01 – UMA RÁPIDA VISITA AO OBSERVATÓRIO MAGNÉTICO DE TATUOCA

Ano 06 (2019) – Número 02 Notícias

Marcondes Lima da Costa

Professor do Instituto de Geociências da UFPA, pesquisador 1A do CNPq e membro titular da ABC; curador do Museu de Geociências do IG/UFPA.

INTRODUÇÃO

A convite do professor Dr. Cristiano Martins, vice-diretor do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará e ao mesmo tempo Chefe e pesquisador do Observatório Magnético de Tatuoca (OMT), visitamos a referida estação no período de 10 a 11 de maio de 2019. A nossa equipe de visitantes foi constituída do professor Cristiano Martins da FAGEOF do Instituto de Geociências (IG)/UFPA, deste que vos escreve, Marcondes Lima da Costa da FAGEO/IG/UFPA, da profa. Rosemery Nascimento, também da FAGEO/ IG/UFPA, de Ubirajara Kimmemgs e Edna Cabral Trindade. Era uma oportunidade inigualável de se conhecer uma estação científica tão referenciada e localizada no quintal do Instituto de Geociências. Não podíamos desperdiçar o convite.

O professor Cristiano cuidou de toda infraestrutura de transporte, alojamento e alimentação. Foi impecável e muito cordial. Partimos da orla de Icoaracy, próximo ao porto de passageiros, nas primeiras horas da manhã 10.05.2019, um sábado, ainda sob maré baixa. O deslocamento até a Tatuoca foi feito em lancha de alumínio com possante motor de popa, conhecida como voadeira, grande e confortável. Foram cerca de 35 minutos de viagem até o desembarque na bela ilha.

Figura 1 – As quatro primeiras imagens acima mostram  a partida de Icoaracy e a travessia, enquanto as duas abaixo a chegada em Tatuoca.

 

HISTÓRICO E OBSERVAÇÕES REALIZADAS

O Observatório Magnético de Tatuoca (OMT) começou seu funcionamento em 19 de agosto de 1957, com o objetivo de implementar um programa de observação das variações magnéticas. Situado numa ilha próxima a Belém, no Pará, tem localização estratégica por estar na região do equador magnético (https://www.on.br/index.php/pt-br/observatorios.html, acesso em 20.08.2019).

A ilha é de pequena dimensão, situada na baía de Guajará/Marajó, como parte do município de Belém (Figura 2), mas tem importância estratégica, por ser considerada um dos pontos de captação magnética na terra. As informações coletadas são empregadas em telecomunicações, pesquisa científica, prospecção de minerais e navegação aérea, terrestre e marítima. No Brasil, existem apenas as estações magnéticas fixas em Vassouras, no Rio de Janeiro, administrada pelo Observatório Nacional; e na ilha de Tatuoca, em Belém, administrada pelo CNPq, por meio do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) (https://www.portal.ufpa.br/index.php/ultimas-noticias2/414-60-anos-do-observatorio-magnetico-da-ilha-de-tatuoca, acesso 20.08.2019), e agora de fato pelo Instituto de Geociências da UFPA.

Figura 2 – Localização do Observatório Magnético de Tatuoca, na ilha de mesmo home. Fonte: Google Earth, acesso 21.08.2019.

 

O observatório contém instrumentos que medem constantemente o campo magnético da Terra, o qual funciona como um escudo protetor para radiações solares e tempestades magnéticas (Figura 3). Por isso o local tem a importante função de criar modelos globais da variação do campo magnético terrestre e gerar dados essenciais para sistemas de navegação, de satélites, aviões e navios (https://www.portal.ufpa.br/index.php/ultimas-noticias2/414-60-anos-do-observatorio-magnetico-da-ilha-de-tatuoca, acesso 20.08.2019).

Figura 3 – Alguns instrumentos analíticos e a casa lacrada

 

Além disso, a ilha de Tatuoca também influencia na importância do lugar, já que faz parte da história política do Pará. A ilha, ao norte da capital, foi o local do Quartel General do marechal Manuel Jorge, após a tomada de Belém pelos líderes cabanos, em 23 de agosto de 1835. De lá, o marechal evacuou Belém e bloqueou o porto da cidade. A figura 4 retrata em cartão postal.

Figura 4 – Assim era visto o porto de Tatuoca em cartão postal do início do século passado. http://www.belem.pa.gov.br/ver-belem/detalhe.php?p=192&i=1, acesso em 20.08.2019.

 

Na administração do Prof. Cristiano a estação recebeu novos melhoramentos na infraestrutura, dispondo de energia fotovoltaica instalada por interveniência de pesquisadores e técnicos da Alemanha (Figura 5). Agora a energia é de qualidade e excedente. Os prédios estão recebendo reparos e modernização. O porto está em reforma e os equipamentos e objetos históricos sendo levantados e organizados. Foram encontrados vários equipamentos de grande importância histórica, adquiridos e trazidos ao tempo da sua instalação, de origem alemã principalmente (Figura 6).

Figura 5 – Central de controle e distribuição da energia fotovoltaica, além de dois geradores de energia a combustível fóssil, um adquirido ainda da extinta Mesbla S/A.

