03 – VISITA ÀS MINAS DE FOSFATOS, CAULIM E BAUXITA NA REGIÃO NORDESTE DO ESTADO DO PARÁ, BRASIL

Ano 06 (2019) – Número 02 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v62019i2a3MESX

 

 

Visit to mines of phosphates, kaolin and bauxites in the Northeastern Region of the State of Pará, Brazil.

 

Milson Edmar da Silva Xavier

Geólogo e Eng. de Segurança do Trabalho, Autônomo, milsonest@gmail.com.

Marcondes Lima da Costa

Museu de Geociências, Instituto de Geociências, UFPA; Pesquisador do CNPq; marcondeslc@gmail.com

 

ABSTRACT

In order to comply with the requirements of a graduate discipline, a field trip was carried out in the northeastern region of the state of Pará, in order to get to know three ore deposits formed by lateritic processes: aluminum phosphates for the production of thermophosphates; kaolin for the paper industry and other applications; and bauxite for the production of alumina and metallic aluminum. On the same trip, it was taking the opportunity to visit an activity of extraction and commercialization of mineral substances of immediate use in the civil construction, specifically pebbles of the city of Ourém. It was an opportunity of immense practical value for the students involved, considering the multiple facets that involve the weathering action in the formation of the three deposits initially mentioned.

Keywords: Phosphates, kaolin, bauxites, mining front, Belterra Clay

 

INTRODUÇÃO

O GMGA-Grupo de Mineralogia e Geoquímica Aplicada, através de seu coordenador Prof. Dr. Marcondes Lima da Costa, idealizou e tornou realidade a Excursão Intemperismo, no período de 26 a 28 de novembro de 2018, a fim de cumprir requisitos de disciplina ministrada, a nível de pós graduação(mestrado), na UFPA.  Aliados aos alunos matriculados na disciplina, o coordenador permitiu a participação de alguns de seus alunos de doutorado e outros participantes do GMGA, na qual este relator se inclui. O objetivo da excursão foi conhecer as frente de lavra de empreendimentos situados na região nordeste do Pará, nos aspectos da geologia, mineralogia e química, particularmente, entendendendo os processos de decomposição das rochas pelo intemperismo tropical desde a formação de perfis lateríticos até a formação dos diferentes solos.Ao mesmo tempo,  procurou-se conhecer os processos de extração e beneficiamento mineral, bem como sua comercialização. Por normas legais e internas das empresas, a equipe foi submetida a apresentações de SST-Saúde e Segurança do Trabalho em cada empreendimento visitado.

 

VISITA À MINA DE BONITO: LAVRA DE FOSFATOS DE ALUMÍNIO E PRODUÇÃO DE TERMOFOSFATOS

A mina de  fosfatados de alumínio está situada no município de  Bonito-PA, sito na Travessa Sapucaia s/no, Zona Rural, CEP 68645-000,  de propriedade da  empresa Phosfaz Fertilizantes, do Banco BTG Pactual. Segundo o site institucional, a empresa nasceu como B&A Mineração em 2012, resultado da parceria entre o banco BTG Pactual e Roger Agnelli, ex-CEO( Chief Executive Officer) da Cia Vale do Rio Doce, hoje simplesmente Vale. Por motivos não divulgados, o Banco BTG Pactual desfez a parceria anterior e a Phosfaz segue sozinha com o empreendimento.

O acesso à mina é feito a partir de Belém do Pará, seguindo a Rodovia BR-316 até o cruzamento com a Rodovia PA-124 e depois pela Rodovia PA-322 até o destino(figura 1).

Figura 1 – Acesso à mina de fosfato da empresa Phosfaz Fertilizantes a partir de Belém do Pará. Fonte: Google Maps. Disponível em https://www.google.com.br/maps/place/PHOSFAZ+FERTILIZANTES/. Acesso em 02.12.2018.

 

O acesso é fácil e bem sinalizado, com visualização de plantações de cultura agrícola no percurso, principalmente dendê (Elaeis guineensis), mandioca (Manihot esculenta) e milho (Zea mays). Na safra do milho, observa-se com frequência a venda do produto por diversos produtores rurais ao longo da Rodovia BR-316, entre as sedes dos municípios de Capanema-PA e Castanhal-PA. A cultura de dendê só é vista ao longo das rodovias estaduais que circundam a área de exploração da mina, tanto no próprio município de Bonito como em outros municípios vizinhos.  Este fato é revelador  da importância do empreendimento para o nordeste do Pará. A empresa produz in loco termofosfatos de alumínio, que é vendido tanto para a região do entorno como para outras regiões do país. Isto é atestado pelos numerosos veículos  no pátio da mina, com destino às regiões Nordeste e Centro-Sul do país.

Ao longo do percurso da mina para o município de Ourém, foram observadas plantações de outras culturas como mandioca, laranja, pimenta do reino, maracujá, mamão e coco, o que revela a importância do fosfato na adubação do solo da região. Solo este pobre em macro e micronutrientes. São latossolos amarelos com 90% de quartzo em sua constituição, além de caulinita e goethita, em geral ácidos e com elevada concentração de alumínio. As culturas que precisam de nutrientes, como a laranja, buscam sua fonte no fosfato do empreendimento, enquanto as que não necessitam, como a mandioca, sobrevivem sem ele.

 

Apresentação na empresa

A equipe da excursão foi recebida pelo geólogo Daniel Chaves que fez uma apresentação sobre  as ocorrências de fosfatos de alumínio no nordeste do Pará e noroeste  do Maranhão, área onde se enquadra a mina de exploração da empresa Phosfaz Fertilizantes.

O conteúdo apresentado na exposição do geólogo Daniel foi baseado em furos de sondagem de  cinco alvos administrados pela empresa, quais sejam: Boa Vista, Serrote, Serrotinho, Caeté e Tracuá. Atualmente está em exploração a jazida do morro Sapucaia. O apresentador também citou o método de investigação geofísica gama-espectômetro como metodologia de pesquisa e investigação, além de farta bibliografia de autores/pesquisadores da região, dentre os quais o coordenador desta excursão. Em certos momentos da apresentação ocorreram situações de constrangimento face verbalizações do tipo “lateritas ferruginosas enchendo o saco” e “porrada de coisas…..”, mas, no geral, foi produtiva a visita e as divergências de interpretação ocorridas foram administradas cordialmente.

