05 – O CAULIM NO DEPÓSITO DE FOSFATOS DE ALUMÍNIO DE SAPUCAIA (BONITO-PARÁ)

Ano 06 (2019) – Número 02 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v62019i2a5PHCS

 

 

Pabllo Henrique Costa dos Santos1; Marcondes Lima da Costa1; Alessandro Sabá Leite2

1Universidade Federal do Pará; 2geólogo autônomo

 

ABSTRACT

In the Sapucaia phosphate mine, located in the municipality of Bonito, in the northeastern Pará, Brazil, there is a kaolin horizon which is placed below the ore. The knowledge of the mineralogical affinity between kaolin horizon and the overlying phosphates would help to understand the lateritic evolution that originated the phosphate deposit. The present research aims to provide textural and mineralogical information about the kaolinic horizon. The results are concentrated on two samples from the upper part of the kaolin horizon. The granulometric characteristics of the kaolin were determined by laser analysis; the mineralogical composition was obtained by X-ray diffraction and complemented by thermal analyzes; in addition, scanning electron microscopy images were also obtained. Besides kaolinite (dominant), the accessory minerals are: quartz, muscovite, illite and woodhouseite. The scanning electron microscopy images identified booklets of kaolinite and quartz grains. The presence of phosphate minerals in Sapucaia shows the relation of the kaolin horizon to the phosphatic horizon (ore), in fact, it is related to the lateritic evolution.

Key-words: weathering, kaolin, phosphate.

 

INTRODUÇÃO

O termo caulinita denomina o grupo de argilominerais composto por dickita, nacrita, halloysita e caulinita (Murray 2007). Já o caulim corresponde à rocha constituida por um ou mais desses minerais, tendo como acessórios comuns quartzo, mica, illita, esmectita, goethita, hematita, anatásio, ilmenita, zircão, turmalina e rutilo. A caulinita (mineral que dá nome ao grupo) é tipicamente formada a partir do intemperismo tropical, ao passo que dickita, nacrita e a halloysita são comumente hidrotermais.

A Amazônia Oriental abriga a maior província de caulim do Brasil, com três grandes minas em operação. Nesse cenário, diversas pesquisas têm buscado entender a origem e evolução desses depósitos, especialmente, os do nordeste do Pará. Costa et al. (1992) estudou a relação das grandes reservas de caulim da Amazônia com a lateritização. Moraes & Costa (1993) fizeram correlações físicas, mineralógicas e geoquímicas entre caulins derivados de gnaisses e de rochas sedimentares na Amazônia Ocidental. Moraes (1994) realizou estudos geoquímicos e físicos de caulins da BR-010 e margens do rio Capim. Duarte (1995) e Kotchoubey et al. (1999) estudaram o contexto geológico e gênese dos caulins do baixo rio Jarí. Truckenbrodt et al. (1996) investigaram a natureza e origem dos depósitos de caulim e argila semi-flint ao longo da rodovia Belém- Brasília. Sousa (2000) desenvolveu estudos sobre o caulim da mina da Imerys Rio Capim Caulim S/A do ponto de vista físico, químico e mineralógico. Carneiro et al. (2003) determinaram a mineralogia e geoquímica do caulim duro da região do Capim. Costa et al. (2009) mostraram a influência do processo de lateritização na formação dos depósitos de caulim do leste da Amazônia; e Santos et al. (2012), com o mesmo enfoque, estudaram o caulim da região do rio Capim.

A localidade de Sapucaia é conhecida por seus depósitos e mina de fosfato de alumínio, porém, durante os trabalhos exploratórios para fosfato, foram identificadas ocorrências de caulim sotoposto ao minério. A nova descoberta instigou a realização deste trabalho, que busca conhecer, ainda que de maneira preliminar, as características texturais e mineralógicas da ocorrência de caulim, visando verificar se o mesmo possui alguma relação como o horizonte mineralizado em fosfato de alumínio e com o modelo de Costa et al. (2009) sobre a formação de caulim na Amazônia. A ocorrência de caulim estudada, Sapucaia, que tem como coordenadas geográficas centrais 01°21’S e 47°25’W, fica situada no município de Bonito (NE do Pará), 140 km a leste de Belém (figura 1).

Os aspectos geológicos e a mineralogia e geoquímica dos depósitos de fosfatos da região de Sapucaia foram inicialmente estudados por Costa et al. (1987) e Costa et al. (1991), que demonstraram a origem laterítica dos fosfatos de alumínio com a presença de horizonte caulínico, caracterizando a sua composição mineralógica, química e em especial a distribuição dos terras raras em solução sólida crandalita-goyazita, além da caracterização do espectro de minerais pesados no perfil laterítico fosfático. Posteriormente, Souza (2001) estudou os fosfatos do morro Sapucaia e seus potenciais como corretivo de solo e, neste trabalho, identificou um horizonte caulínico sotoposto aos fosfatos. Mais recentemente, Leite (2014) e Costa et al. (2016) através de estudos detalhados da mineralogia e geoquímica dos fosfatos de Bonito, discutiram sua origem e evolução e os correlacionaram com os demais depósitos de fosfato da região Nordeste do Pará e noroeste do Maranhão. A caracterização textural e mineralógica do caulim Sapucaia vem complementar as informações já disponíveis sobre os depósitos lateríticos da região nordeste do Pará.

