03 – SÍNTESE DE MATERIAL TIPO-PIROAURITA OBTIDA À TEMPERATURA AMBIENTE

Ano 05 (2018) - Número 02 Artigos

 10.31419/ISSN.2594-942X.v52018i2a3RSN

 

 

NASCIMENTO, Renata de Sousa*; FIGUEIRA, Bruno Apolo Miranda**;

*Universidade Federal do Oeste do Pará, UFOPA-Campus Santarém, Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Sociedade, Ambiente e Qualidade de Vida, PPGSAQ, rsnufopa@gmail.com

**Universidade Federal do Oeste do Pará, UFOPA-Campus Santarém, Profº. Dr. Programa de Ciência de Tecnologia do Instituto de Engenharia e Geociências-IEG, brunoufopa@gmail.com.

 

ABSTRACT

This work presents the synthesis and characterization of pyroaurite-type material at room temperature, employing bauxite washing residues from the Amazon Region. The final product was analyzed by means of X-ray diffractometry, Thermal analysis (TG-DTA) and Scanning Electron Microcopy with EDS. According the results, the layered phase could be synthesized at room temperature for 1 day with no impurities, having a thermal stability up to 250 ºC with platy crystals.

Keywords: Synthesis. Characterization. Bauxite residues. Pyroaurite. Amazon region.

 

INTRODUÇÃO

Os minerais hidrotalcita e piroaurita pertencem a família dos hidróxidos duplos lamelares (HDL), que também é conhecida como “argilas aniônicas”. O nome HDL é derivado dos primeiros trabalhos de Feitknecht (Feiknecht, 1940), que chamou esses compostos de “Doppelschichtstrukturen” (estruturas de folha dupla), pressupondo uma estrutura com camadas de hidróxidos intercalados (Hoyo 2007). Para Crepaldi & Valim (1998), de acordo com Cavani et al. (1991) ao mesmo tempo em que a hidrotalcita foi descoberta, na Suécia por volta de 1842, um outro hidroxicarbonato misto de magnésio e ferro foi encontrado, recebendo o nome de piroaurite (devido ao brilho semelhança do ouro quando aquecido). Em 1942, Feitknecht sintetizou este mineral e o descreveu como um hidróxido duplo lamelar contendo dois cátions de valência diferentes, um divalente e o outro trivalente (Taylor et al., 1991). Altmann (1968; 1970) descreveu a estrutura da pyroaurita, representada pela fórmula Mg2Fe(OH)16CO3.4H2O, simetria romboédrica com os dois cátions distribuídos aleatoriamente dentro da mesma folha de hidróxido octaédrico, com ânions e moléculas de água ocupando a região entre essas camadas.

A primeira síntese de um composto com estrutura tipo “piroaurita” foi realizada por Feitknecht (1935), que empregou o método de coprecitação a pH elevado. Posteriormente, Hansen & Taylor (1990) sintetizaram esta fase pelo método de hidrólise induzida. Zhang et al., (1995) empregaram o método de síntese hidrotermal, Roh et al., (2000) utilizaram processo de síntese eletroquímica e Rovo et al., (2010) a obteve pelo método de coprecitação. Segundo He et al ., (2005) que descreveram uma revisão completa sobre as variadas rotas de sínteses para a preparação de HDL, a rota mais comumente empregada é a de coprecipitação.
Este trabalho investigou a síntese de hidróxido duplo lamelar do tipo piroaurita à temperatura ambiente, pelo método de coprecitação, empregando como material de partida de baixo custo o resíduo lamoso resultante da lavagem de bauxita.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Rota sintética: Cerca de um 1g do resíduo da bauxita (RBX) foi pesado e transferido para um béquer, o qual passou por um tratamento ácido (ácido clorídrico e água destilada (1:1)) sob aquecimento controlado a 80ºC para a solubilização de Fe3+ contidos nos oxi-hidróxidos de ferro (goethita e hematita), sendo a solução obtita posteriormente filtrada e denominada de solução-mãe ou solução A. Em seguida, foi adicionado 1.24g de MgCl2* 6H2O em 40mL da solução A. Uma segunda solução foi preparada em 50mL de água destilada como 3 mol.L-1 de NaOH (solução B) sendo gotejada lentamente na solução A durante 3 horas, formando um precipitado marrom. A solução resultante foi mantida em temperatura ambiente por 1 dia. O precipitado foi lavado, filtrado e codificado como HDL-PIR.