Quanto ao processo produtivo, o geólogo Daniel frisou que o minério de Bonito, a crandallita-goyazita,  naturalmente não apresenta a solubilidade desejada, necessitando que seja previamene  calcinado para quebrar a sua estrutura, tornando-a amorfa. Desta forma a empresa consegue elevar a solubilidade, sendo o produto obtido denominado de termofosfato calcinado em forma  granulado e em pó com 20% de  P2O5 e o farelado com 22% de P2O5 solúveis em CNA + H2O (tabela 1).  Como exemplo o apresentador cita a exploração da maior reserva de fosfato no mundo que fica em Marrocos, fruto da exploração de fosforitos (apatita e francolita), podendo ser empregado em sua forma natural, primária. É um fosfato natural com alta solubilidade.  Em Bonito, como não há ocorrência de apatita,  o minério a crandalita-goyazita de origem  laterítica, de baixa solubilidade,  é calcinado , cujas etapas do processo de beneficiamento são apresentadas na  figura 2. Um aspecto a observar é o fato de o processo de beneficiamento, na fase de calcinação, usar caroço de açaí obtido na região, verbalizado, em vídeo,  pelo CEO da organização, em seu site institucional.

 

Tabela 1 – Fatores de solubilidade dos produtos de nome químico termofosfato calcinado da Phosfaz Fertilizantes. Fonte: Site da empresa. Disponível em http://www.phosfaz.com.br/phosfaz-informacoes-tecnicas.html. Acesso em 02.12.2018.

Produto Nome Comercial Garantias
Granulado Phosfaz 23 23% de P2O5, sendo 20% em solubilidade em CNA +H2O
Farelado Phosfaz 25 25% de P2O5 , sendo 22% em solubilidade em CNA +H2O
Phosfaz 23 finos 23% P2O5, sendo 20% em solubilidade em CNA +H2O

 

Figura 2 – Processo de beneficiamento do fosfato da Phosfas Fertilizantes. Fonte: Site da empresa. Disponível em http://www.phosfaz.com.br/phosfaz-onde-encontrar.html . Acesso em 02.12.2018.

 

Geologia da mina

A geologia da mina apresentada pelo geólogo Daniel e os afloramentos visitados, com coleta de amostras, não diferem do que está publicado por  Costa et al(2016),  em que afirmam que a solução sólida de crandalita-goyazita é importante como minério laterítico, como um indicador de minério de fosfato primário, como apatita. Isto está de acordo com as questões de solubilidade enfrentada pela empresa em seu processo produtivo.

A geologia da mina de Bonito, é constituída de um horizonte inferior formado por fosfato de alumínio e minerais de argila, principalmente caulinita e sericita, denominado de fosfato argiloso, brilhoso, amarelo, provavelmente em decorrência de pequena concentração ainda de sericita. Esta é uma forma fina de mica  (muscovita). Da discussão em campo, orientada pelo coordenador da excursão, a fonte dessa mica seria os xistos e filitos do Grupo Gurupi, além de rochas graníticas que afloram às proximidades. A empresa descreve seu minério de fósforo como fosfato fragmentado e fosfato maciço que se sobrepõem ao horizonte de fosfato argiloso, presentes em Boa Vista e Sapucaia. O fosfato maciço localmente se apresenta com oxi-hidróxidos de ferro (Figura 3), que parece ter sido condicionado pela presença de paleocolúvio recobrindo este horizonte localmente, além do perfil de  solo superimposto.

 

Figura 3 – Fragmentos de areias ferruginizadas encontradas no minério de fosfatos coluvionar sobreposto aos fosfatos de Sapucaia.

 

Segundo Costa e Leite(2015), o  mais exótico nisto tudo é que os fosfatos lavrados em Sapucaia, Bonito, se constituem em uma anomalia no Mundo, pois são fosfatos de alumínio, representados principalmente por crandallita-goyazita e woodhouseita-svanbergita, tipicamente de origem laterítica, sendo a segunda no Mundo. Nas Ilhas Christmas se explora um pouco de fosfatos de Al, mas não são tipicamente lateríticos. Bonito é uma reserva pequena, da ordem de 4.000.000 t, mas de alto teor, por volta de 21 % P2O5. O minério se encontra no topo do suave morro Sapucaia (e também Boa Vista) e corresponde às crostas do perfil laterítico maturo de Costa (1991). Parte do minério também está representada por paleocolúvio. No mesmo trabalho, os autores ilustram, através de fotografia do primeiro autor, a presença do minério na crosta pele de onça, o que corresponde ao observado na mina em que os lateritos maturos apresentam, no topo, o fosfato pele-de-onça, provavelmente derivado do horizonte mosqueado. Nestas crostas foram  encontradas drusas de wavelitas, sempre segundo as discussões em campo a cargo do coordenador da excursão (figura 4), cujos resultados foram apresentados como manuscrito em cooperação com colegas da Universidade Halle, que infelizmente ainda não foi publicado.  Outro aspecto observado e discutido foi a ocorrência do mineral verde que segundo o professor Marcondes corresponderia a dufrenita e/ou mitridatita, um fosfato de Fe e Ca, já que se correlaciona com a ocorrência desses minerais em outros depósitos similares como Jandiá, Pedra Grande do Gurupi  e Trauíra já publicados. Esses fosfatos de ferro esverdeados a azulados já foram  descritos por  Costa (1980), Costa et al. (1980) e Schwab et al. (1983) e indicam que ao seu tempo de formação o depósito foi  substrato  de ambiente pantanoso (Costa, 1980 e  Costa et al.,2018).

 

Figura 4 – Crosta tipo pele de onça em que os nódulos vermelhos sao formados por hematita e o cimento por crandallita-goyazita, principalmente.