Figura 6 – Instrumentos históricos de medições, um belo acervo para história do Observatório Magnético de Tatuoca (OMT).

 

Durante nossa estadia o professor Cristiano nos informou sobre as principais atividades exercidas no OMT, ressaltando a importante contribuição do Observatório Nacional e do Museu Goeldi e principalmente da participação ativa de pesquisadores da Alemanha. Durante a oportunidades suscitou calorosas discussões sobre a importância dos estudos magnéticos para a região e para o Mundo. Lembramos até que nos primórdios do IG (então NCGG) uma das principais linhas de pesquisa era magnetismo e paleomagnetismo da Terra. Dissertação e tese foram desenvolvidas então sobre esta temática.

Aproveitamos para conhecer um pouco da geologia do local, que se mostrou muito semelhante àquela das ilhas de Outeiro e Mosqueiro, que se encontram logo a leste da de Tatuoca. A ilha de altitude muito baixa de 0 a não mais que 3-4m, sob forte influência das marés e, portanto, da maresia e correntes flúvio-marinhas, foi esculpida sobre terrenos laterítcos imaturos formados a partir de rochas sedimentares equivalentes às da Formação Barreiras. Na maré baixa é possível observar localmente na porção leste da ilha, ainda o horizonte mosqueado em sua pujança colorida, de aspecto silto-argiloso, que contém a famosa e típica “pedra de ferro” (ironstone). Trata-se na verdade uma ferruginização de siltitos e conglomerados no contato com argilitos, em que goethita criptocristalina cimenta os grãos de quartzo, da fração silte a seixo. Neste material na ilha, da mesma forma que nas ilhas vizinhas, encontra-se boa quantidade de ofiormos, principalmente de forma radiculares, além de outras expressões como plaquetas e formas ovalares (Figura 7). A crosta ferruginosa está praticamente toda desmantelada, com blocos espalhados por toda a costa da ilha, denotando a grande intensidade da força erosional. Sinalizações de navegação construídas sobre a mesma foram simplesmente deslocadas e/ou destroçadas (Figura 8).

Figura 7 – Exposição das pedras de ferro (lajedos) com ofiomorfos em Tatuoca.

Figura 8 – Instalações prediais que foram prejudicadas pela erosão, porém recuperadas, e sinalizações de navegação destroçadas; a imagem ao centro mostra uma sinalização instalada sobre o mosqueado e as imagens inferiores, o farol de navegação. A pequena imagem ovoide ilustra fragmento do belo espelho colorido bandado (vidro) do farol encontrado entre os fragmentos das crostas ferruginosas.

 

Sobre a crosta ferruginosa sobrevive ainda o delgado horizonte de latossolo amarelo com nódulos e fragmentos da mesma. Também, infelizmente, com lixo de natureza diversa, em parte trazido pelas marés lançantes que adentram a mata aberta e jovem da ilha.

As praias são belas (exceto pela presença de muito lixo representado por fragmentos de objetos de plásticos, de vidro, de metal e isopor, resíduos de construção, etc.), de baixo ângulo, com floresta jovem ao fundo, ou mesmo encostadas a muralhas de contenção da erosão (Figura 9), tentativas frustradas, a própria ilha é um produto da erosão. Minerais opacos, pretos e magnéticos, se concentram na praia junto ao porto (Figura 9).

Figura 9 – Aspectos das praias na orla de Tatuoca. Acima praia negra, em que além dos grãos de quartzo e goethita, mineral preto e de brilho metálico, magnético, se acumula junto ao porto. São motivos de nossa investigação. No centro uma praia deserta junto a caixa d´agua dominada por grãos de quartzo variados e goethita, muito bela, ao fundo a mata sobre o horizonte mosqueado latossolizado. Abaixo uma muralha de contenção e a mata.

 

CONCLUSÕES

A ilha de Tatuoca e o seu Observatório Magnético são de fato uma atração à parte, valem a pena conhece-los. A ilha per si só, é quase paradisíaca, e está muito próxima do grande centro urbano Belém do Pará. Ela deve ter de fato uma atração especial, e a instalação do OMT não foi um mero acaso, certamente. A nova administração e os pesquisadores envolvidos estão de parabéns. Do ponto de vista histórico, cultural e geológico é um espaço que deve ser conhecido e divulgado. Ficamos muito impressionados com a geologia, com a sua singeleza e ao mesmo tempo como a vulnerabilidade geológica e ambiental da ilha. Ela está a pedir estudos geológicos, arqueológicos e históricos, além de um levantamento da fauna e flora. Seria um espaço interessante para práticas estudantis em várias áreas do conhecimento.

 

Agradecimentos

O autor deste texto e os colegas que participaram desta bela visita agradecem de todo coração o convite que lhes fez o prof. Dr. Cristiano Martins do Instituto de Geociências, e aproveitam a oportunidade para parabeniza-lo e recomendar a persistência dos seus trabalhos no OMT. Ao mesmo tempo o autor pede desculpas pelos erros involuntários que tenha cometido ao longo deste texto e das imagens.