombetas – PA. Dissertação (Mestrado) Instituto de Geociências, Universidade Federal do Pará, Belém, 64p.

Maclean W., Bonavia F., Sanna G. 1997. Argillite debris converted to bauxite during karstweathering : evidence immobile element geochemestry at the Olmedo Deposit Sardinia. Mineralium deposita, 32: 607-616.

Munsell Color Chart Company. 2000. Munsell soil color chart, Munsell color. Macbeth Division of Kollmorgen Corporation, Baltimore, USA.

Negrão L. B. A., Costa M. L. 2021. Production of low-CO2 cements using abundant bauxite overburden “Belterra Clay”. Sustainable Materials and Technologies, 29. https://doi.org/10.1016/j.susmat 2021.e00299

Negrão L. B. A.; Costa M. L.; Pöllmann H., Horn A. 2018. An application of the Rietveld refinement method to the mineralogy of a bauxite bearing regolith in Lower Amazon. Mineralogical Magazine, 82(2):1-18. http://dx.doi.org/10.1180/minmag.2017.081.056

Pantoja H. M. 2015. Mineralogia, geoquímica e minerais pesados do perfil laterito- bauxítico com cobertura e sua relação e sua relação com o Grupo Itapecuru: Lavra piloto Ciriático (Rondon do Pará). Dissertação (Mestrado), Instituto de Geociências, Universidade Federal do Pará, Belém, 70p.:

Pupin N. I. P., 1980. Zircon and granite petrology. Contribution to Mineralogy and Petrology. Berlin/Heldelberg. 73: 207-220

Rudnick, R. L.; Gao, S. 2003. The composition of the Continental Crust. In: Holland,

H. D.; Turekian, K. K. (Eds.). Treatise of Geochemestry, The Crust, 3: 1-64 http:// dx.doi.org/10.1016/b0-08-043751-6/03016-4

Sombroek, W. G. 1966. Amazon Soils. A reconnaissance of the soils of the Brazilian Amazon region. Wagenigen, Holland, Centre for Agricultural. Publications, Documents, 292p.

Teufer, G., Temple, A. K. 1966. Pseudorutile – a new mineral intermediate between ilmenite and rutile in the n alteration of ilmenite. Nature, 211: 179-181.

Vasquez M. L., Rosa-Costa, L. T. (Org.) 2008. Geologia e recursos minerais do estado do Pará. CPRM. Escala 1:1.000.000. Programa Geologia do Brasil. PGB.

 

 

 10.31419/ISSN.2594-942X.v92022i2a2RSL