 

VISITA AO RIO GUAMÁ E SEIXEIRAS NOS ARREDORES – OURÉM

Após o almoço na mina da Phosfaz Fertilizantes, o destino final foi a cidade de Paragominas para pernoite. No caminho, estava planejada uma parada no leito do  rio Guamá na cidade de Ourém e duas visitas em seixeiras de propriedade do Sr. Zequinha Dantas, localizadas na estrada que leva a sede do município de São Miguel do Guamá. Ao longo do caminho, saindo de Bonito no sentido de Ourém, ainda são observadas algumas plantações de culturas de subsistência ou não, principalmente de mandioca, pimenta do reino e coco, sem deixar de citar o agronegócio da laranja instalado no município vizinho de Capitão Poço(figura 5), que não visitamos. Hoje,  favorecido com  a disponibilidade de fertilizante fosfatado na região, via inclusão de nutrientes em solo pobre para o agronegócio.

Figura 5 – Laranjal em Capitão Poço. Fonte: Aluisio Meira em http://br.geoview.info/laranjal_da_citropar_em capitao_poco,5198972p

 

Visita ao leito do rio Guamá em Ourém

Por volta de 15:00h. a equipe chega a cidade de Ourém e, às 15:10h, inicia os trabalhos no leito do rio.  Na margem direita  do rio Guamá encontram-se espodossolos e cascalhos. Nas culturas de mandioca e outras poucas exigentes de nutrientes, observa-se esse solo arenoso responsável por essa acidez. Freitas et al (2013), ao analisarem, em laboratório, amostras  de espodossolos de municípios dos estados da Paraíba e Pernambuco, constataram que o pH identificou acidez  variando de ácido a moderadamente ácido, conforme Classes de Reação do Solo elaboradas pela EMBRAPA-CNPS.  Esses dados confirmam as observações e discussões em campo sobre esse aspecto.

As observações no leito do rio Guamá ficaram restritas a descrição macroscópica do material, em que se observou  gnaisse, rico em muscovita, biotita, quartzo e feldspato. Na visita de logística que antecedeu a excursão, objeto deste relatório, foi possível verificar, com ajuda de analisador portátil por fluorescência de raio X(FRX), conforme figura 6,  que o conteúdo  de P2O5 nesse gnaisse, foi aproximadamente 0,1%, portanto na média crustal normal.  Villas e Sousa (2007) apresentam resultado de análise química de P2O5 (% peso), por espectroscopia de fluorescência de raios-X,  de 12 amostras do granito Ney Peixoto, na região do Gurupi, em média, de  0,19 %, ambos com duas micas(peraluminosos).

Figura 6. Analisador portátil por fluorescência de raio X, Marca Bruker S1 TURBO SD, no momento da análise.

 

Klein e Moura (2003) descrevem esses gnaisses como  granitoides peraluminosos de Ourém, ocorrendo no domínio Gurupi ou como janelas erosivas em meio à cobertura sedimentar fanerozoica. São granitos portadores de biotita e muscovita. Apresentam-se foliados e estão recobertos por rochas sedimentares fanerozoicas e sem relações de contato visível, o que foi evidenciado no trabalho de campo nesta excursão.

 

Visitas às seixeiras do Sr. Dantas:

Seixeira junto a cidade de Ourém:

Saindo do centro da cidade de Ourém, no sentido para São Miguel do Guamá, por uma estrada vicinal, pela margem direita do rio Guamá, observa-se, no lado direito  (a norte) dessa estrada, um grande e elevado depósito de resídulo de lavagem de seixos, antiga extração,  primeira seixeira. Ao seu lado funciona uma pequena indústria cerâmica com argila acumulada – sua matéria prima . O proprietário da seixeira é o Sr. Zequinha Dantas que autorizou o coordenador da excursão, e sua equipe, a observar os seixos rolados e amontoados no seu interior. Esses seixos apresentavam grande diversidade composicional, dominando os com quartzo e suas variedades,  hialinos, leitoso, cinza, uns com turmalinas negras cravadas  e outros com textura macroscópica sacaroidal, quartzíticas,  o que revela proveniência de distritos auríferos, possivelmente do Grupo Gurupi. O porfessor Marcondes informou que  o quartzo cinza é indicador de associação com ouro e arsenopirita. Bibiana et al (2002) descrevem as texturas de veios de quartzo de inúmeros prospectos auríferos desativados do CILS-Complexo Intrusivo Lavras do Sul /RS, em que observam texturas  dos tipos drusa, maciço, bandada, sacaroidal e de substituição, comprovando as discussões e orientações de campo.

 

Seixeira em atividade (segunda):

Seguindo a estrada no sentido de São Miguel do Guamá, no lado oposto ao da primeira sexeira (ao sul), tem-se a segunda,  também de propriedade do Sr. Zequinha Dantas.  A sequência exposta na frente de lavra é constituída da base para o topo de : material areno-cascalho com estratificação cruzada e ferruginizado (oxi-hidróxidos de Fe); cascalho de matriz argilosa amarela. A ferruginização pode, segundo o prof. Marcondes, representar uma intensa ferrólise e parece ter fragilizado  alguns seixos de quartzo . São perfeitamentes distinguidos pela textura e cor avermelhada, como consequência da ação química nestas condições de acidez elevada(figura 7). Em consequência do efeito desse processo nessa seixeira  o uso dos seixo de quartzo para as atividades de construção civil, fica inviabilidado,  uma vez que essa fragilidade diminui sua aplicação em estruturas de concreto armada.  Oliveira Júnior (2015) descreve esse processo de ferrólise pela observação de coalescência de cavidades, ou seja, pela aglutinação de cavidades. O autor descreve o processo em um primeiro momento com a dissolução dos argilominerais, formando cavidades e, conforme o processo avança, as cavidades tendem a coalescer e suas paredes apresentam formato mamelonar. As feições de revestimento com oxi-hidróxidos de Fe são atuais  e evidenciam a oxidação do Fe. Neste ambiente muito ácido os minerais de argilas são também decompostos, dando origem às cavidades e posteriormente a coalescências destas.