Figura 1: Localização do depósito de fosfatos de alumínio de Sapucaia, no município de Bonito, ao qual está associada a ocorrência de caulim; e outras ocorrências de fosfatos lateríticos na região nordeste do Pará e noroeste do Maranhão (Costa et al. 2016).

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Ainda durante as atividades exploratórias para fosfatos, foram coletadas duas amostras de caulim na localidade de Sapucaia. As mesmas foram submetidas a análises granulométricas, microtexturais e mineralógicas no Instituto de Geociências da UFPA. Para as determinações granulométricas, se empregou o analisador de partículas Fritsch Analysette 22, com dispersão em água, cujos resultados foram comparados com os obtidos por peneiramento/centrifugação.

As imagens de MEV foram obtidas pelo equipamento Hitachi TM 3000. Já as determinações mineralógicas foram realizadas por DRX tanto em amostra total como na fração argila, que para esse fim, após sedimentação em lâminas orientadas, foram glicoladas e aquecidas. O equipamento empregado foi o difratômetro PANalytical X’ PERT PRO MPD (PW 3040/60), com um goniômetro PW 3050/60 (theta-theta) e equipado com detector do tipo RTMS, X’Celerator, um ânodo de cobre (λCuKα = 1.5406 Ǻ), operando com 40 kV e 35mA. A caracterização mineralógica foi ainda complementada por análises termogravimétricas (TG) e termo diferenciais (DSC), com emprego do analisador Thermal Sciences modelo PL-ST.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O depósito de fosfato de Sapucaia se localiza em um morro, onde o horizonte fosfático se sobrepõe ao horizonte caulinítico (figura 2A). O caulim estudado se apresenta maciço, untuoso com restritas manchas vermelhas de oxi-hidróxido de ferro (figuras 2B e 2C).

 

Figura 2: Vista panorâmica do depósito de fosfatos de alumínio de Sapucaia (A); amostras do horizonte caulinítico situado abaixo do horizonte de fosfatos de alumínio (B e C).

 

O caulim é dominado por partículas com 2 a 20µm de diâmetro, com média de 8,5µm (figura 3). Esses dados se equivalem aos obtidos por peneiramento/ centrifugação, principalmente em relação ao percentual das partículas mais finas, argila e silte (tabela 1). A maior incompatibilidade foi verificada nos teores de areia, com diferença de 12,28 % entre o método a laser e o peneiramento com centrifugação. Essa diferença entre os resultados obtidos pelos dois métodos é atribuída às prováveis perdas de material durante a execução do peneiramento e centrifugação.

 

Figura 3. Histograma e curva cumulativa do caulim do depósito de Sapucaia.

 

Tabela1. Constituição granulométrica do caulim de Sapucaia obtida por laser e por peneiramento/centrifugação.

Intervalo granulométrico Laser (%) Peneiramento/centrifugação (%)
Areia 2,56 14,84
Silte 64,82 57,53
Argila 32,63 27,62

 

O caulim de Sapucaia é constituído principalmente por caulinita, com quartzo, muscovita, illita, woodhouseita e wavellita, em menor quantidade (figuras 4A e 4C). A caulinita apresenta grau de ordenamento estrutural, segundo o método de Hinckley (1963), de moderado (HI de 0,65) a alto (HI de 1,21) (figuras 4B e 4D). A presença de caulinita e illita foi confirmada através de difração de raios X em lâmina orientada, glicolada e aquecida (figura. 4E). Já a muscovita foi confirmada na fração arenosa com o auxílio de lupa binocular.

Figura 4. Composição mineralógica do caulim obtida por DRX (A e C) e a determinação do grau de ordem / desordem estrutural da caulinita (B e D). Caracterização mineralógicapor DRX da fração argila em lâmina orientada, glicolada e aquecida (E). Símbolos: Qtz (quartzo); Ms (muscovita); Kln (caulinita); Woo (woodhouseita); Wa (wavellita).

 

As análises térmicas (figura 5) apresentam o pico endotérmico próximo a 550°C que corresponde à desidroxilação de caulinita e consequente formação de metacaulinita, com pico exotérmico próximo de 1000°C, quando a metacaulinita se transforma em mullita e tridimita e/ou cristobalita ou equivalentes amorfos. A perda de massa de 15,0 % no intervalo entre 100 °C e 1000°C indica o domínio da caulinita e dos demais minerais hidratados/hidroxilados (illita, muscovita, crandallita-goyazita e wavellita).

Figura 5. Termogramas de análise termodiferencial (DSC) em vermelho; e análise termogravimétrica (TG) em verde, para o caulim de Sapucaia.

 

As imagens de Microscopia Eletrônica de Varredura demonstram que a feição textural dominante corresponde a uma massa constituída por cristalitos de caulinita que frequentemente se agregam, formado booklets (figura 6A). Dispersamente a matriz caulinítica envolve grãos de quartzo (figuras 6B e 6C).