Caracterização: Para investigação das fases cristalinas, inicialmente utilizou-se a difração de raios-X através de um difratômetro de bancada D2Phaser (Bruker) com tubo de cobre (CuKa = 1.5406 Å) de 400 W de potência. A composição química do RBX foi obtida por fluorescência de raios-X empregando espectrômetro WDS seqüencial, modelo Axios Minerals da marca PANalytical, com tubo de raios-X cerâmico, anodo de ródio. A estabilidade termal do produto final foi registrada com o auxílio do termoanalisador da NETZSCH, modelo STA 449 F5 Jupiter, com forno cilíndrico vertical e taxa de aquecimento de 10ºC/min, fluxo de N2 de 50 ml/s, e faixa de temperatura de 30 a 1000ºC. A morfologia e microanálise por EDS foi obtida em microscópio eletrônico de varredura marca LEO-Zeiss, 430 Vp, em condições de análise utilizando elétrons secundários a 20 KV, com distancia de trabalho de 11 mm.

 

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A análise química de RBX por FRX mostrou que a amostra possui mais de 55 % (em peso) de Fe2O3, o que é compatível para a síntese do HDL. Em relação a sua composição mineral, a mesma é constituída principalmente de caulinita (PDF 029-1488), hematita (PDF 013-0534), gibbsita (PDF 029-0041), anatásio (00-021-1272) e quartzo (00-046-1045), (Figura 1). Vale ressaltar, que a mineralogia encontrada nestes rejeitos foi a mesma do seu produto comercial (Costa et al., 2014), o que sugere que o processo de beneficiamento da bauxita não afetou a mineralogia dos mesmos.

 

Fig. 1: Difratogramas de raios X dos rejeitos (RBX) e do HDL tipo piroaurita (HDL-PIR).

 

Para fase análoga à pirouarita, a formação do produto lamelar sem impurezas foi identficada. A presença dos picos a 11.36; 22.77; 34.44; 38.65; 45.53; 60.02 e 61.3º (2θ), que correspondem aos planos (003), (006), (012), (015), (018), (110) e (113) desta fase (PDF 00-024-1110), com distância interlamelar de 7,88 Å, parâmetros da célula unitária com a = 3,10 Å, c = 23,28 Å e V = 193,84 Å3 e tamanho médio de cristalito em torno de 30 nm (Equação de Scherrer).

A piroaurita sintetizada mostrou perda total de 55 % e a presença de 3 eventos termais endotérmicos característicos da estrutura de hidróxidos duplo lamelares (Figura 2) (Miyata, 1980; Rozov et al, 2010; Vágvölgyi et al, 2008). Os dois primeiros picos, com perda em torno de 21,5 % correspondem a perda de grupos hidroxilas presentes entre as camadas do material (Parashar, et al, 2012) e das folhas octaédricas (Mg, Fe)OOH (Rozov et al, 2010), enquanto que o terceiro pico, com perda de 25,5 % na curva TG se refere ao processo de descarbonatação também da fase lamelar iniciado acima de 200 ºC com a desestruturação da fase lamelar que se transforma em material amorfo a aproximadamente 365 ºC. O pico endotérmico a 890 ºC (perda de 6 %) provavelmente se refere a formação de óxidos de ferro e magnésio liberados dos octaedros da folha brucita.

 

Fig. 2: Curvas TG-DTA de HDL-PIR.

 

A estabilidade térmica de pirouarita também foi monitorada por DRX (Figura 3). Conforme pode ser observado, o pico diagnóstico referente ao plano (003) da fase lamelar se manteve até 250 ºC, corroborando com os dados de TG-DTA. Também foi possível avaliar o espaçamento lamelar em função da elevação de temperatura, que se reduziu para 7,81 Å a 75 ºC e posteriormente para 7,78 e 7,76 Å a 100 e 150 ºC, respectivamente. Em torno de 250 ºC, o alargamento e baixa definição do pico referente ao plano (003) sugeriu um baixo grau de ordenamento estrutural. Acima de 300 ºC, observou-se uma completa destruição da estrutura lamelar, com a presença de apenas fases amorfas.

 

Fig. 3: Padrões DRX de HDL-PIR aquecida a 75 100, 150, 250, 300 e 350 ºC.

 

A piroaurita sintetizada formou cristais em forma de placas com tamanho em torno de 5m, equivalente aqueles representados na literatura (Wang et al., 2010; Dantas 2012; Irfan, 2014). A composição química obtida por EDS da amostra sintetizada é formada em média por 23,85 % de Mg, 9,2 % de Fe e 5,43 % de Al, e razão Mg:Fe ~2,5, que estão de acordo com a fórmula ideal do mineral (Figura 4).