 

Figura 7 – Perfil do material exposto na frente de lavra, mostrando a camada de seixos com matriz areia, dentro deste um nivel arenoso grosseiro ferruginizado. À esquerda vista geral e à direita em detalhe.

 

Generalidades das seixeiras do Sr. Dantas.

A princípio, deve-se ressaltar que o proprietário desses empreendimentos se diz “sem estudos”, mas que se mostra uma pessoa prestativa e querida na região. Talvez pelo seu jeito extrovertido e brincalhão, usa de expressões que a linguagem culta renega, inclusive para dar nomes aos seus produtos comerciais. Por exemplo, segundo a Escala de Wentworth, nas frações de materiais de granulometria maior que 64mm e menor que 256mm temos os calhaus e nas menores que  4 µm , temos as argilas.  O proprietário, ao oferecer ou se referir às frações maiores de seu produto(seixo), não o faz usando o termo correto “calhau”, mas sim um termo muito próximo que a linguagem culta não deixa grafar, mas que se parece na escrita com calhau.

Apesar de se dizer inculto, sem conhecimentos ou semi alfabetizado, demonstra uma capacidade de analogia e correlação de fatos e materiais que nao deixam dúvidas quanto ao seu sucesso no âmbito comercial. Isto ficou demonstrado quando do diálogo com a equipe visitante em que fez relação do seu quartzo hialino com o silício de Breu Branco e região. Da mesma forma, quando comparou o material da segunda seixeira com o de depósitos auríferos de Cachoeira do Piriá, inferindo sobre a possibilidade de também encontrar o “maná dos mineiros” em sua seixeira.

Outro aspecto comportamental desse empresário é o fato de lidar com as obrigações fiscais, em todas as suas abrangências como meio ambiente, recursos minerais, triutários, trabalhistas, de forma bastante extrovertida, chegando ao ponto de duvidar se suas estórias eram verdadeiras ou não, face desconfiar se era um empreendimento legal ou clandestino, uma vez que não se visualizou nenhuma placa informativa de seu estabelecimento.  A surpresa, quanto as suas verdades, veio do manuseio de monografia de mestrado de Rocha(2013) em que a autora apresenta uma tabela de pessoas jurídicas em atividade de mineração, no município de Capitão Poço, onde consta a empresa  Mineração Z Dantas-Comércio, Transporte e Agropecuária LTDA-ME , com autorização de pesquisa junto ao então DNPM para a substância diamante, com a finalidade de  uso Industrial e  início das atividades em 2008. Portanto, a desconfiança caiu por terra, uma vez que as seixeiras no município de Ourém podem ser filiais desse empreendimento de Capitão Poço, com autorização para exploração de seixo e areia.

Na mesma obra, a autora faz uma abordagem interessante sobre  o ordenamento do território e a mineração em pequena escala  no estado do Pará, especificamente sobre a então mineração dos minerais da classe II – Minerais de Emprego Imediato na Construção Civil (areia, argila, saibro, seixo, etc.). Afirma a autora que a MPE-Mineração em Pequena Escala(produção anual menor que 50 mil toneladas de minério bruto) é, em geral, exercida de forma irregular e que

“muitas pessoas dependem de forma direta ou indireta dessa atividade. Desta maneira, a dinâmica territorial das pequenas empresas de mineração no nordeste paraense é entendida concomitantemente como produto e condicionante da materialidade relacional da sociedade vivida no espaço e com a apropriação deste, logo, das suas territorialidades, concordando com Saquet (2000) que o território é um lugar de relações a partir da apropriação e produção do espaço”.

Neste sentido, deixo a indagação:  Isto se aplica aos casos da Samarco e Hydro? Pois, segundo a autora,  o Ministério das Minas e Energia afirma que

existem altos índices de informalidade no setor mineral, causados por: i) Fiscalização ineficiente em decorrência de deficiências técnicas e de pessoal dos órgãos gestores; ii) Dificuldade na aplicação das normas, em relação aos conflitos de competência e à administração compartimentada; e iii) Burocratização e lentidão no processo de legalização, principalmente ambiental. Não existe, portanto, uma política pública continuada para a mineração e com metas de longo, médio e curto prazo e que possa vir a atender as necessidades dos diversos subsetores da mineração”.

 

VISITA À MINA DA PPSA / IMERYS/ RCC-RIO CAPIM: LAVRA DE CAULIM, PRÉ-BENEFICIAMENTO FÍSICO E TRANSPORTE POR MINERODUTO.

Ao sair de Paragominas, a equipe se dirigiu à mina de caulim da empresa Pará Pigmentos S/A do grupo Imerys Caulim, sito na  Rod. PA 256 – Km 68 S/N. Zona Rural, Ipixuna do Pará / Pará / CEP 68637-000(figura 8).

Figura 8 – A – Instalações de escritório e de beneficiamento de caulim na Mina PPSA – Unidade Ipixuna do Pará. Fonte: Site da empresa. Disponível em https://www.google. com.br/maps/ place/Imerys+Unidade+Ipixuma+do+ Par%C3%A1+-+Mina+PPSA/. B – Frente de lavra da mina de caulim da PPSA-Pará Pigmento S/A.

 

No percurso entre a cidade de Paragominas e a mina avistam-se diversos afloramentos tipo corte de estrada, de onde já se observam algumas características do material explorado no empreendimento.  Neste mesmo percurso nota-se também a presença da forte atividade do agronegócio, tanto de Paragominas como de Ulianópolis e D.Eliseu,  de onde escoa a produção de grãos para o mercado consumidor e para portos de embarque como o de Barcarena. Para o mesmo município vai a produção mineral, mas através de minerodutos entre a mina e a unidade de processamento da empresa, naquele município.