Fig. 6. Imagens de Microscopia Eletrônica de Varredura do caulim (C e D), booklets de caulinita (A), grãos de quartzo (B e C).

 

A distribuição granulométrica do caulim Sapucaia com média de 8,5 µm se enquadra na faixa do silte, o que se deve à presença frequente de booklets de caulinita. Já na fração arenosa (menos representativa), dominam os grãos de quartzo. A constituição mineralógica dominante (caulinita), tendo como acessórios quartzo, muscovita e illita é típica dos caulins, porém os minerais woodhouseita e wavellita são menos comuns e indicam a relação do horizonte caulinítico com o fosfático sobrejacente. Esta constatação é vai ao encontro do que foi proposto por Costa et al. (2016), que consideram o caulim de Sapucaia como parte de um perfil laterítico fosfatado, em que o material precursor corresponde a rochas aluminossilicatadas, em parte mineralizada em fósforo.

 

CONCLUSÕES

A composição mineralógica do caulim de sapucaia, no qual se verifica a presença de woodhouseita e wavellita, demonstra que de fato o mesmo possui relação com o horizonte sobrejacente, mineralizado em fosfatos de alumínio. Portanto, ambos os horizontes (caulinítico e fosfático) devem estar relacionado à evolução laterítica a partir de rochas de composição aluminossilicatada rica em quartzo e fosfatos, como proposto pelos trabalhos anteriores. A granulometria siltico-argilosa, tanto por peneiramento quanto pelo método a laser reflete a aglomeração dos cristalitos de caulinita, por vezes formando booklets. Já a fração arenosa corresponde aos grãos reliquiares de quartzo. Foi verificada ainda a presença de muscovita e illita. A primeira observada com o auxílio de lupa binocular e a segunda confirmada por análises de DRX em lâminas orientada/glicolada/aquecida.

 

AGRADECIMENTOS

À SESu/MEC pela concessão de bolsa do Programa de Educação Tutorial ao primeiro autor (PET 2297/2009); ao CNPQ pela concessão de bolsa de produtividade em pesquisa e taxa de bancada ao segundo autor (Processos 304.519/2009-0; 305015/2016-8); e à então Fosfatar Mineração pela autorização de acesso à área de pesquisa.

 

REFERÊNCIAS

Carneiro, B.S., Angélica, R.S., Scheller, T., Castro, E.A.S., Neves, R.F. 2003. Caracterização mineralógica e geoquímica e estudo de transformações de fase do caulim duro da Região do Rio Capim, Pará. Cerâmica. 49: 237-244.

Costa, M.L.; Costa, W.A. 1987. Distribuição dos Terras Raras na solução sólida crandallita–goyazita de Sapucaia (Bonito-Pará). In: Congresso Brasileiro de Geoquímica. SBGq, Porto Alegre.

Costa, M.L., Costa, W.A. 1991. Espectro de minerais pesados no perfil laterítico fosfático de Sapucaia (Nordeste do Pará). In: Simpósio de Geologia da Amazônia, SBG Núcleo Norte, Belém.

Costa, M.L., Moraes, E.L. 1992. As grandes reservas de caulim e a lateritização na Amazônia. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 37 SBG, São Paulo.

Costa, M.L., Sousa, D.J.L., Angelica, R.S. 2009. The Contribution of lateritization process to the formation of the kaolin deposits from eastern Brazil. Journal of South America Earth Sciences. 27: 219 – 234.

Costa, M.L., Leite, A., Pöllmann, H. 2016. A laterite-hosted APS deposit in the Amazon region, Brazil: The physical-chemical regime and environment of formation. Journal of Geochemical Exploration. 170: 107–124.

Duarte, A.L. 1995. Caulim do Morro do Felipe, Baixo Rio Jari, Estado do Amapá, Contexto Geológico e Gênese. Dissertação de mestrado. Centro de Geociências, UFPA, Belém.

Hinckley, D.N. 1963. Variability in crystallinity values among the kaolin deposits of the coastal plain of Georgia and South Carolina. Eleventh National Conference on Clay and Clay Minerals, Michigan.

Kotschoubey, B. 1999. Cobertura Bauxítica e a Origem do caulim do Morro do Felipe, Baixo Rio Jari, Estado do Amapá. Revista Brasileira de Geociências. 29 (3): 331-338.

Moraes, E.L.; Costa, M.L. 1993. Correlações físicas, mineralógicas e geoquímicas entre caulins derivados de gnaisses e rochas sedimentares na Amazônia Ocidental. In: Congresso Brasileiro de Geoquímica 4, SBGq, Brasília.

Moraes, E.L. 1994. Estudos mineralógicos, geoquímicos e físicos em São Gabriel da Cachoeira-AM, Manaus-Itacoatiara-AM e BR-010/Rio Capim-PA (Amazônia). MS Dissertação de Mestrado, UFPA. Belém.

Murray, H.H. Applyed Clay Mineralogy. 1st ed. Elsevier. Amsterdam, Netherlands, 2007.

Santos, E. 2012. Characterization of kaolin from the Capim River Region – Brazil. Applied Clay Science. 55: 164-167.

 

 

 10.31419/ISSN.2594-942X.v62019i2a5PHCS