05 – Minerais de chumbo e cobre de Tres Ilhotas, no rio Xingu (Pará, Brasil)

Ano 04 (2017) - Número 03 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v42017i3a5MLC

 

 

Marcondes Lima da Costa e Herbert Pöllmann

 

Histórico

Em julho de 1922 o geólogo Avelino Inácio de Oliveira alcançara as três pequenas Ilhotas do rio Xingu, abaixo da hoje cidade de São Félix do Xingu. Naquela época São Félix era um vilarejo com 332 almas fundada em 1912, como ele bem escrevera, localizada na desembocadura do rio Fresco com o rio Xingu. Ele viera de Belém em barco a vapor até a cidade de Altamira, e daí subiu o rio Xingu com um pequeno barco durante 507 km até alcançar a vila. Ele assim se expressou sobre o local: “lindo logar decadente”. Imediatamente fez o reconhecimento geológico da região e a 4 km rio abaixo de São Felix ele se deparou com as três Ilhotas e na Ilhota do meio identificou os veios de quartzo leitoso, sinuosos e verticais, que sumiam rio adentro por mais de quilômetro. Ele encontrou os veios mineralizados em galena argentífera, associada com malaquita, azurita, cerussita e pirita cuprífera que haviam sido visitados anos antes por Nicolau Tolentino de Menezes de cidade de Porto Nacional, no Tocantins (Oliveira, 1922). Essa ilha do meio mede cerca de 250 de comprimento por 25 m de largura máxima segundo Oliveira (1922). Essas medidas dependem da altura das águas do rio Xingu, que variam muito conforme o regime pluviométrico, sendo visíveis e habitáveis apenas durante a estiagem. As cheias do rio em geral dificultam os trabalhos geológicos, pois tendem a recobrir as ilhas com seus depósitos arenosos (barras em pontal).

Durante essa sua estadia Oliveira (1922) reconheceu que os terrenos no entorno envolviam diabásios, granitos, quartzo dioritos, andesitos, além de folhelhos, folhelhos betuminosos e arenitos. Esses sedimentos foram mais tarde denominados de Formação Rio Fresco. A região foi mais tarde visitada por outros geólogos Guimarães (1928) e Barbosa (1958 in Barbosa et al, 1966) que ampliam o conhecimento litológico, identificando ainda adamelitos, sienitos, migmatitos, e outras rochas sedimentares. Mas foi Silva (1969) que ao visitar as Ilhotas, deu mais detalhes sobre as mineralizações de Cu e Pb como calcopirita, galena, malaquita e azurita associados a filão de quartzo encaixado em andesito cinza-escuro, por 700 m de extensão e 15 a 20 m de largura. CPRM (1969) através de projeto Cobre estudou as ocorrências dessas ilhas e concluiu que o teor médio de Pb era de 6,5 %, classificando a ocorrência como filão-falha quartzo (70º.NW, mergulho subvertical). Além dos minerais identificados anteriormente, apresenta também a esfalerita, bornita, covelita, “limonita” e anglesita.

A região é formada por serras e morros logo rio acima da cidade, porém abaixo desta, onde estão as três Ilhotas, em domínio do rio Fresco, é dominada por paisagem plana, baixa e visitada pelas águas do rio Xingu. O clima é tropical chuvoso, com precipitação máxima de 3.100 mm/ano e temperatura variando de 18 a 31º C e cobertura de floresta tropical densa, hoje localmente ocupada por pastos e capoeiras. Exemplo de árvores de grande porte são as castanheiras (Bertholetia excelsia), que formam grandes aglomerados densos

A região de domínio do município de São Félix do Xingu, onde se encontra as ocorrências de minerais de chumbo e cobre das Tres Ilhotas compreende unidades geológicas principalmente arqueanas e proterozóicas (Lagler, 2011). As unidades arqueanas são constituídas principalmente por granitos, granodioritos e granito-gnaisses que ocupam a porção a leste da região, que corresponde em parte a parte da margem direita do rio Xingu, que na literatura antiga era simplesmente conhecida como Complexo Xingu. Por outro as unidades proterozóicas estão principalmente na região oeste, a partir da margem esquerda do referido rio. São formadas dominantemente por rochas vulcânicas das Formações Iriri e Sombreiro (Tufos, Ignimbritos, traquibasaltos, andesitos, dacitos) e também por rochas intrusivas. Os terrenos das Tres Ilhotas estão estabelecidos sobre o domínio das rochas vulcânicas da Formação Sombreiro, em que dominam traquibasaltos, andesito-basalto, traquiandesito, dacito e traquito. As ocorrências representadas por veios de quartzo com sulfetos de Pb-Cu com direção WNW/ESE, parecem estar relacionados grandes lineamentos Nordeste-sudoeste. Portanto tudo indica que as mineralizações primárias sejam remobilizações tectônicas desses metais contidos nas vulcânicas máficas a intermediárias, e concentradas ao longo de zonas de falhas e fraturas.