Ulianópolis ocupa o 15º lugar na produção de cana de açúcar, arroz, milho e soja e Paragominas é o 80º lugar com  soja, pescado, rebanho bovino, leite e mel, entre os 100 municípios mais importantes para a geração de riquezas saídas do campo brasileiro, segundo informações  do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) através do levantamento anual do Produto Interno Bruto (PIB) para cada um dos 5.570 municípios do país com referência ao ano de 2016 (Mutran, 2018) .

Ao chegar  na portaria da mina e cumprir os trâmites iniciais de identificação, a equipe foi recepcionada pelo gerente de Geologia da empresa o geólogo Dr. Eric Sennavoine  e direcionada a um pequeno auditório para a exposição das medidas de segurança e das informações sobre o produto e seu processo de extração. Este,  iniciado pela empresa em 1996.

A empresa explora duas minas no município de Ipixuna(Mina PPSA e RCC). A mina visitada foi a Mina PPSA. A Mina RCC(figura 9) tem produção maior que a Mina PPSA. Esta última processa 600 mil toneladas do material e 350 mil toneladas do produto final, o que corresponde a 1/3 da produção total do empreendimento. Assim, a Mina RCC é responsável por 1.200 mil toneladas do material e 700 mil toneladas do produto final.

 

Figura 9 – Localização das minas RCC e PPSA e da planta de beneficiamento, com indicação dos minerodutos da Imerys. Fonte: Site da empresa. Disponível em http://www.imerysnopara.com.br/pagina/?id=1&id.

 

O gerente, Dr. Eric Sennavoine,  inicia sua apresentação ressaltando o papel da Segurança do Trabalho, em que sua área de geologia, formada por um geólogo e um engenheiro de minas, comanda trabalhadores responsáveis pela tarefa de sondagem da própria empresa e se encontra sem acidentes desde 2005. Tece comentários sobre o produto caulim, informando que trata-se de uma argila branca, formada basicamente por caulinita, encontrada no mundo todo e com aplicação nos mais diversos segmentos industriais. Destaca a utilização do produto na indústria do papel para revistas de moda, utilizado em impressoras e para revelação de fotografia, sem mencionar outras aplicações como na indústria de comésticos, borracha, tintas e muitas outras. Na empresa, 90% da produção de  é destinada à indústria do papel e que vem caindo a um rítmo de 2% ao ano, face a sua redução em decorrência da documentação em meio digital, que no entanto é compensada pela a grande diversidade  de aplicações. Ou seja, outras formas de aplicação do caulim vem surgindo.

No aspecto geológico, o gerente da empresa demonstrou que o processo de formação do caulim ocorre de duas maneiras, sendo os depósitos primários formados por hidrotermalismo(alteração do granito) e os secundários por transporte de deposição primária. No Capim, seria o caulim formado por transporte e deposição de sedimentos, da formação Ipixuna,  constituídos por feldspato(ortoclásio e albita), quartzo e mica, onde o feldspato e mica seriam transformados em caulim, em  processo que duraria 20 milhões de anos, com redução do ferro e participação da floresta. O gerente demonstrou ainda uma preocupação muito forte com a presença de “contaminantes” na composição química desse caulim como anatásio, hematita, goethita e ilmenita, que geralmente estão presentes em forma de lentes dentro da camada. Um outro aspecto também preocupante é a participação da sílica(quartzo) no minério, que para a indústria do caulim é proibido tecnicamente. Na mina se destacam duas camadas do minério, sendo a camada superior de baixo conteúdo de areia na forma de quartzo, mais fino (90%<1 micrômetro)  e mais duro e, a inferior, com alto teor de areia(como quartzo). Esta última é a camada mais branca e macia, e o melhor minério. Segundo o gerente, a camada de caulim duro(flint ou semi-flint) apresenta influência da floresta por esta criar as condições de origem ao caulim mais duro, devido o material que fica acima.  No Jari já estão lavrando  o caulim duro, mas lá ele ainda é mais mole que o do Capim, segundo informou o gerente. Há alternativas para esse caulim duro. A Votorantim utiliza-o na fabricação do cimento. Outra aplicação do caulim duro é na mistura com o macio. Com relação à floresta e a camada de solo que a sustenta, o gerente, francês de nacionalidade, ficou impressionado pelo fato de uma camada de solo da região com espessura de, em média, 50 cm e sem raízes abaixo disso, fixar árvores de até 50 m de altura.

A figura 10 ilustra a correlação da alvura, granulometria e presença de “contaminantes” no  caulim da mina PPSA. Assim, a alvura e a granulometria aumentam à medida que se caminha para a base do perfil, enquanto a presença de contaminantes aumenta no sentido do topo do perfil.  A alvura a ser obtida é um fator muito importante para a lavra. Vários testes devem ser feitos para se conseguir a melhor alvura possível. Às vezes a cor inicial do material pode ser indicador errôneo do que pode ser alcançado, segundo afirmações do gerente da área.

Figura 10 – Detalhe da exposição dos principais tipos de caulim, do material de cobertura e indicação do comportamento da alvura, granulometria e “contaminantes”.

 

Outra aspecto abordado pelo gerente foi com relação ao processo produtivo em que o material lavrado tem de ser misturado com água e passado em peneira e hidrociclone (centrífuga) para a retirada da fração areia quartzosa, normalmente constituida por quartzo, com  90% de caulim e 10% de areia, inicialmente. O procedimento se repete até que obtenha um concentrado com pelos menos 99% de caulinita, suprimindo  a fração areia, e parte dos demais  “contaminantes”, como os minerais oxi-hidróxidos de ferro (óxidos) por magnetismo e outros por processo químico. Ao final o produto é transformado numa polpa para permitir o seu transporte por mineroduto, consistindo de 70% de caulim e  30% de água. A pressão de início de bombeamento da polpa é de 30 bar em Ipixuna (mina PPSA), que ao longo dos 180 km de mineroduto chega a apenas 1 bar (100 kPa) em Barcarena.