 

Fig. 4: SEM-EDS de HDL-PIR.

 

CONCLUSÃO

Resíduo de lavagem de bauxita com alto teor de ferro podem ser uma interessante fonte de baixo custo para a síntese de hidróxido duplo lamelar com estrutura piroaurita, morfologia em placas de 5 m e estabilidade termal acima de 250 ºC.

 

REFERÊNCIAS

Altmann., R. V. 1968. Magnesium aluminium carbonate hydroxide tetrahydrate: A discussion. Am. Miner, v. 53, p. 1057-1059.

Altmann.,R. V. 1970. Doppelschichtstrukturen mit brucitihnlichen Schichtionen [Me(II)1-x Me(III)x(OH)2] x+. Chimia, v. 24, p. 99-108.

COSTA, M, L. et al. 2014. On the geology, mineralogy and geochemistry of the bauxite-bearing regolith in the lower Amazon basin: Evidence of genetic relationships. Journal of Geochemical Exploration, v. 146, p. 58-74.

Crepaldi, E. L., Valim, J. B. 1998. Hidróxidos duplos lamelares: Síntese, Estrutura, Propriedades e Aplicações. Revista Química Nova, v. 21, nº 3, p. 300-311.

Dantas, T. C. M. 2012. Hidróxidos duplos lamelares de magnésio e alumínio modificados com carbonato e P123 para adsorção de dióxido de carbono. MS Dissertation, Centro de Ciências Exatas e da Terra, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 77 p.

Feitknechit W. 1942. fiber die Bildung yon Doppelhydroxyden zwischen zwei-und dreiwertigen Metallen. Helv. Chim. Acta, v. 25, p. 555-569.

Hansen, H.C.B. and Taylor, R.M. 1990. Formation of synthetic analogues of double metal-hydroxy carbonate minerals under controlled pH conditions: I. The synthesis of pyroaurite and reevesite. Clay Miner, v. 25, p. 161-179.

He, J., Wei, M., Li, B., Kang, Y., Evans, D.G., Duan, X. 2005. Preparation of layered double hydroxides. Struct. Bond, v. 119, nº 1, p. 89–119.

Hoyo. C., D. 2007. Layered double hydroxides and human health: An overview. Applied clay science. Elsevier B.V. All rights reserved, v. 36, p.103–121.

Irfan, A. 2014. An­­ experimental study to determine the potential of synthetic Pyroaurite to remove Pb(II) from aqueous solutions. Master Thesis, Department of Geosciences, University of Oslo, 30 p.

Miyata S. 1980. Physico-chemical properties of synthetic hydrotalcites in relation to composition. Clay Clay Miner, v. 28, p. 50-6.

Parashar, R., Sharma, V.; Agarwal, D.D.; Richhariya, N. 2012. Rapid synthesis of hydrotalcite eith high antacid activity. Materials Letters, v. 74, p. 93-95.

Rozov., K. Berner., U. Taviot-Gueho., C. Leroux., F. Renaudin., G. Kulik.,D. Diamond., L.W. 2010. Synthesis and characterization of the LDH hydrotalcite–pyroaurite solid-solution series. Cement and Concrete Research, v. 40, p. 1248–1254.

Taylor., R., M. Hansen., H., C., B. Stanger., G. Bender Koch., C. 1991. On the Genesis and composition of natural Pyroaurite. Clay Minerals, v. 26, p. 297-309.

Vacani, F.; Trifiró, F.; Vaccari. A. 1991. Hydrotalcite-Type anionic clays: Preparation, Properties and Applications. Catalysis Today. Elsevier Science Publishers B.V., Amsterdam.

Vágvolgyi, V., et al. 2008. Mechanism for hydrotalcite decomposition: A controlled rate termal analysis. ScienceDirect, v. 318, p. 302-308.

Zhang., W. Kinomura., N. Sakane., H. Suzuki., T. 1995. Synthesis of Mg/Fe Pyroaurite-like Compounds and Their Anion-Exchange Characteristics. Inorganic Materials, v. 2, nº 259, p. 480-485.

Wang, J. et al. 2010. Fabrication of layered double hydroxide spheres through urea hydrolysis and mechanisms involved in the formation. Colloid and Polymer Science, v. 288, p. 1411–1418.

 

 

 10.31419/ISSN.2594-942X.v52018i2a3RSN