 

Figura 1 – Localização e vista geral das Ilhas Tres Ilhotas no rio Xingu, logo abaixo da cidade de São Félix do Xingu. Imagens Google, DigitalGlobe, GeoEye, Earthstar Geographics, CNES/Airbus DS, USDA, USGS, AeroGRID, IGN, and the GIS User Community, trabalhadas por Alessandro Sabá Leite. Fonte: Pöllmann & Costa (2017) (Der Aufschluss, in press).

 

Figura 2A – Imagens de uma das pequenas ilhas do conjunto Tres Ilhotas em 1992. A chegada a ilha em canoa motorizada. Procurava-se ouro, então. Pöllmann & Costa (2017) (Der Aufschluss, in press).

 

Figura 2 – Imagens de uma das pequenas ilhas do conjunto Tres Ilhotas em 1992. O garimpo abandonado. Procurava-se ouro, então. Pöllmann & Costa (2017) (Der Aufschluss, in press).

 

Figura 3 – Piromorfita e cerussita associada com quartzo e minerais verdes de cobre no canto esquerdo acima. Fonte: Pöllmann & Costa (2017) (Der Aufschluss, in press).

 

Figura 4 – Linarita em cavidade dentro de quartzo. Fonte: Pöllmann & Costa (2017) (Der Aufschluss, in press).

 

Os Minerais

Os minerais identificados nas Ilhas Tres Ilhotas estão descritos em detalhe em Pöllmann & Costa (2017), com rica ilustração incluindo imagens coloridas de campo, das amostras in natura, e vistas sob o microscópio ótico e eletrônico. A tabela 1 sumariza os minerais até então identificados, representados por minerais de chumbo e cobre, além de óxidos e hidróxidos de Fe e Mn, sempre relacionados ao quartzo, que constitui os grandes veios que sustentam as ilhas, assim consideradas apenas durante a estiagem do rio, já que durante as cheias as mesmas são cobertas por suas águas.

Tabela 1 – Minerais identificados nas ilhas Tres Ilhotas no rio Xingu, abaixo da cidade de São Félix do Xingu. Fonte: Pöllmann & Costa (2017) (Der Aufschluss, in press).

 

Calcopirita Galena Esfalerita Pirita
Quartzo Linarita Plumbogummita Crisocola
Malaquita Azurita Cerussita Piromorfita
Anglesita Goethita Lepidocita Criptomelana
Bornita Covellina Caulinita

 

Conclusões

Embora já citados na literatura geológica do País, a ocorrência de minerais de Tres Ilhotas, pouca atenção despertou a comunidade de geociências e muito menos a comunidade leiga. É uma ocorrência curiosa, bonita, e que representa veios de quartzo leitoso mineralizados em galena e calcopirita, acompanhadas de pirita, e que foram parcialmente submetidas aos processos de oxiredução, por exposição subárea, dando origem a minerais clássicos de corpos gossânicos, obliterados pela erosão fluvial. Os minerais supergênicos encontrados são típicos desse ambiente gossânico, que encontra um certo paralelo na famosa Serra Verde, entre Curionópolis e Parauapebas, dentro da província de cobre de Carajás, com uma pequena mina situada logo ao sul da Serra Verde, a mina de cobre Antas Norte da Avanco.

Referências

Barbosa, O., Ramos, A.J.R., Gomes, F.A., Hemblod, R. 1966. Geologia estratigráfica, estruturale econômica da área do Projeto Araguia. MME-DNP-DGM, monografia 19: 50-51. CPRM, 1969. Projeto cobre Pará – Relatório final de pesquisa, 2ª. Etapa, texto. Belém-DVPES.

Guimarães, D., 1928, Rochas do Rio Xingu, estado do Pará. Boletim do SGM-RJ: 29: 29-41.

Lagler, B. 2011, Mineralogia e geoquímica das sequências vulcânicas paleoproteroicas do Grupo Uatumã na região de São Félix do Xingu (PA), Cráton Amazônico. USP, dissertação de mestrado, São Paulo, 154S.

Oliveira, A.I. de, 1922. Reconhecimento geológico no Rio Xingu, estado do Pará. Boletim do SGM-RJ, 29: 3-22.

Pöllmann, H., Costa, M.L., 2017, Sekundäre Blei und Kupferminerale aus dem Oxydationsbereich von Tres Ilhotas, Pará/Brasilien. Der Aufschluss (in press).

Silva, M. R., 1969, Projeto Cobre Xingu – Relatório preliminar dos trabalhos de campo, na bacia do médio Xingu. Belém, DNPM, 5º. Distrito.

 

 

 10.31419/ISSN.2594-942X.v42017i3a5MLC