Notou-se ainda, durante a palestra do gerente de geologia da empresa, uma grande preocupação com a questão ambiental, face aos prazos e  exigências legais dos órgãos governamentais quando da concessão de licenças para pesquisa, lavra e autorização de funcionamento. A crítica é enorme quanto a burocracia e as incertezas na consecução dessas licenças, uma vez que, diferentemente da situação em outros países, aqui não se tem a garantia de sua obtenção, e em um prazo determinado, mesmo cumprindo todas as exigências estabelecidas.  O exemplo mais marcante é quanto ao desmatamento da área a ser lavrada. Segundo o representante da mineradora, o órgão governamental, ao conceder a licença para desmatamento(ou supressão da floresta), exige que se armazene a madeira derrubada sem permitir seu aproveitamento, tanto pela empresa como por qualquer interessado, e nem fiscaliza o cumprimento de tal exigência.

Analisando a legislação ambiental a cargo do Ibama –  Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis,  constatou-se que a exploração de florestas para uso alternativo do solo, devidamente autorizada, em atividade de mineração, pode ser feito com o  aproveitamento da matéria-prima  e será precedido de levantamento dos volumes existentes. Esta modalidade de exploração é isenta, inclusive, de apresentação do Plano de Manejo Florestal Sustentável – PMFS, que é o documento técnico com as diretrizes e procedimentos para a administração da floresta, conforme decreto nº 5.975, de 30.11.2006 (Brasil.PR, 2006).

Outra referência a essa possibilidade de aproveitamento está em Brasil (2001). Trata-se do manual de normas e procedimentos do Ibama para licenciamento ambiental no setor de extração mineral. Nele consta um item com tendências da  tecnologia ambiental na implantação de empreendimento de mineração, onde cita:

Outra evolução tecnológica que vem sendo absorvida pela mineração é o desmate controlado, com vistas ao direcionamento da fauna para áreas previamente planejadas para se tornarem áreas protegidas, e ao aproveitamento máximo da massa vegetal retirada, através da compostagem para posterior aplicação na revegetação das áreas degradadas durante a implantação”.

Wanderley (2009) constatou que nos projetos de bauxita  em Oriximiná e Juruti, parte da madeira derrubada foi utilizada como nutriente, após queimada, no reflorestamento de outras espécies(Eucalipto), como carvão vegetal na usina de secagem da mineradora e outras, sem valor econômico, enterradas para recompor o terreno no fechamento das minas, além da parte que era ressarcida ao Ibama. Portanto, há previsão legal para a exploração de florestas para uso alternativo do solo por empresas mineradoras.

 

Afloramentos ao longo da rodovia PA-256.

Costa e Moraes (1998) afirmam que os depósitos de caulim das áreas de lavra da Imerys estão localizados na área de dominínio dos Depósitos de Lateritos Maturos da Amazônia, especialmente na província de bauxita laterítica de Paragominas, portanto  são contemporâneos com bauxitas lateríticas encontradas na mesma região, desenvolvidas e seguidas de erosão com  exposição em ambiente pantanoso reduzido.

Nos afloramentos ao longo da rodovia PA-256, entre a mina visitada e o rio Capim, continuando no sentido de Paragominas, ou seja para leste, encontram-se exposições de perfis lateríticos com todos, ou quase todos, os horizontes característicos, alguns com relictos da crosta ferro-aluminosa do perfil, outros mostrando o processo de deferruginização com possível geração de gibbsita e Argila de Belterra, outros ainda mostrando no topo do perfil os latossolos amarelos (Argila de Belterra), com ou sem a zona de transição (esferólitos ou pisólitos) entre a bauxita e a Argila de Belterra. Nesses perfils, encontram-se ainda diversas formas de bauxita como pele de onça, a originada do horizonte mosqueado, nodular e em moldes e raízes (icnofósseis), figura 11. Neste percurso fica evidente a posição do horizonte do caulim, na base do perfil,  que só é exposto devido a erosão dos horizontes superiores do perfil laterítico. A diferença de nível de cotas altimétricas, ao longo do percurso, facilita a observação e constatação. Assim, a mina visitada teria tido todo esse material, que foi posteriormente erodido.  Em um último ponto visitado nesse percurso, antes de chegar a cidade de Paragominas, observa-se falha normal  que desloca uma faixa tabular delgada, formada por bauxita finamente cristalina e compacta dentro do horizonte mosqueado. A falha também desloca claramente a cobertura Argila de Belterra (figura 12) Portanto, essas observações encontram  amparo na obra citada (Costa & Moraes,1998), quando afirmam:

O horizonte do caulim (ou camada) é exposto pela erosão da parte superior, parte do perfil laterítico. Frequentemente, após esse período de erosão o caulim exposto foi coberto por sedimentos mais jovens ou mesmo modificado pelo desenvolvimento de solos amarelos (latossolos)”.

Figura 11 – Icnofósseis tipo molde de raízes encontrado em ambundância na Rod PA-256 e formados por gibbsita criptocristalina e hematita também criptocristalina.

 

Figura 12 – Detalhe da delgada faixa de bauxita cristalina deslocada por falha normal na Rod. PA-256 com Argila de Belterra sobreposta.

 

VISITA À MINA DE BAUXITA DA NORSK HYDRO PARAGOMINAS: LAVRA, BENEFICIAMENTO FÍSICO E TRANSPORTE POR MINERODUTO.

Localizada na Rua Estrada da Mineração s/nº, Platô Miltônia 3, CEP 68625-200, Paragominas, Pará(figura 13), a mina de bauxita da Hydro fornece a matéria prima (bauxita) para a maior refinadora de bauxita do Mundo, a Hydro Alunorte em Barcarena, através de um mineroduto de 244 quilômetros de extensão. Em Barcarena ela é refinada e transformada em alumina e esta em alumínio. Segundo o sitio da empresa, é o primeiro mineroduto de bauxita do Mundo (Hydro,2018).

Figura 13. Vista da planta industrial Mineração Norsk Hydro Paragominas. Fonte: site da empresa. Disponível em https://www.hydro.com/pt-BR/sobre-a-hydro/hydro-worldwide/south-america/brazil/paragominas/mineracao-paragominas/. Acesso em 07.05.2019.

 

A equipe foi recebida e encaminhada pelo gerente de Geologia Bruno Gomes para o auditório da empresa, onde foram apresentadas as informações sobre Saúde e Segurança do Trabalho (SST) e sobre o processo de extração. A apresentação sobre SST foi realizada pelo técnico em segurança do trabalho da empresa, ex-aluno do primeiro autor. Ressalta-se a importância das questões de SST dada pela empresa. Já na entrada observa-se a aplicação de um DDS-Diálogo Diário de Segurança aos colaboradores da empresa, prática que serve para discutir as ações dos envolvidos na realização de suas atividades, alertando para os riscos e perigos dela advindos.

 

VISITA À MINA  DE BAUXITA DA NORSK HYDRO PARAGOMINAS

O processo de extração de bauxita, iniciado em 2007, começou pelas minas 5 e 2, já exauridas. As de número 4 e 6, que são as melhores, ainda não estão em lavra. As jazidas atuais em operação referem-se ao Platô Miltônia 3. As jazidas do Platô Miltônia 5 estavam em fase de sondagem e prontas para serem lavradas, o que não ocorreu face aos últimos acontecimentos que levaram à redução do ritmo de produção, imposta pelos órgãos governamentais. A elevação desses platôs é da ordem de 120 a 150 m de altitude.

Após as apresentações no auditório e na sala da geologia, a equipe foi levada à área de exploração. No percurso, foi vista a área “pulmão”, que é a denominação dada ao depósito de matéria prima (bauxita) que serve para socorrer a empresa em casos de problemas na extração, que ocorrem principalmente durante o período chuvoso. É um tipo de reserva de matéria prima para atendimento aos clientes com contratos de fornecimento já firmados. Esse percurso é formado por estradas construídas para o escoamento da bauxita, desde o local da lavra até a área de seu beneficiamento. Essa infraestrutura é planejada com auxílio de drones para a execução de levantamentos topográficos e imageamento de alta precisão, aproximadamente de 5 cm. Este planejamento é realizado com o intuito de possibilitar a execução da lavra pelo método de lavra em tiras (strip mining) para a remoção da camada de estéril, que varia de 2 a 20 metros de espessura. Esse método requer a utilização de equipamentos de esteira e de pneus.

A camada de solo retirada é recomposta para a fase de reflorestamento a que a empresa está obrigada a realizar. Esse reflorestamento é feito imediatamente à retirada, pois não pode ser estocado por muito tempo, segundo verbalização do gerente de geologia que acompanhava a equipe.  Assim, a empresa cumpre uma das exigências para a recuperação ambiental da área, pois ela é realizada simultaneamente à extração do minério. A figura 14 de Silva et al (2018) ilustra muito bem todo esse processo. É lavra conhecida como strip mining.

Figura 14 – Operações de lavra na mina da Hydro em Paragominas seguindo a técnica strip mining. Fonte: Silva et al (2018).

 

O reflorestamento aplicado pela empresa é no sistema de nucleação que consiste na restauração da floresta através da criação de pequenos habitats (núcleos) dentro da área degradada  de forma a induzir uma heterogeneidade ambiental, propiciando ambientes distintos no espaço e no tempo (São Paulo, 2011).

Da mesma forma que na mina de caulim da Imerys, a madeira extraída e armazenada em área apropriada fica aguardando liberação dos órgãos ambientais. Isto demonstra uma necessidade de maior investigação quanto a essa determinação, uma vez que na lei, no sentido “stricto sensu”, não se tem nenhuma menção a respeito. Há possibilidade de publicação de ato que trate da matéria, mas através de uma norma inferior como Instrução Normativa ou similar. Porém, isso requer uma investigação diretamente nos órgãos governamentais ou na empresa, o que não é objeto direto desse trabalho.

Na área em exploração (extração ou lavra), frente de lavra da mina de bauxita (figura 15), observou-se o perfil exposto com um horizonte de bauxita “cristalizada” (na verdade bauxita com gibbsita macrocristalina) na base, o minério propriamente dito, micro a criptocristalina segundo Costa (2018), com presença de crosta ferro-aluminosa,  sobreposta pelo horizonte pisolítico(esferólitos ferruginosos com camadas concêntricas) e capeado pela Argila de Belterra(figuras 16). Esse pacote com os três horizontes está assentado possivelmente sobre o horizonte mosqueado(vermelho-ocre-lilás) que tenha dado origem à bauxita laminar porcelanada, que por sua vez, se sobrepõe aos horizontes de caulim vistos na mina da Imerys, tudo segundo discussões em campo dirigidas pelo  coordenador dos trabalhos e com base em diversos trabalhos publicados sobre o rico minério, dentre os quais Kotschoubey et al(1996), Costa e Moraes(1998), Kotschoubey et al(2005), Costa(2018) e outros.

Figura 15 – Frente de lavra da mina de bauxita da Mineração Norsk Hydro Paragominas na Província Bauxitífera Paragominas.

 

Figura 16 – Perfil com o horizonte da bauxita cristalizada na base(microcristalina), minério propriamente dito (A) e seu detalhe em amostra de mão(B). Frente de lavra da mina de bauxita da Mineração Norsk Hydro Paragominas na Província Bauxitífera Paragominas.

 

Kotschoubey et a l(1996), ao descreverem a Formação Ipixuna, relatam que esta consiste em arenitos caulinizados, fortemente desferrificados, e argilitos caolínicos intercalados. Esses arenitos caolinizados são compostos por quartzo e pseudomorfos de caulonita bem cristalizada a partir de feldspatos e traços de anatásio, mica e fosfato de alumínio da série goyazita-crandallita. Já as camadas de argilitos caulínicos destacam-se pelo baixíssimo conteúdo de quartzo. Localmente, no topo dessa unidade, encontram-se restos de crosta laterítica, composta essencialmente de caolinita pobremente cristalizada, goethita e hematita, com gibbsita subordinada e traços de anatásio. Sobre a laterita aluminosa degradada, repousa um latossolo amarelo, a Argila de Belterra.

 

Após a visita à cava, a equipe foi levada para o laboratório da empresa que, em breve visitação, conheceu os equipamentos disponíveis e em operação no momento. Em seguida, visitou-se a litoteca da empresa e sua sala de descrição de testemunhos. Neste setor constatou-se a aplicação do programa SOMAR da empresa, que consiste em incentivo aos colaboradores para criarem formas inovadoras de realização de tarefas e/ou de alteração/criação de ferramentas que elevem a produtividade e/ou segurança no trabalho. A responsável pelo setor informou que sua equipe já fora vencedora de duas premiações no SOMAR. Um novo projeto a ser submetido, pelo setor, ao programa SOMAR é sobre o reaproveitamento dos tubos de sondagem serrados.  Esses tubos devem ser serrados para a retirada dos testemunhos de rochas que carregam, deixando uma quantidade enorme de resíduos  de PVC(nome IUPAC policloroeteno).

Um fato marcante da visita, no setor, foi a constatação de que muitos dos trabalhadores ali lotados atualmente foram reaproveitados de outras áreas, principalmente do setor de produção, face a redução de atividade imposta pelos entes governamentais em consequência da possível co-responsabilidade em acidente de transbordamento de resíduos acontecido em fevereiro de 2018, em Barcarena.

 

CONCLUSÕES

A região nordeste do estado do Pará passou por uma transformação em sua base econômica, nos últimos 20 anos, saindo de uma atividade extrativa madeireira para extrativa mineral e agronegócio, sendo os municípios de Ulianópolis e Paragominas destaques a nível nacional.

O avanço dos estudos em intemperismo tropical, principalmente de autores aqui citados, permitiu essa alteração do perfil econômico na região. Essa mudança de atividade econômica fora observada pelo primeiro autor já no início da década 2000, mais precisamente em 2001 quando do tratamento de dados de arrecadação de ICMS nos municípios de Dom Eliseu, Ulianópolis, Paragominas, Ipixuna do Pará, Mãe do Rio, e Capitão Poço. Assim, se pode constatar que a extração do minério de origem laterítica (crandalita-goyazita) de Bonito é o grande impulsionador da atividade agrícola da região do entorno do município. Esse minério é fruto de uma geologia formada por um horizonte laterítico de fosfato de alumínio e minerais de argila (caulinita e sericita), sob forte ação de intemperismo.

Da mesma forma, a extração de caulim na região, aplicado a diversos segmentos industriais, tem origem secundária formado por transporte de sedimentos da Formação Ipixuna e são constituídos de feldspatos (ortoclásio e albita), quartzo e mica, sendo o feldspato e a mica os responsáveis para a origem do caulim, em um processo de intemperismo que tem como principais agentes a redução do ferro e a participação da floresta. Esse horizonte de caulim é a base do perfil laterítico da província de bauxita laterítica de Paragominas e a ele contemporâneo (Costa & Moraes, 1998).

Portanto, a região nordeste do Pará, ao se ver impossibilitada na continuidade de sua vocação extrativa florestal, tanto pelo rigor da regulamentação governamental (SEMAS e IBAMA) como pela exaustão dos seus recursos florestais (projetos de manejo), não vê outra alternativa senão a mudança de perfil econômico, buscando na mineração e no agronegócio associado, a sua “tábua de salvação”.

É notória a preocupação do corpo administrativo e técnico das empresas visitadas com as questões ambientais e de segurança do trabalho, inclusive com o comprometimento do número um da organização (CEO-Chief Executive Officer). Além dessa integração dos sistemas de meio ambiente e saúde/segurança do trabalho, constatou-se a preocupação com a responsabilidade social e qualidade, quando da disponibilidade de informes em locais próprios (quadro de avisos) como também em qualquer espaço de grande visibilidade, como o demonstrado na figura 17. Neste caso, a empresa Hydro ressalta seu papel ético quando informa para seus colaboradores a importância do termo “compliance”, muito em voga nas organizações nos dias atuais.

 

Figura 17 – Informes da empresa, em área de grande circulação, com utilização de viga de sustentação do telhado de área de circulação de pessoas.

 

Apesar do cumprimento das exigências ambientais legalmente exigidas, também é notória na empresa a preocupação nessa questão, inclusive com críticas sobre os prazos e dúvidas sobre a concessão/renovação de licenças legais.

Em campanha eleitoral de outubro próximo passado, o presidente eleito afirmou, segundo o informativo eletrônico Diário do Poder (2018),  que vai combater o que classifica como “indústria da multa ambiental” e que não permitirá que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) apliquem multas “a torto e a direito”.  Neste sentido, em maio de 2019, tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei sobre licenciamento ambiental em que cria uma lei geral que uniformiza os procedimentos de sua concessão, diminuindo a discricionariedade da autoridade fiscal e eliminando a  exigência de licenciamento para empreendimentos de infraestrutura, além de outras medidas no sentido de desburocratizar as licenças de instalação e operação.

Portanto, é de se esperar o cumprimento de promessas eleitorais para que a mineração viva dias mais honrosos e enobrecedores.

 

Agradecimentos

Ao PPGG e a direção do IG pelo apoio logístico fornecendo a van e diárias para o motorista e o professor da disciplina e ajuda de custo para os dois alunos matriculados e ao CNPq (taxa de bancada, processo 305015/2016-8) que custeou o combustível. À Phosfaz na pessoa de Daniel Chaves,  à PPSA-IMERYS na pessoa de Eric Sennavoine e colaboradores e à MPSA-Hydro nas pessoas de Evilmar José da Fonseca, Bruno, Eliosmara e Hélcio (embora não estivesse presente pessoalmente),  bem como à ousadia e ao trabalho de Zé Dantas nas seixeiras. O primeiro autor agradece ao segundo a oportunidade de publicação em conjunto deste, ao convite para integrar o GMGA-Grupo de Mineralogia e Geoquímica Aplicada como voluntário e submissão de seus escritos no Bomgeam-Boletim do Museu de Geociências da Amazônia.

 

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 10.31419/ISSN.2594-942X.v62019i2a3MESX